Page 386 - Revista da Armada
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com algum respaldo se admita poder estar Bibliografia sumária: 12 Lado inferior de uma vela.
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na origem do moderno vocábulo . Cogs, Caravels and Galleons – The Sailing Ship 13 Primeiras velas redondas, ou inferiores, do mastro
É de realçar que durante o período abor- 1000-1650, coord. Richard W. Unger, Londres, grande e do traquete. Por esta época o gurupés fazia um
ângulo de cerca de 40 graus com a horizontal.
dado vários países dispunham de navios Conway, 1994. 14 Este termo no plural ainda hoje designa o conjunto
como os que descrevemos, por vezes com Francisco Contente Domingues, Os Navios do Mar de velas composto pela(s) gávea(s) e velacho(s).
denominação variada. Oceano – Teoria e empiria na arquitectura naval por- 15 Acto de afogar a proa na água por acção do balanço
Se muitas das características anteriormente tuguesa dos séculos XVI e XVII, Lisboa, Centro de His- proa-popa, provocado pela vaga ou ondulação.
tória da Universidade de Lisboa, 2004.
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Lembramos que é no gurupés que fazem arreigada
enunciadas eram comuns a esses navios in- Peter Kirsch, Galleon – The Great Ships of the Ar- os fortes estais que aguentam o mastro e o mastaréu do
dependentemente da sua origem, lembramos mada Era, Londres, Conway, 1990. traquete para vante. O termo, cuja origem não é clara,
que na realidade elas não parece derivar de garupa.
eram de todo coincidentes. 17 Cabos existentes nas testas dos
Vários estudos demonstram papa-figos (vela grande e traquete)
cuja finalidade é levar este lado da
que certas particularida- vela até à verga quando se pretende
des eram mesmo decididas Arquivo CTEN António Gonçalves carregar pano.
aquando do início da sua 18 Cabos fazendo fixo nos punhos
construção, inclusivamen- das escotas dos papa-figos, tendo
como objectivo levar os punhos ao
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te as próprias dimensões , terço quando se pretende carregar o
em grande parte de acordo pano, facilitando desta forma a pos-
com a sua utilização mais terior manobra do ferrar da vela. No
frequente: navio de guerra, navio-escola Sagres os estingues car-
transporte de mercadorias, regam os punhos para o lais.
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Cabos fixos nas testas das gáve-
cabotagem, exploração, etc. as (gávea e velacho) que têm como
Entrou-se, desta forma, na fim levar a respectiva testa à verga na
fase em que o navio de vela, manobra de carregar pano, ficando
fiel a princípios de constru- esta prolongada com o gurutil.
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Este navio do norte da Europa
ção predefinidos, passou a terá evoluído a partir da coga.
ser feito à medida das ne- 21 Em todo o caso os Castelhanos
cessidades do cliente. Um junco visto por Jan Huygen van Linschoten no final do século XVI. utilizaram indiferentemente o galeão,
No Oriente, por esta épo- tanto como navio de guerra como no
transporte de preciosas cargas. Talvez
ca, já os Chineses se haviam fechado à na- Notas: confiando, erradamente, que este, mesmo carregado, man-
vegação voltando o seu interesse para o in- 1 Apesar da afirmação peremptória, este período de tivesse intactas as suas capacidades de autodefesa.
terior do imenso território. Não obstante tal virar do século XV para XVI, fruto da parca informação 22 A forma sintética como apresentamos esta questão não
ter ocorrido pouco tempo antes da chegada existente tanto ao nível da construção naval como de toda nos coíbe no entanto de mencionar que, na opinião de mui-
de Vasco da Gama à Índia (1498), os seus a náutica em geral, continua a merecer grandes cautelas tos estudiosos, as diferenças entre a nau e o galeão seriam
na sua abordagem e tratamento.
muito menos vincadas, podendo mesmo confundir-se os
feitos e as dimensões dos navios ainda hoje 2 Tal como referimos anteriormente para a caravela, dois tipos de navios. Como é óbvio, não partilhamos desta
alimentam acesas discussões entre os estu- também o termo nau se encontra durante séculos na do- ideia. A utilização indiscriminada de ambos os vocábulos na
diosos destes assuntos. cumentação do sul da Europa, caracterizando, em fun- documentação coeva ainda hoje encontra paralelo quando
O fundo plano do junco apenas permitia ção da época, o navio utilizado prioritariamente como certas pessoas escrevem sobre navios, chamando cruzador,
que este navegasse com ventos largos, embora transporte de carga. barco ou fragata a uma corveta ou a um navio-patrulha.
E mesmo nau ou caravela ao navio-escola Sagres.
