Page 263 - Revista da Armada
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O trabalho seguinte analisa o fenó-  longo dos anos, a numerosas controvér-  Os Portugueses fizeram a descoberta
         meno da apropriação dos Oceanos que  sias, muitas delas resolvidas por meios  dos Oceanos como via de comunicação.
         se verificou na segunda metade do  diplomáticos, como as negociações direc-  Aprenderam a navegá-lo, foram definindo
         século XX.                         tas e a mediação, ou por meios jurídicos,  os seus contornos, obtiveram o conheci-
           O interesse crescente pelos  Oceanos  como o recurso aos tribunais ou à arbi-  mento geográfico da sua superfície. Cinco
         que levou já à apropriação de grande  tragem.                         séculos depois, o Homem começou a
         parte dos seus recursos, corresponde  Na realidade, impunha-se um orgão  aventurar-se nas suas profundezas e foi
         cronologicamente ao despontar de uma  judicial especializado, pois foram muitos  conhecendo e explorando a variedade e a
         nova civilização ou de uma nova idade  os casos de direito do mar até à data sub-  riqueza de recursos que ele contém.
         histórica. Teve início na segunda metade  metidos ao Tribunal Internacional de  O Homem fez a descoberta de que nos
         do nosso século e insere-se num conjunto  Justiça.  Assim se criou o Tribunal  oceanos existe petróleo e carvão; fez a
         de mudanças e conquistas que está a  Internacional do Direito do Mar.  descoberta de que no fundo dos oceanos
         transformar os hábitos e os modos de vida                             existem nódulos polimetálicos em quanti-
         que a minha geração encontrou quando  O quinto trabalho é sobre o Direito  dade e em riqueza incalculáveis; fez a
         nasceu e que está a dar lugar à tal terceira  Internacional dos Rios e o autor analisa,  descoberta da possibilidade de utilizar a
         vaga em que os nossos netos viverão.  a propósito, os acordos com a Espanha e  energia das ondas e das marés; fez a
           A ideia fundamental que preside às con-  as suas pretensões .       descoberta de que os oceanos são uma
         cepções do novo direito é a de que o ter-  Na verdade, os direitos sobre a água  reserva essencial de produtos químicos e
         ritório de um estado não desaparece de  constituíram sempre  preocupação dos  farmacêuticos; fez, também, a descoberta
         imediato com o mar, mas prolonga-se,  Estados, desde a sua formação, e não será  de que é viável a produção industrial de
         primeiro, com soberania plena, pelas  arriscado dizer que a organização e os limi-  água doce para suprir a escassez que se
         águas, solo, subsolo e atmosfera superja-  tes dos Estados tiveram em grande parte a  anuncia; fez, finalmente, a descoberta de
         cente do mar territorial, e depois, com  sua origem nos direitos sobre a água.  que os oceanos são jazigo de riquezas
         direitos soberanos limitados, pela zona  "A Humanidade pode morrer de sede  arqueológicas ao alcance do Homem. Isto
         económica exclusiva e pela plataforma  antes de morrer de fome", advertem os  sem falar no papel dos oceanos na regu-
         continental sem solução de continuidade  especialistas presentes na vigésima  lação do clima e da atmosfera; na recic-
         geológica e morfológica.           primeira Conferência Internacional de  lagem de nutrientes e tratamento de resí-
           A Segunda Guerra Mundial constitui,  Abastecimento de Água, realizada em  duos; no controlo biológico e reserva de
         sem dúvida, um dos mais importantes  Portugal.                        recursos genéticos.
         marcos na vida da Humanidade. Foi a  Portugal não é um país especialmente  Mas descobriu também profundas preo-
         partir de 1945 que se verificaram ino-  dotado e diversificado em recursos natu-  cupações no futuro dos oceanos.
