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A REVOLUÇÃO CIENTÍFICA:                              nacional, a 4 de Novembro de 1948, foi constituída a Missão de
         O BINÓMIO RECURSOS / AMBIENTE                        Estudos de Pesca da Junta das Missões Geográficas e de
                                                              Investigações Coloniais, denominada a partir de 1951 por
           Fernando Oliveira, ao contrário de Mahan ou de Sir Walter  Missão de Estudos das Pescas de Angola. Em 5 de Dezembro de
         Releigh, associou claramente a ciência à sua concepção de  1950 foi criado o Instituto de Biologia Marítima de Lisboa, que
         poder marítimo. Como refere na “Arte da Guerra no Mar”, se o  resultou de uma expansão e automatização da Estação de
         poder marítimo se relaciona com o comércio, defesa e posse,  Biologia Marítima de Lisboa relativamente ao Arquivo Vasco da
         isto é, com o uso e o controlo do mar, a tecnologia inerente a  Gama.
         estas actividades surge como uma componente determinante  O esforço científico desenvolvido durante a II Guerra Mundial
         daquele poder.                                       permitiu obter meios tecnológicos que revelaram as riquezas do
           Tal facto foi perfeitamente percebido por Fernando Oliveira,  solo, sub-solo e da água do mar. Por isso, nos anos 60 começou
         porque este estrategista pertenceu à geração dos que necessi-  a esboçar-se a corrida aos recursos minerais e energéticos exis-
         taram de conhecer a geografia                                                 tentes nas plataformas continen-
         mundial, de descobrir as melho-                                               tais. No contexto do esforço
         res rotas para as distantes regiões                                           organizacional para incentivar a
         do comércio e de afirmar positi-                                              exploração e o aproveitamento
         vamente os interesses inerentes                                               dos recursos marinhos portugue-
         ao sucesso das actividades marí-                                              ses, em 1958 foi criado o Ins-
         timas nacionais.                                                              tituto Hidrográfico. Contudo, o
           A doutrina estratégica conce-                                               eclodir do conflito colonial levou
         bida por Fernando Oliveira, para                                              a que, nas décadas de 60 e 70, o
         estruturar, edificar e operacio-                                              esforço de investigação do mar
         nalizar as actividades marítimas                                              fosse direccionado para a hidro-
         nacionais foi desprezada em                                                   grafia do Ultramar, com raras,
         Portugal. Por isso, só no século                                              mas significativas, excepções do
         XIX e em presença de algumas                                                  domínio da acústica submarina e
         humilhações nacionais, se volta                                               da investigação das pescas.
         a reconhecer e a salientar que a                                               Em 1974 e, na sequência da
         ciência ligada às actividades                                                 reorganização do Estado decor-
         marítimas é uma componente                                                    rente das transformações do
         fundamental do poder nacional.                                                regime, o Instituto de Biologia
         Progressivamente, de forma algo                                               Marítima deixou de estar na
         tímida e com sucessivos avanços                                               dependência da Marinha, tomou
         e recuos, começou a ser admiti-                                               a designação de Instituto Nacio-
         do que a dependência de Por-                                                  nal de Investigação das Pescas
         tugal relativamente ao mar extra-                                             (mais recentemente Instituto
         vasava o binómio comércio/de-                                                 Português de Investigação do
         fesa ligado ao uso e ao controlo                                              Mar), e integrou parte dos labo-
         do mar, e englobava, também,                                                  ratórios e dos técnicos de Biolo-
         um binómio recursos/ambiente,                                                 gia Marítima do Instituto Hidro-
         associado à preservação e à pro-                                              gráfico.
         tecção dos oceanos.                                                            No final dos anos 70, o Ins-
           Os alicerces desta mudança                                                  tituto Hidrográfico entrou numa
         foram lançados por D. Carlos I                                                era de grande especialização
         que, em 1896, certamente devi-                                                tecnológica a nível humano e
         do às influências recebidas nos                                               material, fruto de uma acção es-
         frequentes contactos com ofici-                                               clarecida e planeada com pers-
         ais de Marinha e impressionado                                                pectivas de longo prazo, e do
         pela intensa actividade científica                                            intercâmbio com a comunidade
         do Príncipe Alberto do Mónaco,                                                científica nacional e interna-
         empreendeu a primeira campanha oceanográfica nacional.  cional. Desse esforço foi possível adquirir maior sensibilidade e
         Homem de ciência e de cultura, D. Carlos I cedo percebeu a  conhecimento sobre a natureza e a validade dos recursos exis-
         importância do estudo do mar para o progresso da Humanidade.  tentes nos espaços marítimos sob jurisdição nacional.
         Por isso, em 1898 criou o Aquário Vasco da Gama, com o  De então para cá, a capacidade científica do Estado para co-
         objectivo de permitir que estudantes, especialistas e colectores  nhecer com rigor e explorar racionalmente esses recursos, trans-
         de amostras desenvolvessem as suas investigações marítimas  formou-se num factor decisivo no âmbito das disputas económi-
         sazonais.                                            cas relacionadas com a preservação dos recursos marinhos.
           Em Janeiro de 1907 foi constituída a Sociedade Portuguesa de  Adquiriu, igualmente, importância para proteger a qualidade
         Ciências Naturais, tendo D. Carlos assumido a presidência ho-  ambiental do espaço atlântico onde se projectam os nossos
         norária. Um dos objectivos desta Sociedade foi a obtenção dos  interesses, aspecto determinante na qualidade da vida humana
         fundos necessários ao estabelecimento de uma Estação de  em Portugal.
         Biologia Marítima, o que só ocorreria a 10 de Maio de 1919.  Em presença destes factos, parece avisado englobar no con-
         Entre 1920 e 1940 a investigação marítima foi liderada, primeiro  ceito de poder marítimo do Estado, a par das tradicionais capa-
         pelo Prof. Dr. Celestino da Costa e, depois,  pelo Dr. Magalhães  cidades para usar e controlar o mar, as respectivas capacidades
         Ramalho, ambos funcionários da Estação. A par dos mais ilustres  científicas para preservar e proteger os oceanos.
         oceanógrafos europeus, estes investigadores realizaram traba-
         lhos relevantes para a definição do regime oceanográfico na
         plataforma continental portuguesa.                                                     António Silva Ribeiro
           Para responder às necessidades da nossa frota pesqueira                                            CFR
                                                                                       REVISTA DA ARMADA • FEVEREIRO 99  7
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