Page 370 - Revista da Armada
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ln.  t'  O  I'Clllo  nl/llflirio  fi  lt'I'OIl  I'N F,r~'"   aparelhos  eram  cheios  de  virotões  de  serviço, não embargando que ainda a fro-
             ,·"millllo ,Ic SIl/'II1'hl1:  I' flssim fi':  fllllilrll   modo que era esrranho de  ver;  e como se  /0  houvesse  Ioda  sobre  a  cidade  assim
             CI/I  'I'/("  i"  '\/"111  Rllllriglll's  di'  V,I.I/·IJIII·I'·   a IIOU houve fora da sombra daquele mon-  comoanlejazia.
             1m'.                               le, saiu-se das galés III/ma maré e vento que   E por esta  razão se  veio  ao cabo do
                O Meslre (Iuisera IOmbém fazer vela, e   Irazia e escapou e foi-se em salvo.   Montijo, que é em Ribatejo duas lég/las da
             remlo a maré e vel/IO cOII/rúrio,  e qpe era   Oh,  que formosa cOllsa era de  ver! em  cidade, onde já linha u!!, batel prestes em
             II1l1i/O  pior deferir,  soill·se em  terra  e as '  tão pouco espaço, através de um Ião estrei-  que passasse.  E quando houve de entrar
             gemes com de; as barcas eram navios pe·   /O rio,  ver cil/qllenla e sele I!(I!{S e Irinta ga-  no batel,  um seu  escudeiro de qlle mIlito
             (llI/:l/OS e não IJodiam  empeecer ao..s gran·   lés,  Iodas armadas e bem corrigidas, com  fiava  chamado por nome  Vasco  Martins
              d,'.\".  num""I//,' por tempo /I el/lS comrário,   desejo  de empeecer limas  às O/llras!  Oh,  do  Outeiro, falou a Nun'Álvares àparte e
             e desarmaram-se com os n/lvioS.    que dia  de tania C/lidado! Mormente dos  disse:
                Orafazendo a nall de RI/i Pereira e as   que na presente peleja tinham gr(lnde parle   - NUI/'Álvares, eu vos peço por mercê
             O/llras aq/lele bordo q/le dissemos contra   de sua esperança, porque uma cousa jul-  que não queirais entrar em este batel nem
             Almada,  e vindo as galés de  Portl/gal Io-  gava o desejo eoulra ordenava a vemura!   fazer  lal  viagem  pera  além,  pois eu  vos
             da.\"  a remos em escala em direito da frota   As galés  de  Castela  não puderam en-  digo  q/le  eu  sonhava  esta  noite como  ia
             dos inimigos,  e vendo os castelãos que já   calçar as de Porlugal, nem elas não quise-  COfJVOSCO neste baleI,  e que vos IOmavam
             a.\"  poderiam  ter de  SOlO vento,  desferiram   ram  aferrar  com elas,  porque cada  uma  as galés de Castela e LOdos nós outros que
             lodo.\"  assim como estavam para ir sobre   galé de Castela trazia trás si lima nau for-  COfJVOSCO {amos; da qual cousa eu tomava
             elas, dos quais o primeiro que fez vela foi   necida de gentes de armas para lhe socor-  tamanho nojo que me queria ma/ar, quan-
             lima grande nau que chamavam de Joúo   rer quando tal cousa cumprisse.  Nem afer.  do  via tal perda.  E porém me parece que
             de  Arena,  que tinha  um balel a meio do   raram outras naus salvo as que dissemos,  é bem que.escusseis esta ida por ora.
             mastro fomecido de homens de armas.   de  que foram LOmadas  Irês  dos portugue-  Nun'Alvares  quando  isto  ouviu  res-
                Rui Pereira,  quando  viu  que as na/ls   ses e mortos alguns de uma parle e doutra,  pondeu mui manso e disse:
             iam sobre as galés,  com a viração que re-  e os outros ,odos presos, e feridos boa par·   - Amigo meu, eu vos agradeço vosso
             frescava  cada  vez mais,  temendo que lhe   tedeles.                bom  conselho.  Mas  esta  cousa,  Deus  a
             fariam  dano,  palas empachar,  mais com   O Meslre andava pela ribeira armado,  fará melhor do que vós dizeis; e para vós
             avisamemo que com vã temeridade, como   com  muitos  consigo,  recebendo  bem  aj  não verdes isLO que assim sonhaste, eu vos
             alguns disseram, fez em outro bordo e veio   gentes da frola, a qual se Imlçou jl/nlo com  mando que fiqueis e não vades comigo; e
             aferrar com João  de Arena; e aferraram   terra desde os eSlaleiros atá porta do Mar,  desta forma  vós não  vereis  vosso  sonho
             com  três de  Portugal,  cinco de  Castela  e   e a de  Castela  se tornOlI  para  o  ReSIdo.  cumprido,  nem prezará a  Deus' que será
              11111 carracão.  E engalfinharam-se as guar-                        assim.
              nições /Imos  com as outras de forma q/le                             O  escudeiro,  não  embargando  isto,
              Iodas  iam em  uma massa pelejando não          *                   disse  flue  queria  ir  com  ele  todavia,  e
              m/Ii devagar e bem sem piedade; e assim                             Nu,,'Alvares não ° quis consentir, e assim
              os lançou a maré e o vento contra as barro-  COMONUN'ÂL VARES'PASSOU A LIS-  ficou mui~o contra sua vontade.  .
