Page 165 - Revista da Armada
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detalhe dos comentários à margem que
Luís de Albuquerque considerou serem na
realidade duas (7). A relação principal
cobre o período 1496-1653, e é o único
caso de um texto desta natureza anotado
por um capitão-mor da Carreira.
Outro códice conhecido é o Livro de
Marinharia de Gaspar Moreira, publicado
por Léon Bourdon e Luís de Albuquerque,
onde as notas de D. António mostram que
talvez sobrevalorizasse os seus conhe-
cimentos de náutica, já que errou por três
vezes: sendo um caso raro entre os
capitães de navios, não poderia porventu-
ra equiparar-se aos melhores profissio-
nais.
Haveria muito mais a dizer do resto do
conjunto, sobretudo pela importância dos
inéditos. Na evidente impossibilidade de
sequer apresentar os respectivos conteú-
dos, debruçarmo-nos-emos em particular
sobre os três códices pertencentes à
Universidade de Harvard (Houghton
Library), os quais reúnem materiais da
maior importância para a História da
Marinha Portuguesa, no artigo que se
seguirá a esta apresentação muito geral da
figura de D. António de Ataíde e dos
manuscritos da sua biblioteca privada.
Filipe III de Espanha (II de Portugal). Artista desconhecido. Madrid.
tradição evidente, de resto); mas só foi Portugal, cargo que ocupa sozinho de Doutor Francisco Contente Domingues
ilibado três anos depois. Março de 1632 a Abril de 1633 em vir- Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa
Em 1625 é feito primeiro conde de tude do falecimento do conde de Vale de Academia de Marinha
Castro Daire, gentil-homem de boca e Reis, Nuno de Mendonça. A Restauração
mordomo-mor da rainha, em jeito de encontrou-o profundamente ligado à Notas
desagravo pela injustiça a que fora gestão dos Habsburgos, e talvez por isso
sujeito. Outros cargos e missões de não se livrou da prisão em 1641, por sus- 1) V. a propósito Jorge Semedo de Matos, O
importância atestam o alto merecimento peita (infundada) de participação numa Terço da Armada da Coroa de Portugal (1621).
de que sempre beneficiou junto de Filipe conjura pró-espanhola. Depois de ver Novas informações sobre a sua criação e organiza-
ção, Lisboa, Academia de Marinha, 1999.
IV, vindo a ser nomeado governador de provada a sua inocência passou os últi- 2) Memoravel Relaçam da Perda da Nao
mos anos de vida em quietude, Conceiçam. Por Joam Carvalho Mascarenhas…, Em
morrendo a 14 de Dezembro de Lisboa, Na Officina de Antonio Alvares, Anno de 1627.
1647. 3) Consta a obra de dois volumes: Historia
D. António de Ataíde recolheu Tragico-Maritima Em que se escrevem chronologica-
mente os Naufragios que tiveraõ as Naos… Por
um valioso conjunto de códices Bernardo Gomes de Brito, Lisboa Occidental, Na
com documentos diversos relativos Officina da Congregaçaõ do Oratorio, 1735-1736.
às questões navais pelas quais se Mais tarde foi publicado um volume que passou a ser
interessou directamente, a ponto de conhecido por “pseudo terceiro volume”, de formato
idêntico, onde o compilador anónimo juntou mais
poder ser considerado um perito: alguns relatos de naufrágios. Este último inicia-se pre-
foi por exemplo uma das vozes que cisamente com o relato de Carvalho Mascarenhas.
opinou àcerca da questão das três 4) Henrique Quirino da Fonseca (ed.), Diários de
ou quatro cobertas das naus da Navegação da Carreira da Índia, nos anos de 1595, 1596,
Índia. Desses códices, os mais co- 1597, 1600 e 1603, Lisboa, Academia das Ciências,
1938.
nhecidos são os que compilam 5) Humberto Leitão (Introdução e notas), Viagens
diários da Carreira da Índia, publi- do Reino para a Índia e da Índia para o Reino (1608-
cados por Henrique Quirino da 1612). Diários de navegação coligidos por D. António
Fonseca (4) e por Humberto Leitão de Ataíde no século XVII, 3 vols., Lisboa, Agência
Geral do Ultramar, 1957-1958.
(5). De outros, mormente dos que 6) C. R. Boxer, “The naval and colonial papers of
mais nos interessam, deu boa conta Dom António de Ataíde”, Harvard Library Bulletin, vol.
Charles Boxer (6), a cujo conheci- V, n. 1, Cambridge (Mass.), 1951, pp. 24-50; e “Um
mento enciclopédico não escapou roteirista desconhecido do século XVII. D. António de
a importância deste acervo. Ataíde, capitão geral da Armada de Portugal”, Arquivo
Histórico da Marinha, vol. I, nº 1, 1934, pp. 189-200.
No conjunto pode por exemplo 7) V. a Introdução a Relação Das Náos e Armadas
destacar-se a Relação das Náos e da India Com os successos dellas que se puderam
Armadas da India (códice Add. saber, Para Noticia e instrucção dos curiozos, e
20902 da British Library), uma das amantes Da Historia da India (British Library, Códice
Add. 20902), leitura e anotações de Maria Hermínia
mais interessantes relações de Maldonado, Coimbra, Biblioteca da Universidade,
Uma das páginas manuscritas pela mão de D. António de Ataíde. armadas da Índia, com tal riqueza e 1985.
REVISTA DA ARMADA • MAIO 2001 19