Page 318 - Revista da Armada
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NOTÍCIA
ENCERRAMENTO DO PÓLO DE VILA FRANCA DE XIRA
DA ESCOLA DE TECNOLOGIAS NAVAIS
¬ÊNo passado dia 1 de Setembro, sob a presidência do CEMA,
Almirante Melo Gomes, realizou-se a Cerimónia de Encerramen-
to do Pólo de Vila Franca de Xira da Escola de Tecnologias Navais Fotos CAB L Figueiredo
(ETNA), cumprindo-se assim mais um novo e decisivo passo no
reordenamento do Parque Escolar, no âmbito do Sistema de For-
mação Profissional da Marinha.
Perante altos comandos da Marinha, antigos comandantes do
G1EA, oficiais, sargentos e praças em serviço na Unidade, o even-
to foi iniciado com umas breves palavras do actual Comandante
da ETNA, CMG Antunes Rodrigues, que afirmou: Vila Franca fica
na memória dos nossos marinheiros e de muitos portugueses, como uma
grande escola de formação cívica militar e técnica. Seguiu-se a alocu-
ção do Almirante CEMA que destacou: a actividade de formação que
nestes oitenta anos, fruíram dezenas de milhares de alunos representa um
património incalculável de que muito justamente nos podemos orgulhar
e terminou deixando uma palavra de regozijo pela forma como a Mari-
nha sempre foi acolhida pela comunidade local e, de uma forma geral, pelos
organismos e entidades com que foi interagindo, manifestando a certeza
que este relacionamento ficará na memória desta terra, mas também na
dos milhares de marinheiros que por aqui passaram.
Após a leitura da Ordem do Dia à Unidade foi realizada a ceri-
mónia do arrear da Bandeira Nacional, acto que marcou o fim da
presença de 84 anos da Marinha em terras vilafranquenses.
Um descuido fatal
Um descuido fatal
m Agosto de 1949, fui colocado no aviso de 1ª classe “Bartolomeu dirigia uma equipe empenhada na reparação de uma máquina de frio,
Dias” o qual, com o “Afonso de Albuquerque”, eram os navios trabalho que estava a fazer juntamente com dois operários do estaleiro.
E mais importantes da nossa Marinha de Guerra. Fui desempe- Todavia, não conseguia perceber qual a razão que motivou tal desastre.
nhar as funções de encarregado do serviço de Electricidade, Torpedos Não percebeu dado que, só mais tarde, veio a saber-se que a explosão
e Minas, cuja especialização tinha acabado de obter na Escola de Vila na máquina aconteceu por esta ter sido carregada com uma garrafa de
Franca de Xira. oxigénio em vez de CO2. Assim, quando a máquina foi posta a trabalhar,
O “Bartolomeu Dias” encontrava-se atracado ao cais, em Alcântara, uma pequena faísca foi suficiente para motivar a explosão. Na realida-
a ser sujeito a grandes fabricos pelo pessoal dos Estaleiros da CUF e, de, o incidente resultou do facto das garrafas contendo gases, ao serem
nem sequer, tinha oficial de serviço. Alguns transportadas rodando pelo chão, irem per-
oficiais que já compunham a guarnição iam, dendo os dizeres indicativos do seu conteúdo.
de manhã, para bordo. Assim, no fatídico dia Passou, então, a haver instruções, muito rigo-
9-9-1949, poucos minutos depois das 9 horas, rosas, para que tal não tornasse a acontecer. O
estava eu a fardar-me no camarote, que dava descuido tinha custado quatro vidas.
para a praça d’armas, quando oiço um estron- Coube-me a mim ir dar esta horrível no-
do violento, logo seguido por fumo que saía tícia aos pais do Taborda, que moravam nas
dum porão mesmo ali a meus pés. Para meu proximidades do Hospital da Marinha, para
espanto, passados poucos segundos, de súbi- onde tinham ido os corpos queimados. Quan-
to, saem do porão, dois homens desvairados, do cheguei a sua casa, já lá não estavam. Um
com suas roupas a arder. Nem me ouvem. Sobem as escadas que os leva jornalista tinha chegado primeiro.
ao convés, saem mesmo do navio até que caem exaustos, sem forças. Estou a escrever estas linhas no dia 9-9-2009, exactamente sessenta
O tenente Saturnino Monteiro, que já se encontrava a bordo, aparece e anos depois de tão trágico acontecimento. Elas que sirvam para mos-
é ele que desce ao porão para ver se há mais vítimas. Dois corpos inani- trar que as normas de segurança -- neste caso, a perfeita identificação do
mados são trazidos para cima, com as roupas ardidas, sem que os con- conteúdo das garrafas de gás -- devem ser rigorosamente cumpridas. E,
sigamos reconhecer. É pelo relógio (comprado há dias e para o qual me também, para recordar os nomes das vítimas:
tinha sido chamada a atenção) que identifico o tenente Taborda, nosso 2º ten. maq. naval José Taborda Ramos
companheiro de câmara. O outro é um operário do estaleiro. Todos os 2º cabo fogueiro Domingos Gouveia
quatro faleceram devido às queimaduras. Operários da CUF: Rui de Sousa Pinto e João Pina Ferreira
A história desta tragédia, conhecemo-la logo de seguida pelo teste- Mas a tragédia do 9-9-49 não se esgotou na explosão que acabamos
munho dum sargento, que pertencia à equipe de trabalho que estava no de relatar. A esposa do comandante do navio, capitão-de-mar-e-guerra
porão a reparar uma máquina de frio. De facto, quando uma das pra- Negrão Neto, falece nesse mesmo dia. Um dia que não podia ser pior!
ças se preparava para ir buscar uma peça de ferramenta, ele ofereceu-se Z
para a trazer, pois tinha de ir à oficina. Teve um dia de sorte que nunca A. Estácio dos Reis
mais esquecerá. É ele que nos pôs a par da situação: o tenente Taborda CMG
28 SETEMBRO/OUTUBRO 2009 U REVISTA DA ARMADA