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GAGO COUTINHO
GAGO COUTINHO
MARINHEIRO, GEÓGRAFO, AVIADOR, SÁBIO E HERÓI
MARINHEIRO, GEÓGRAFO, AVIADOR, SÁBIO E HERÓI
1869-1959
“Andarilho no sertão, Neste período, em que cruzou o
Marinheiro aventureiro, Atlântico e o Índico em veleiros e na-
Os sete mares percorreu… vios mistos, adquiriu uma grande ex-
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Aviador destemido, periência na manobra de navios à vela
Pelo povo foi querido, e um profundo conhecimento dos ven-
Nossa Pátria engrandeceu.” tos e das correntes daquele vasto espa-
ço oceânico, aos quais viria, mais tarde
José da Silva Henriques,
in Margens de um Rio, 1991 a recorrer abundantemente, já noutras
labutas.
INTRODUÇÃO Embarcando, ainda, na corveta cou-
raçada “Vasco da Gama”, dali desta-
o mês em que se assinalam os caria, em finais de Março de 1898, para
140 anos do seu nascimento cumprir a primeira de várias comissões
Ne os 50 anos da sua morte, re- como geógrafo ultramarino, no âmbito
cordemos a figura ímpar do Almirante da Comissão de Cartografia, criada em
Gago Coutinho, passando em revista 1883. Seria este o tipo de trabalho que o
cada uma das suas múltiplas facetas, as ocuparia nas décadas seguintes, embora
quais, embora grosseiramente balizáveis o interrompesse entre 1911 e 1912 para
no tempo e no espaço, se interligam e in- exercer mais dois comandos no mar: o
tercalam em contínuo, centradas numa da canhoneira “Sado”, em missão na
única e grandiosa personalidade. Índia Portuguesa, e o da canhoneira
“Pátria”, na qual participou na cam-
O MARINHEIRO panha de Timor, entre Abril e Junho de
1912. No decurso destes combates, em
Carlos Viegas Gago Coutinho nasceu que foi dominada uma revolta nativa,
em Lisboa , a 17 de Fevereiro de 1869. Gago Coutinho, 1º Tenente. o seu engenho concebeu um sistema
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Podemos dizer que tinha, de nascença, san- te a qual a força naval portuguesa, enviada a pioneiro para aumentar o alcance das peças
gue marinheiro, pois o seu pai, marítimo do proteger os interesses nacionais, dá asilo aos de artilharia do navio, tendo a sua acção sido
Algarve, servira na Marinha até 1873, tendo militares vencidos. Ali contrai a febre-amare- muito louvada.
embarcado na nau “Vasco da Gama” e na fra- la, sendo um dos três sobreviventes dos seis
gata “D. Fernando II e Glória” (tinha, ainda, oficiais contagiados. E os embarques pros- O GEÓGRAFO
outra “costela” marítima no tio materno, pa- seguem, em rápida sucessão: serve a bordo
trão de um caíque). Praticamente não chegou da canhoneira “Liberal” e viaja pelo Atlân- Em 1885, a Conferência de Berlim consagra-
a conhecer a mãe, também algarvia, que per- tico Norte na corveta “Duque da Terceira”; ra no Direito Internacional o reconhecimento
deu em muito tenra idade (ficando a cargo de parte para Moçambique no transporte “Pero da ocupação efectiva dos territórios ultrama-
uma sua amiga). de Alenquer”, passa à corveta “Rainha de rinos em detrimento dos chamados “direitos
Uma vez que a família não era de gran- Portugal” e regressa a Lisboa na canhonei- históricos” e preconizara uma divisão terri-
des posses, o pai não teve possibilidades de ra “Douro”. torial efectiva, mais rigorosa do que as tradi-
o mandar estudar Engenharia na Alemanha, cionais zonas de influência . No ano seguin-
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como o jovem desejava, o que o levou a optar te, Portugal estabelecia com a França e com a
por seguir uma carreira na Marinha. Frequen- Alemanha os limites da Guiné e de Angola
tou, assim, a Escola Politécnica entre 1885 e e, em 1891, na sequência do Ultimatum, assi-
1886, completando o curso da Escola Naval nava com a Inglaterra os tratados referentes
nos dois anos seguintes. às fronteiras de Angola e Moçambique com
Em 1888 embarcou na corveta “Afonso de a África do Sul. Procurando adaptar-se aos
Albuquerque”, na qual viajou para Moçam- novos tempos, e colmatando o trabalho inci-
bique e integrou a Divisão Naval da África piente até então realizado, o País levou, então,
Oriental, participando nas operações militares a cabo, o levantamento geográfico sistemático
de ocupação da zona do Tungue, destinadas das suas possessões de além-mar, recorrendo
a contrariar as pretensões territoriais do sul- frequentemente às valências dos militares ali
tão de Zanzibar . destacados, sobretudo aos oficiais de Mari-
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Promovido a Segundo-Tenente em 7 de nha, cuja formação de base em Navegação,
Março de 1891, e após uma breve comissão Astronomia, Hidrografia e Matemática era a
na canhoneira “Zaire”, cumpre o seu primei- que mais se adequava àquele tipo de solicita-
ro comando na lancha-canhoneira “Loge”. ções . É assim que, no período compreendido
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Seguem-se as canhoneiras “Limpopo” e entre 1898 e 1918, vamos encontrar Gago Cou-
“Zambeze”. tinho a trabalhar como geógrafo de campo em
Na corveta “Mindelo” segue para o Brasil, O CTEN Gago Coutinho e o 1TEN Costa Marques missões geodésicas e de delimitação de fron-
em 1893, na altura em que ocorre, no Rio de num intervalo dos trabalhos da demarcação da fronteira teiras nas províncias de Timor, Moçambique,
Janeiro, a “Revolta dos Almirantes”, duran- do Barotze. Angola e S. Tomé.
REVISTA DA ARMADA U ABRIL 2009 17