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PONTO AO MEIO-DIA
O Orçamento de Defesa para 2001
A cruel realidade dos números
A DISTRIBUIÇÃO zar as Forças Armadas e investir em novos Nestas circunstâncias, retomando os va-
O Orçamento da Defesa Nacional (ODN) meios e em modernas tecnologias. Caso lores de 1999 para a relação entre as despe-
para 2001 ascende a 301,4 milhões de con- estas medidas não sejam tomadas, face aos sas de defesa e o PIB, a mais plausível é de
tos (mc). Neste montante incluem-se as objectivos fixados no Programa do Governo 1,5%. Para 2001, com um PIB estimado de
despesas de funcionamento normal (260,1 de valorização da componente humana dos 21601 mc, esta relação, na melhor das
mc) e de investimento (41,3 mc). De forma Quadros Permanentes, acompanhada da circunstâncias, poderá ser de 1,4%, bem
muito simplificada poderá dizer-se que as redefinição e actualização dos vencimentos abaixo do valor de 2,11% recomendado
despesas de funcionamento normal englo- e da reestruturação de carreiras, será de pela NATO. Como se acaba de verificar, a
bam as verbas relativas a pessoal (191,5 esperar um novo incremento das despesas coexistência de distintas lógicas de classi-
mc), a operação e manutenção (67,6 mc) e a com pessoal. A ser suportado pelo ODN ficação e agregação de despesas, conduz a
despesas de capital (1 mc). As despesas de provocará o colapso do sistema de forças uma inconveniente distorção das análises
investimento atingem 37,3 mc referentes à por incapacidade de o operar e manter, comparativas sobre os orçamentos de
lei de programação militar (LPM) e 4 mc mesmo em níveis mínimos. defesa, e permite o desenvolvimento de
relativos ao programa de investimentos e Os encargos imputados à defesa, bem imagens que não retratam fielmente o
despesas de desenvolvimento da adminis- como os valores do PIB adoptados como esforço financeiro neste domínio.
tração central (PIDDAC). O ODN é dis- referência, apresentam algumas distorções
tribuído pelo MDN (18,4 mc), EMGFA na documentação oficial publicada, o que AS REDUÇÕES
(10,4 mc), Marinha (84,4 mc), Exército origina confusões e facilita manipulações. O ODN cresceu entre 1990 (193,5 mc) e
(122,5 mc) e Força Aérea (65,7 mc). Se, relativamente ao PIB é possível encon- 2001 (301,4 mc) cerca de 55,8% a preços
Os encargos relativos às missões huma- trar um valor aproximado em toda a docu- correntes. Deduzindo a inflação verifica-se
nitárias e de paz não constam do ODN. São mentação, o mesmo não acontece quanto às uma descida real de cerca de 26,8%. Com
satisfeitos por fundos da dotação provi- despesas de defesa e à relação destas com o efeito, o orçamento de 2001, a preços cons-
sional do Ministério das Finanças ou da PIB. Tomando como exemplo o ano de tantes, traduz-se em apenas 141,7 mc de
Agência Portuguesa de Apoio ao Desen- 1999, o último sobre o qual está disponível 1990. Utilizando outros indicadores cons-
volvimento (APAD). Esta modalidade de a documentação oficial necessária, verifi- tatamos que a relação entre as despesas de
financiamento é justificada pela natureza e camos que para um PIB de 21000 mc, o defesa e as despesas públicas era de 6,1 %
pelo carácter imprevisível e excepcional de valor apresentado no Anuário de Esta- em 1990, contra 2,4% em 2001, o mais baixo
tais missões. Para o ano em curso estão tística de Defesa Nacional para despesas de dos últimos 12 anos. A relação entre as
inscritos cerca de 15,0 mc. defesa é de 261,6 mc, que correspondem a despesas de defesa e o PIB era de 2,0 % em
Relativamente à utilização do ODN, a Lei 1,25% do PIB e englobam apenas as verbas 1990, contra 1,4% em 2001. Se considerar-
n.º 30/C/2000, de 29 de Dezembro, estabe- atribuídas aos três ramos das Forças Arma- mos as despesas de defesa por habitante
lece as seguintes cativações:15% do total das das. O montante divulgado no Orçamento verificamos, a preços constantes, que em
verbas orçamentadas para abonos variáveis de Estado para as despesas de defesa 1990 se gastavam 19,1 contos e hoje apenas
e eventuais, aquisição de bens e serviços, atinge os 320,1 mc, que correspondem a 14,2 contos. Relativamente às despesas
outras despesas correntes e aquisição de 1,5% do PIB porque incluem também os públicas por habitante, igualmente a
bens de capital;8% das despesas previstas gastos com o MDN, o EMGFA, o investi- preços constantes, em 1990 gastavam-se
na LPM;10% do total das verbas orçamen- mento do plano e as contas de ordem. Por 313,3 contos por habitante, enquanto hoje
tadas para transferências correntes desti- fim, o valor das despesas de defesa comu- se consomem 602,1 contos. Torna-se assim
nadas aos serviços e fundos autónomos. As nicado à NATO foi de 452,8 mc, que corres- claro que, embora a generalidade das
verbas cativas do ODN sempre puderam pondem a 2,2% do PIB, em resultado da funções do Estado obtenha hoje mais
ser utilizadas pelas Forças Armadas, me- adição das despesas com a GNR (95,4 mc) e recursos, na defesa houve uma clara
diante despacho ministerial, após proposta com as pensões de reforma não suportadas diminuição. Por isso, podemos afirmar que
fundamentada dos Chefes de Estado-Maior. pelo ODN. o esforço de defesa português acompanhou
Todavia, uma das medidas de reforma da A GNR, embora opere sob autoridade a tendência de contenção verificada no pós
despesa pública recentemente aprovada do CEMGFA em caso de guerra, tal como guerra fria. Como se situa francamente
aponta no sentido de cortar essas verbas, o está estruturada, armada e treinada, não abaixo do recomendado pela NATO, retira
que agravará as dificuldades de funciona- pode ser considerada uma força militar credibilidade às iniciativas políticas e mili-
mento no corrente ano económico. apta a combater num conflito moderno. É tares do país no seio da Aliança e da comu-
uma competente força policial, capaz de nidade internacional. Para além disso,
AS ASSIMETRIAS garantir a ordem pública em cenários de torna evidente que as críticas e os pedidos
O ODN revela uma preocupante assime- moderada instabilidade. Por isso, os seus de aumento das despesas de defesa por
tria das despesas com pessoal (60%) relati- encargos não deveriam ser considerados parte da NATO se justificam. Na realidade,
vamente ao investimento (21%) e à ope- despesas de defesa nem comunicados à se os aliados são os nossos juizes, também
ração e manutenção (19%). A distribuição NATO. Igual procedimento deveria ser é certo que garantem uma parte substan-
típica nos países da NATO é, no pessoal, de adoptado para as pensões de reforma não cial e indispensável da nossa segurança.
40%, no investimento de 30% e na operação suportadas pelo ODN, porque reflectem
e manutenção de 30%. Urge caminhar nesta contribuições para a Caixa Geral de António Silva Ribeiro
direcção. Porém, é fundamental reorgani- Aposentações e para fundos de pensões. CFR
4 AGOSTO 2001 • REVISTA DA ARMADA