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1 Experiências de Telegrafia Sem Fios
1 Experiências de Telegrafia Sem Fios
as as
a Bordo de um Navio da Marinha Portuguesa
a Bordo de um Navio da Marinha Portuguesa
26 de Maio de 1902
assavam escassos três anos sobre a
primeira transmissão sem fios efectua-
Pda por Marconi entre a Inglaterra e a
França e apenas um sobre a primeira liga-
ção rádio transatlântica quando a Marinha
Portuguesa efectuou as primeiras experiên-
cias de telegrafia sem fios (TSF) (1). Foi em
26 de Maio de 1902, completam-se agora
cem anos.
Justificava-se, de facto, o interesse da
Marinha neste método de comunicações,
pois a sua independência em relação aos
meios filares fazia com que fosse o único
modo de comunicar à distância com os
navios no mar. É, assim, natural que as
grandes marinhas do Mundo procurassem, O cruzador “D. Carlos”
logo após o surgimento dos primeiros
equipamentos transmissores (Marconi, 1895) nador de alta frequência alimentava dois gnéticas que, quinze anos antes, serviram de
e receptores (Popov, id.), equipar os seus eléctrodos (estes consistiam, inicialmente, base à utilização da rádio, tinham lançado a
navios com estações radiotelegráficas. Os num par de esferas e, mais tarde, em duas Alemanha para um lugar de destaque no mer-
primeiros a tê-las foram os navios de guerra chapas de ferro). O arco eléctrico criado cado das telecomunicações).
ingleses “Alexandra”, “Europa” e “Juno”, os entre os dois terminais funcionava como Refira-se que a estação montada no
navios de guerra americanos “New York” e amplificador das ondas electromagnéticas ge- “D. Carlos” diferia dos tradicionais equipa-
“Massachusets” e o paquete (também) ameri- radas que, através de uma bobine, eram mentos de faísca pelo facto dos eléctrodos
cano “St. Paul”, todos em 1899. transmitidas à antena (um dos problemas téc- utilizados para produzir o arco eléctrico (que
Também a Marinha Portuguesa acompa- nicos a ultrapassar na altura era conseguir a podia atingir o comprimento máximos 50 cm)
nhou, logo de início, os primeiros desenvol- criação de uma faísca com comprimento serem cilíndricos (arredondados nas pontas) e
vimentos desta nova técnica, tendo sido pu- suficiente para se adequar ao comprimento não esféricos. Quanto à “chave morse” utili-
blicadas notícias nos “Anais do Clube Militar de onda pretendido). Manipulando a tensão zada, era uma chave normal, pois o interru-
Naval” de 1898 e 1901, a última das quais, aplicada aos eléctrodos, conseguia-se a dese- ptor de mercúrio, além de ter uma operação
da autoria do Tenente Victor Sepúlveda, jada modulação do sinal. Naturalmente, as mais morosa (relembremos que a interrupção
anunciava para breve a adopção da TSF correntes produzidas eram muito elevadas do circuito não era instantânea), não era ade-
pelos nossos navios. São também de destacar (15 a 20 Ampéres) e as chaves de morse uti- quado a uma plataforma sujeita a balanços.
os artigos publicados em 1900 pelo então lizavam o princípio do interruptor de mer- Neste caso tornava-se mais prático dispor de
1º Tenente Carlos Viegas Gago Coutinho nos cúrio, em que o circuito era fechado ou inter- uma boa reserva de contactos de platina para
números 33 e 34 da “Revista Colonial e rompido pelo enchimento ou vazamento de substituir os que rapidamente se deteriora-
Marítima” que, no nosso país, constituíram uma cápsula com mercúrio em estado líqui- vam por efeito da faísca (e, claro, falamos
um trabalho inédito sobre os mais recentes do, de modo a evitar o arco eléctrico (nesta daquela que era indesejável).
desenvolvimentos radioeléctricos. parte do equipamento não era conveniente a A segunda estação estava montada na
Na altura, eram utilizados os chamados sua existência) entre os dois terminais. cidadela de Cascais, sob a direcção do
transmissores de faísca (2), em que um alter- Em Portugal, o navio escolhido para Tenente Apolino Gomes da Silva.
as experiências Enquanto o navio efectuava a saída da
foi o cruzador barra, entre a Torre de Belém e S. Julião, não
“D. Carlos” que, foi recebido sinal em qualquer uma das duas
para o efeito, estações, porém, ao ficarem em linha de
montou a bordo vista, foram estabelecidas comunicações com
um posto de TSF sucesso, tendo-se estas mantido enquanto o
de faísca, da mar- “D. Carlos” se afastava no sentido Leste-
ca alemã Slaby & Oeste até uma distância de 20 quilómetros. A
Arco (antecessora partir daí, embora continuasse a haver
da Telefunken) e recepção, deixavam os sinais de ser legíveis,
embarcou um tornando-se muito confusos.
técnico da mes- Nessa mesma noite foi necessário deixar à
ma nacionalida- carga os acumuladores do equipamento (um
de (as experiên- quadro de distribuição permitia associar 1, 2
cias de Heinrich ou 3 caixas destes acumuladores, de modo a
Hertz sobre a fornecer uma alimentação de 16, 32 ou 48
propagação de Volts, conforme o alcance pretendido), pelo
Estação TSF portátil construída pela firma alemã Slaby & Arco, semelhante à que foi utili-
zada nas experiências a bordo do “D. Carlos” (apenas são mostrados a chave e o receptor) ondas electroma- que as experiências foram interrompidas. No
8 MAIO 2002 • REVISTA DA ARMADA