              cas de Almada apor de Cacilhas.   I  BOA POR FALAR COM O MESTRE        Nun'Alvares,  desprezando  todo o so-
                E eSle aferramento que Rui Pereira fez   Soube  Nun'Alvares,  que  estava  em   nho e agoiro  vão,  não mudou tenção  do
             com aquelas naus deu grande ajuda às ga-  Palmela, como se levantara e/-rei do cerco   qllC proposLO tinha,  e entrou no batel com
             lés de Portugal,  porque as primeiras naus   e estava em Santarém, e prougue-flle mui-  alguns seus a horas de meia-noite. E, pos-
             de CaSlela quiseram dar pelas galés,  e en-  la com tais novas. E foi cerrificado que ele   to que se desviar pudera,  quis atravessar
             (Iuamo Rui Pereira aferrou e se empachou   fizera  a{  alardo de pouca gente não bem   pela frota que jazia ante a cidade, e, quan-
             com elas, passaram as galés que nenhllma   corregida,  pera repartir pera suas fronta-  do  eslava no meio dela  mandou logo dar
             tias  owras naus  lhe  p6de empeecer nem   rias.                     às trombelas.
             (·"egar.  Mas, cruel fortuna, havendo gran-  E como o. mui sages e em toda cousa   Os das naus, quando isto ouviram, co-
             tle espaço que durava a peleja,  achou en-  ardido Nun'Alvares disto soube parte,  as-  meçaram  de  se alvoroçar,  bradando .to-
             tão sua morte deste  modo: em pelejando   sim  como  haviam  de  ir com  ele  muitos   dos:  Armas!  Armas!, e uns saltavam nos
              Rui Pereira quamo um valemee ardido ca-  mortos e doentes dos de  sua companhia,   batéis outros vinham a bordo, não saben-
             valeiro podia pelejar,  levamou a cara do   entendendo que iriam à longa pelo cami-  do que era aquilo.  Porém alguns das naus
             elmo e que não podia bem suporlar, e hou-  nho sem ordem de combate,  com grande   perguntaram  aos do batel quem  ip  ali,  e
             ve lima viro/ada pela lesla de que, em pou-  e esforçado coração pôs de todo em sua   foi-lhe  respondido que era  Nun'Alvares.
             co espaço lançou aquele fidalgo o espirita  vontade de lhe ir sair diallfe e com a ajuda   E vendo que lhe não podiam impedir ces-
             (/"e /tio cedo não devera fazer fim.   de  Deus  pelejar  com  ele  e  desbaratá-lo   saram de começar nenhuma cousa contra
                Oh, nobre e ~alente varão e verdadeiro  com toda sua gente.       ele.
              português! Por quaTJIos enlão foste censu-  E  dizem  aqui  alguns,  contando  em   E foi iSlo na derradeira semana de Se·
              rado, dizendo que por tua sandia ardileza,  breve eSla história, que mandou para isso   tembro.
              podeI/do  bem  escusar a peleja e te  ir em  pedir licença ao  Mestre; e que ele lhe res-
              SlI/VO como as oulras naus, te ofereceste a  pondeu que lhe prazia dela muito e que lhe
              Ião  mortal perigo!  Porém  não foi assim,  rogava que o aguardasse, pois queria com
              mas como falava o comum povo, dizendo  ele estar em tal obra; e que, por se esta cou-
              que assim como Jesus Cristo morrera por  sa  p6r em trespasso e o  Mestre não ir ao
              slllvar o III/Indo todo,  assim  morrera  Rui  tempo que cumpria, el-rei de Castela se foi
              Pereira  por azar salvação dos oulros.  De  seu caminho sem estorvo. que de  nenhum
              ("/Ij"  mor/e o  Mesm'  e todos os da  cidade  houvesse, de quea Nun'Alvares mui/o pe-
              liveram grO/lde semido.          sou, e da licença que pedir mandara.
                As  doze naus que estavam  detrás  vi-  Mas  um outro compilador desles fei-
              nham quanto podiam para a cidade, e as  tos,  de cujos trechos por mais largo estilo
              de  Caslela todas alrás delas,  mas não lhe  enxertamos nesta obra segundo que cum-,
              podiam fazer nojo por o muito vento que  pre, reconta isLO po.resta maneira:   Adaptação a partir de . Hist6ria de Uma
              traziam.  A  nau em que vinha Aires Gon-  Diz que Nun'Alvares, eSlandoem Pal-  RevoluçãoJ>.  (Primeira  Parte  da  "Cró-
              çalves desferrara quando começaram de se  mela e sabendo as novas que já ditas são,   nica de  EI-Rei D. João I de Boa Memó-
              vencer,  e seguiam-na, aferrando com e/a,   e que eI-rei ia com grande desejo de pode-  ria»).  Edição  de  Publicaçóes  Europa-
              cinco galés. fazendo muito para a tomar,  rosamente tornar ao reino para o subjugar   -Am~rit;o,  colecção  Livros  de  Bolso,
              e.\pecialmellle  hu  chamam  a  Cuba,  por  pela força  da guerra,  ordenou de vir falar       n." 146.
              azo tio  vento que se acalmava,  emparan-  ao Mestre, assim sobre a peleja que enten·
              do-o a allura da terra; e aficavam-na lanlO  dia  de haver com eI-rei tle Castela,  como
             às besla.f que toda a nau,  e o velame e os  doulras cousas que mui/o cumpriam a seu   ***********

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