Provavelmente surgiu por esta altura a expressão
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o tipo de velame aparentemente denuncie o «quanto maior a nau, maior a tormenta». 23 O número de óvens foi sempre diminuindo ao longo
contrário. Os maiores juncos contavam com 4 Como se sabe, as naus da carreira da Índia eram dos séculos XVI a XVIII. Muito provavelmente porque fo-
três mastros colocados na linha de meia-nau, frequentemente atacadas por navios corsários quando ram introduzidas melhorias constantes na qualidade dos
podendo a ré existir dois, um em cada bor- cumpriam a torna-viagem, nomeadamente no trajecto cabos. Ainda assim Alan Villiers constatou a bordo da ré-
entre os Açores e Lisboa.
plica do Mayflower que o galope do mastro grande sofria
do, no lugar da mezena. As suas velas eram 5 No mastro mais a ré (mezena) existia uma vela lati- um desvio na ordem dos 30 centímetros, sempre que o
armadas com réguas de madeira no sentido na como na caravela. navio adornava. Nas suas próprias palavras o movimento
horizontal, paralelas à esteira . De cada uma 6 O castelo de popa comportava até três pavimentos do gurupés chegava mesmo a ser assustador.
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das réguas partia uma pequena escota o que – tolda, alcáçova e chapitéu – e o castelo de proa dois 24 25 Joanete de proa (traquete) e joanete do grande.
A retranca é onde enverga a esteira da vela (lado
permitia marear a vela com grande rigor. Este – guarita e sobreguarita. inferior) sendo a carangueja responsável pela fixação do
Ao nível do interior o pontal foi aumentando até
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mesmo sistema conferia enorme resistência ao ponto de permitir a existência de 3 ou 4 pavimen- gurutil (lado superior).
acompanhada da facilidade em rizar a dife- tos (cobertas). 26 Pequena vela triangular envergada no mastaréu
rentes níveis, além de favorecer a navegação 8 Verga da cevadeira. do gave-tope, que espiga no prolongamento do mas-
9 Este nome é-lhe atribuído pelo facto desta vela caçada tro da mezena.
a uma bolina mais cerrada. Porém, este último conferir ao navio aspecto idêntico ao das bestas de car- 27 Este termo é utilizado para caracterizar um navio de
aspecto era contrariado pela forma plana do ga, quando têm suspenso no focinho o alforge do cereal. pano redondo (square-rig) diferenciando-o do aparelho
fundo do casco. Por isso os chineses desen- 10 O processo de introdução destas velas obrigou a um desenvolvido posteriormente pelos holandeses, que uti-
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volveram tábuas de bolina , ou abatimento, aumento da altura dos respectivos mastros através da uti- liza velas latinas quadrangulares envergadas no próprio
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que eram colocadas a meio-navio no exte- lização de um novo tronco em madeira, mais fino, deno- mastro (fore-and-aft).
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Tratava-se, resumidamente, de uma extensão da
rior em ambos os bordos. minado mastaréu. Na extremidade superior do mastro real cana do leme que permitia o governo afastado desta.
(parte inferior do mastro), local de transição para o mas-
Neste tipo de navios, que segundo Marco taréu (parte superior do mastro), encontra-se localizado o 29 Galeon (castelhano), galleon (inglês), galion
Polo (1298) transportavam mais de 300 ho- cesto da gávea. Esta plataforma, assente no calcês do mas- (francês).
mens, terá comprovadamente Zheng Ho na- tro real, ajuda a espalhar a enxárcia do mastaréu, pelo que 30 Comprimento, boca, calado, pontal, etc.
Actualmente nalguns tipos de embarcações são uti-
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vegado por todo o Índico, entre 1405 e 1433. a sua acção se torna mais eficaz. Independentemente da lizadas réguas na respectiva vela grande com o objectivo
designação do mastro este cesto recebe sempre a deno-
No entanto as suas reais dimensões e o ver- minação de cesto da gávea, acrescido do nome do mas- de melhorar a sua capacidade para bolinar.
dadeiro alcance geográfico das viagens em- tro (e.g. cesto da gávea do traquete). Uma crescente área 32 O efeito é idêntico ao do vulgar patilhão, comum na
preendidas ainda hoje mantêm como reféns vélica distribuída por um sempre maior número de vergas vela ligeira. Também estas podiam ser recolhidas quando
os partidários mais ingénuos desta tese. obrigou a guarnições mais numerosas, fenómeno que só se navegava com o vento na popa, ou quando os fundos
baixos o exigiam.
conheceu o seu epílogo em finais do século XIX.
Z 11 As velas recebem o nome da verga na qual se en- 33 Este expediente, que ainda hoje pode ser observado
António Manuel Gonçalves contram envergadas. Segundo apurámos é itálica a ori- em muitas embarcações e navios que navegam pelos ca-
CTEN gem de ambos os termos: velaccio e gabbia, tendo o nais dos Países-baixos, terá sido adoptado pelos Holande-
am.sailing@hotmail.com segundo raiz no latim cavea. ses na sequência da sua chegada ao Oriente.
24 DEZEMBRO 2005 U REVISTA DA ARMADA