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Ásia, meio milénio na idade Gâmica
          Ásia, meio milénio na idade Gâmica


               Na Sorbonne, um americano fala de Vasco da Gama


                                                       4ª Parte



               a Sorbonne, Universidade de Paris, de 11 a 14 de  exclusiva de Portugal. Boorstin foi mais longe na valoriza-
               Maio deste ano de 1998, realizou-se a Conferência  ção do contributo de Portugal, ao considerá-lo como um
        NInternacional de Paris, subordinada ao tema Vasco da  dos três pilares do engrandecimento da Civilização
         Gama e a Índia. O célebre historiador norte-americano  Ocidental, Civilização a que o seu país, a América, também
         Daniel J. Boorstin proferiu uma conferência com o título  pertence: A ascensão da Civilização Ocidental que co-
         “Vasco da Gama e a Descoberta do Mar”.               meçou com a “Glória que foi a Grécia” e a “Grandeza que
           Ao longo de toda a sua comunicação Boorstin expôs as  foi Roma”, atinge todo o mundo com a “Aventura que foi
         razões da valorização do empreendimento português, não  Portugal”... O que a Acrópole representa como símbolo da
         se preocupando com a enumeração de factos.           glória ateniense e o que o Fórum era para o poder imperial
           Começou por falar das viagens de Colombo e de Vasco da  romano, os remotos entrepostos de Goa e Malaca foram-no
         Gama para dizer que são incomparáveis, em objectivos, em  para a grandeza de Portugal.
         tempos, em distâncias, em dificuldades e em consequên-  Recorda ainda que as capitais da Cultura Europeia,
         cias.                                                                                     Alexandria,
           Com grande                                                                              Atenas, Istam-
         lucidez estabe-                                                                           bul, Roma, vi-
         leceu a diferen-                                                                          viam    todas
         ça entre o que                                                                            olhando para
         representa ter                                                                            dentro, para o
         encontrado ter-                                                      PORTUGAL             Mundo Medi-
         ritórios, con-                                                          Lisboa  ESPANHA   terrânico co-
         quistá-los e ex-                                                                          nhecido.
         plorá-los, como                                                                             Pelo contrá-
         fizeram Colom-                                                                            rio, os maríti-
         bo e os seus se-                                                                          mos portugue-
         guidores, e a                                                                             ses saíram de
         descoberta do                                                                             Lisboa e lança-
         mar (daí o tí-                                                                            ram-se no des-
         tulo da comu-                                                                ÁFRICA       conhecido, fa-
         nicação) com a                                                                            zendo do Medi-
         fundação de um                                                                            terrâneo aquilo
         novo conceito                                                                          © PÁGINA ÍMPAR  que na reali-
         de império ba-                                                                            dade ele é, um
         seado no co-                                                                              pequeno lago
         mércio e no po-                                                                           da retaguarda.
         der marítimo,   Viagem de Cristovão Colombo.                                                E nós, portu-
         como fizeram Vasco da Gama e os seus seguidores, D. Fran-  gueses, estamos certos que, tal como o mundo não deixa de
         cisco de Almeida, Afonso de Albuquerque, o próprio Vice-  referir a importância das culturas da Antiguidade Clássica,
         -Rei Vasco da Gama e D. João de Castro.              também o modo como Portugal marcou a evolução do
           Aliás, os espanhóis, comemoram quase exclusivamente os  mundo nos séculos XV e XVI jamais se apagará dos registos
         seus conquistadores e não os navegadores.            da História.
           Sabemos que um dos grandes méritos das navegações por-  No número de Novembro de 1993 da Revista da Armada,
         tuguesas, quer ao serviço da Coroa de Portugal, quer ao  no artigo “Os Descobrimentos Portugueses na Literatura
         serviço da Coroa de Espanha, como Fernão de Magalhães,  Estrangeira”, já tinha sido feita referência a obras deste his-
         foi corrigir a forma do mundo imaginada nas cartas antigas,  toriador, assim como às de C. R. Boxer e Paul Kennedy.
         mostrando que os continentes eram descontínuos, tendo a  É muito agradável notar que o mais famoso historiador do
         continuidade do mar como único elo de ligação.       Novo Mundo, ou os que sendo de língua inglesa são mais
           Com a simplicidade e o destemor de quem acredita na  lidos no Novo Mundo, não se deixaram ofuscar pelo feito
         verdade que afirma, Boorstin diz que os navegadores por-  de Colombo nem pela ascensão do poderio naval britânico
         tugueses descobriram a dimensão da ignorância Ocidental e  e não esqueceram o mérito muito superior das navegações e
         que Portugal legou ao Mundo o conhecimento geográfico, o  também da expansão portuguesa.
         espírito de empresa e o espírito de aventura.         A “capacidade de comemorar” por parte dos países liga-
           Depois, concorda que o mar, ao contrário da terra, pode  dos quer à origem quer ao destino da viagem do Colombo,
         ser atravessado mas não possuído e o mar provou ser a via  sem dúvida que foi maior.
         para todas as partes.                                 E todo o continente americano se associou às comemo-
           Foi referido mais do que uma vez em artigos publicados  rações, embora Colombo não tenha tocado o continente e,
         anteriormente sobre este tema, nesta e noutras publicações,  insistisse sempre em afirmar que tinha estado onde nunca
         que as navegações portuguesas constituíram a primeira fase  chegou.
         da globalização de que hoje tanto se fala, uma realização  Boorstin acrescenta: Colombo prometeu uma mina de
         única da Civilização Ocidental, conseguida por iniciativa  ouro e apenas encontrou uma região selvagem.

         6 DEZEMBRO 98 • REVISTA DA ARMADA
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