Page 349 - Revista da Armada
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e San Francisco. Nesta ocasião compartilhei o o Presidente Mário Soares, numa viagem rializou-se na atribuição da medalha da Cruz
meu alojamento com outro grande amigo da que ele fez a bordo da barca, desde São Mi- Naval. Recebi essa medalha no Alfeite e na ce-
“S agres”, já falecido, o pintor francês Roger guel, nos Açores, até Lisboa. Noutra ocasião, rimónia estiveram presentes muitos dos meus
Cha pe let. Mantivemos também uma amizade embarquei com o meu amigo Silva Horta, amigos, que conheci aqui a bordo.
de longa duração com ele, possuindo em mi- quando ele era Ministro da República para Fui ainda sponsor de diversos oficiais portu-
nha casa três quadros por ele pintados. os Açores. gueses que frequentaram o Naval War Co lle ge
Noutra viagem interessante tive a compa- Aconteceu-me ainda um outro episódio em Newport. Cada oficial estrangeiro que fre-
nhia de um fotógrafo da IBM, Carl Lindenberg. curioso, com uma pessoa que conheci graças quenta aquela escola necessita de um sponsor
Conhecemo-nos casualmente em Newport, du- à “Sagres”. Numa das viagens de regresso americano, e eu acedi de boa vontade a desem-
rante uma estadia da barca naquela cidade. O de Portugal para minha casa, num voo da penhar esse papel.
fotógrafo estava interessado em embarcar num TAP, um dos pilotos tinha sido cadete da Es-
dos navios lá presentes e eu pedi ao comandan- cola Naval e embarcado numa das viagens Tendo uma larga experiência de embar-
te se ele poderia embarcar. Foram conseguidas que eu fiz. Quando me viu, reconheceu-me que na “Sagres”, diga-nos como lhe pareceu
as devidas autorizações, tendo ele realizado um e convidou-me a visitar a “cabine” de pilo- o navio nesta viagem.
trabalho excelente de fotografia. tagem, tendo feito grande parte da viagem Todos os navios passam por fases melhores
Nessa viagem tive oportunidade de assis- na “cabine”. e outras piores. Os factores que influenciam es-
tir a dois acidentes, simultâneos, à largada sas fases são diversos: tempo desde a última
das Bermudas. Os navios envolvidos foram o Sendo uma pessoa com uma grande liga- manutenção profunda, maior ou menor dis-
“Christian Radich” e o “Gazela Primeiro”, por ção a Portugal, e vivendo numa região com ponibilidade financeira para apoiar melhorias
um lado, e o “Libertad” e o “Juan Sebastian de uma enorme comunidade portuguesa, como internas e, acima de tudo, o empenhamento da
Elcano”, por outro. No final da viagem, o fo- classifica o seu relacionamento com essa co- respectiva guarnição. Posso dizer que desta
tógrafo ofereceu-me inúmeras fotos desse em- munidade? vez fiquei bastante surpreendido, pela positi-
barque, tendo eu organizado um álbum que Considero que tenho mantido excelen- va, com o aspecto do navio e o seu estado.
ofereci ao Museu de Marinha em Lisboa. tes relações com a comunidade portugue- Gostei também bastante da saída de Nova
Noutra ocasião, ofereci ao navio dois qua- sa. Tenho cerca de quinhentos emprega- Iorque, descendo o rio Hudson com todo o
dros de pintores luso-americanos. Um desses dos nas minhas empresas. Destes, cerca pano, num domingo, com milhares de pes-
quadros tive oportunidade de o ver, na cama- de quatrocentos e cinquenta são portugue- soas a passear na zona ribeirinha; assim como
rinha do comandante, quando esta semana ses. Sempre fui uma pessoa muito activa da entrada em Boston, também com todo o
fui convidado para lá jantar. junto da comunidade portuguesa de New pano, até curta distância do cais de atracação,
Bedford. Mesmo a minha casa de Inver- numa cidade que estava a iniciar um festival
Nessas viagens, conheceu ou embarcou no, na Florida, pertence a uma sociedade náutico, contando com a presença de deze-
com pessoas de elevada relevância na so- luso-americana. nas de veleiros.
ciedade portuguesa? O reconhecimento dessa minha ligação a Z
Sim! Tive oportunidade de navegar com Portugal e à comunidade portuguesa mate- (Colaboração do NRP “SAGRES”)
VIGIA DA HISTÓRIA 15
Recrutamento
Recrutamento
O
recrutamento do pessoal da marinhagem para o serviço nos de prisão e perda de vencimento, isentar do serviço qualquer indi-
navios da Marinha de Guerra foi, durante muito tempo, víduo recrutado.
efectuado por meios que estavam longe de ser pacíficos.
Todos os recrutados desta forma seriam encaminhados para o
Uma das formas mais utilizadas consistia na elaboração de lista- Arsenal de Marinha onde se procederia ao respectivo registo com
gens de marítimos, em cada um dos portos, de onde depois eram re- indicação do seu recrutador.
tirados, de forma proporcional, os indivíduos compelidos a servir. No sentido de evitar a retenção indevida seriam passadas 2 revis-
As proporções atrás referidas variavam conforme as necessida- tas diárias por um júri constituído por representantes da Auditoria
des, desde um em cada vinte até, por exemplo, um em cada quatro, e 2 médicos navais.
como se encontrava estabelecido em Abril de 1799. Todos os que, nessas revistas, apresentassem defeitos físicos ou
Outro dos métodos utilizados consistia em retirar os tripulantes doença, seriam de imediato isentos do serviço e bem assim todos
necessários das guarnições matriculadas nos navios mercantes, tal os que apresentassem razões de natureza legal, a comprovar do-
situação, bastante frequente no século XVIII na cidade do Porto, era cumentalmente, para serem isentos do serviço, os restantes seriam
registada nos Livros de Matrícula com a seguinte anotação: logo classificados como marinheiros ou grumetes e remetidos, sob
“Preso para o serviço dos navios da Coroa” escolta, para os respectivos navios.
No início do século XIX, face às carências de pessoal da marinha- Todos os indivíduos cuja isenção estivesse dependente de apresen-
gem para o completamento das lotações dos navios da Coroa, a Se- tação de documentos manter-se-iam retidos, devendo a respectiva
cretaria de Estado dos Negócios da Marinha obteve, por via legisla- prova ser apresentada até 3 dias, findos os quais, não o fazendo, seriam
tiva, autorização para proceder a um recrutamento extraordinário, classificados e remetidos para os navios que lhes destinassem.
o que foi concretizado através da Portaria de 26 de Agosto de 1817 O diploma estabelecia ainda um prémio para os dois recrutadores que
que, para evitar o recurso a meios violentos de recrutamento, estabelecia mais depressa completassem as “quotas” que lhes haviam sido fixadas,
um conjunto de procedimentos simplificados. o primeiro receberia 800 reis por cada marinheiro e 400 por cada grume-
Assim, o recrutamento seria efectuado por oficiais da Auditoria te enquanto ao segundo seria atribuído metade daqueles valores.
Geral da Marinha, nomeados para o efeito, com autoridade para re- Provavelmente ainda com alguns erros, é bem certo que o recru-
crutarem todo e qualquer indivíduo que reconhecidamente perten- tamento hoje em dia não parece tão agressivo como então.
cesse à vida do mar ou aqueles que, pelo seu traje e disposição, sejam, Z
considerados como aptos para tal tipo de vida. Com. E. Gomes
Nenhum dos encarregados do recrutamento poderia, sob pena Fonte: Gazeta de Lisboa 17 de Setembro de 1817
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