Page 80 - Revista da Armada
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VALORES, IDENTIDADE E MEMÓRIA                                                               11


                               BANDA DA ARMADA


            Símbolo do profissionalismo e excelência cultural da Marinha



           “…E eles começaram logo a tanger quatro ou cinco  gas e fanfarras. Exemplo disso é a viagem de 1955 à Índia, a bordo
         flautas…E o capitão-mor mandou tanger as trombetas,   do “Bartolomeu Dias”, em que se salienta a actuação da charanga
         e nós em os batéis bailávamos, e o capitão-mor também   no desfile de homenagem a Afonso de Albuquerque, em Damão.
                                                              Esta viagem ficou imortalizada na magistral descrição de Urbano
         de volta connosco.”, in Diário de Vasco da Gama      Tavares Rodrigues, no livro “Jornadas no Oriente”. Na memória de
                                                              muitos ficou também o conjunto musical “Os Náuticos” que, no iní-
               o longo dos mais de quinhentos anos de existência de forma-  cio da década de 70, actuou para as forças militares estacionadas nas
               ções musicais na Armada, estas sofreram inúmeras alterações,  províncias ultramarinas. Ao longo de quase dois anos percorreram
         Ada designação ao número de elementos que as constituíram,  a Guiné, Cabo Verde, Angola e Moçambique, em várias digressões
         tornando uma enumeração exaustiva praticamente impossível, até por  a bordo do navio mercante “Vera Cruz” e em unidades navais.
         manifesta ausência de informação fidedigna. Na realidade, as fontes   No início da década de 80, sob a direcção do CTEN Manuel Maria
         históricas só são razoavelmente seguras sobre esta matéria a partir  Baltazar (1976-1987), a Banda da Armada ganhou uma consistente vi-
         da primeira metade do século XVIII, e                                     sibilidade junto da sociedade civil, cons-
         indicam que, em Agosto de 1740, exis-                                     tatando-se a sua merecida inclusão no
         tia na Armada Real uma música intitu-                                     grupo das melhores bandas filarmóni-
         lada “Charamela”. O seu aparecimento                                      cas do país. O contacto sistemático com o
         coincide com um dos períodos áureos                                       grande público foi o início de uma longa
         da música em Portugal, em que a Or-                                       sucessão de salas cheias e extraordinárias
         questra de Câmara da Rainha D. Maria I                                    inovações, prestigiando a Marinha atra-
         apenas era suplantada, em dimensão e                                      vés do virtuosismo, dedicação e talento
         qualidade, pela do Papa. Do primeiro                                      dos seus músicos. Na década seguinte,
         maestro de que há memória histórica,                                      já com o CFR José Joaquim Araújo Perei-
         Caetano Tozzi, apenas se sabe que era                                     ra como maestro (1987-2006), empreen-
         italiano e músico da Câmara Real.                                         deu várias deslocações pelo país e pelo
           A 27 de Novembro de 1807, durante                                       estrangeiro, todas com grande sucesso.
         as invasões napoleónicas, a Banda da                                      Destacam-se as actuações a França, por
         Brigada Real da Marinha acompanhou                                        ocasião do 5º Festival Internacional de
         D. João VI e a Família Real na sua reti-                                  Música Militar e aos EUA, onde parti-
         rada para o Brasil. Tinha como regente                                    cipou no XII Festival Internacional das
         o italiano Pascoal Corvalini. Em 1821,                                    Azáleas. Em 1998 actuou nas Bodas de
         quando o soberano regressou ao reino,                                     Diamante do IPO e em diversos eventos
         voltaram apenas dois dos músicos, ten-                                    no âmbito da Expo 98, entre os quais dois
         do os restantes sido integrados na Ar-                                    concertos que foram aplaudidos em apo-
         mada Brasileira, criada por D. Pedro.                                     teose por milhares de pessoas. Em todas
         Em 1863, a Charanga, constituída por 27 executantes e dirigida por  as actuações a Banda da Armada enalteceu a música portuguesa, de-
         Arthur Reinhardt, acompanhou D. Fernando II a Bordéus, a bordo  monstrando a sua vocação de serviço público e o papel fundamental
         da Corveta “Mindelo”. É da responsabilidade deste monarca a vinda  na preservação da tradição musical nacional. Por isso, em 1999 foi-lhe
         para Portugal do maestro Mark Holzel, que passou a ser responsável  concedida a Medalha de Ouro dos Serviços Distintos pelo Almirante
         pela direcção de 20 músicos do Batalhão Naval.       CEMA. No seu louvor enalteceu o “notável desempenho, inexcedível
           A 3 de Abril de 1903 a Banda dos Marinheiros da Armada grava, no  dedicação e vontade de bem servir, graças ao profissionalismo e ex-
         Quartel do Corpo de Marinheiros, em Alcântara, aquele que é conside-  celência dos seus músicos, do qual resultou lustre, honra e prestígio
         rado o primeiro disco produzido em Portugal, um documento histórico  para a Marinha.”
         e fonográfico raríssimo. A capa contém o selo real e a inscrição “Oferta   No último ano a direcção da Banda da Armada passou a estar a car-
         do Maestro António Maria Chéu ao rei D. Carlos”. A gravação, efectua-  go do CFR Carlos Silva Ribeiro que, na linha dos seus antecessores, a
         da pela The Gramophone and Typewriter Ltd. de Londres, pretendia co-  tem conduzido por padrões de alta qualidade e eficiência, executando
         memorar a visita de Eduardo VII de Inglaterra a Portugal, através da  programas atractivos e de reconhecida qualidade técnica, obtendo sig-
         perenização de uma das mais notórias obras musicais relativas à iden-  nificativos êxitos e suscitando o mais vivo e caloroso entusiasmo das
         tidade nacional, os Cantos Populares Portuguezes nº2 de Rodriguez.  audiências. Em Janeiro deste ano a Banda contava com 107 músicos,
           Em 1922 a Banda dos Marinheiros da Armada integrou a viagem  muitos dos quais com formação superior e com uma média etária de
         oficial do presidente António José de Almeida, a bordo do navio  33 anos. Fruto do esforço de renovação e dinamização levado a cabo
         “Porto”, para participar nas comemorações do 1º Centenário da  nos últimos anos, os resultados reflectem-se no grande valor e visibi-
         Independência do Brasil. Realizou diversos concertos no Rio de Ja-  lidade nacional e internacional das suas actuações ao vivo e na cons-
         neiro, com retumbante sucesso do público e da crítica, tendo como  tante gravação e edição de CD’s. Na realidade, ao longo dos tempos
         chefe o CTEN Artur Fernandes Fão. Durante os 35 anos da sua re-  têm pertencido e continuam a despontar na Banda da Armada, vários
         gência (1920-1955) a Banda dos Marinheiros da Armada é referida  compositores de reconhecido mérito e alguns dos melhores instrumen-
         em múltiplas Leis e Decretos-Lei, que provocam diversas reestru-  tistas portugueses. O futuro vem, por isso, impregnado de esperança e
         turações, abrangendo a designação, a composição, a forma de ad-  de vontade determinada de perpetuar e prestigiar o legado cultural do
         missão e os ajustamentos salariais dos músicos.      país na Marinha, através da música.
            Muitos foram os navios da Armada que fizeram uso de charan-                                         Z

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