         vações assinaláveis ou consideráveis pro-  rais, mas possui grandes recursos hídricos,
         gressos na informação e nas comuni-  sendo o terceiro país mais rico da União  Há muito trabalho a realizar. Pelo nosso
         cações, sobretudo, mas também nas armas  Europeia em termos de águas interiores.  lado recomendaríamos as seguintes tare-
         de destruição, na tecnologia industrial, na  Mas atenção, metade do contorno das nos-  fas para o século XXI:
         medicina e na genética, na metalurgia, na  sas fronteiras são rios internacionais ou
         ecologia, na luta pelos direitos humanos,  seus afluentes e cerca de dois terços da  • Articular as investigações oceanográ-
         na emancipação da mulher e na desagre-  área continental estão situados em bacias  ficas dos diversos países;
         gação da família, na liberdade sexual, na  hidrográficas de rios que nascem em  • Proibir o lançamento ao mar, via
         autodeterminação dos povos e nas práti-  Espanha. A área da parte portuguesa das  directa ou fluvial, de substâncias
         cas terroristas, na difusão das drogas e na  bacias hidrográficas é cerca de um quarto  químicas que  comprometam a
         criminalidade organizada, na circulação  da área total das bacias hidrográficas luso-  existência da humanidade;
         de pessoas, mercadorias, capitais e ideias,  -espanholas.               • Activar os organismos previstos na
         nas organizações internacionais e regio-  Daqui surgiu a ideia de uma sucinta, e  Convenção das Nações Unidas sobre
         nais, nos hábitos de vida, no uso e na  quanto possível esclarecedora, comuni-  Direito do Mar;
         apropriação dos recursos dos Oceanos.  cação a esta Academia sobre o regime dos
           Mais de 35% da superfície dos Oceanos  rios internacionais, em que se incluem os  • Instalar os orgãos propostos pela
         está hoje sobre a jurisdição nacional dos  nossos Minho, Lima, Douro, Tejo e  Comissão Mundial Independente
         Estados costeiros.                 Guadiana.                             para os Oceanos;
                                                                                 • Sustar o aquecimento do Planeta pela
           Segue-se uma comunicação sobre o   Por último a oração de sapiência pro-  redução das emissões poluentes para
         Tribunal Internacional de Direito do  nunciada na abertura do congresso  a atmosfera;
         Mar e a frustração por ele não ter ficado  "Vasco da Gama, os Oceanos e o Futuro,
         sediado em Lisboa, mas sim em Ham-  intitulada "A Redescoberta dos Ocea-  • Restringir fortemente o derrame de
         burgo .                            nos".                                 petróleo pelos navios-tanques e pelas
           O direito marítimo progrediu, diversifi-  Em menos de cem anos, os Descobri-  plataformas;
         cou-se e internacionalizou-se. A partir do  mentos Portugueses trouxeram ao co-  • Redobrar a atenção para com as
         século XVII deu lugar a uma especiali-  nhecimento da Europa dois terços do  actividades pesqueiras;
         dade que consiste no Direito Internacional  mundo até então desconhecido. Com eles  • Interditar a caça aos mamíferos mari-
         Público Marítimo, hoje mundialmente  conheceu-se uma enorme diversidade de  nhos;
         designado, a partir da III Conferência das  terras, de línguas, de economias, de
         Nações Unidas sobre Direito do Mar, de  religiões, de civilizações e de mentali-  • Elaborar as normas imprescindíveis às
         uma forma mais simples embora menos  dades. Tendo projectado a Europa no  marinhas do novo milénio;
         explícita, por Direito do Mar.     Mundo e o Mundo na Europa, obrigado à  • Iniciar uma gestão global e transfron-
           A imprecisão, a pouca idade e a com-  revisão do conhecimento geográfico e  teiriça dos Oceanos.
         plexidade de alguns preceitos do Direito  aproximado civilizações até então desco-
         do Mar, a magnitude dos interesses  nhecidas, os Descobrimentos Marítimos  Tudo coisas simples!
         económicos envolvidos e o melindre dos  deram, pois, início a uma nova fase da
         conflitos de soberania têm dado lugar, ao  vida da Humanidade.                           E.H. Serra Brandão
                                                                                       REVISTA DA ARMADA • AGOSTO 2001  9
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