Page 5 - Revista da Armada
P. 5
O Tratado de Lisboa e a Política Comum
de Segurança e Defesa
Como foi amplamente noticiado, o Tra- (…) a pedido das autoridades políticas do Esta- domínio da PESC, as Cooperações Reforçadas
tado de Lisboa entrou em vigor no pas- do-Membro afectado” (artigo 222.º, n.º 2). Esta obrigam a decisão unânime do Conselho, en-
sado dia 1 de Dezembro de 2009. Muito disposição poderá levar ao empenhamento de quanto nos outros domínios não é requerida
se tem escrito e debatido sobre o processo que meios da Marinha, em situações de salvamen- a unanimidade. Todavia, o Tratado de Lisboa
conduziu à sua aprovação e sobre as altera- to em massa, destruição de infra-estruturas crí- introduz, para matérias de segurança e defe-
ções que vem introduzir, embora as questões ticas ou derrame no mar de matérias poluentes sa, um outro mecanismo bem mais inovador
de segurança e defesa não ocupem a primei- ou perigosas, entre outras, em que os meios e revolucionário, em que não é requerida una-
ra linha dos assuntos debatidos. Dessa forma, navais possam ser preponderantes. nimidade no Conselho.
apresentam-se abaixo, sinteticamente, as sete
principais mudanças que o Tratado introduz Em quarto lugar, alarga-se o leque de mis- Trata-se da sexta inovação, respeitante à cria-
neste domínio. sões englobadas no âmbito da PCSD. Com o ção de Cooperações Estruturadas Permanentes.
Tratado de Lisboa, passa a estar prevista a uti- ÊÕÊiV>ÃÊ`iÊyiÝL`>`iÊVÀ>`ÊiëiV-
A primeira novidade consiste na alteração lização, no exterior, da capacidade operacional ficamente para a PCSD segundo o qual “os Es-
da designação da Política Europeia de Segu- da União Europeia, apoiada em meios civis ou tados-Membros cujas capacidades militares pre-
rança e Defesa (PESD) para Política Comum militares, nas seguintes missões (Tratado da encham critérios mais elevados e que tenham
de Segurança e Defesa (PCSD). De facto, com União Europeia, artigo 43.º, n.º 1): assumido compromissos mais vinculativos na
o Tratado de Lisboa, todas as
“políticas europeias” passam UÊÃêiÃÊVÕÌ>ÃÊiÊ>ÌjÀ>Ê`iÊ`iÃ>À- matéria tendo em vista a realiza-
a designar-se como “políti- mamento; ção das missões mais exigentes
cas comuns”, pelo que a se- estabelecem uma Cooperação
gurança e defesa não é caso UÊÃêiÃÊ
Õ>Ì?À>ÃÊiÊ`iÊiÛ>VÕ>XKÆ Estruturada Permanente” (Tra-
isolado. No entanto, a altera- UÊÃêiÃÊ`iÊ>VÃi
>iÌÊiÊ>ÃÃÃÌkV>Ê tado da União Europeia, arti-
ção não é apenas de ordem em matéria militar; go 42.º, n.º 6). As Cooperações
semântica, já que o Tratado UÊÃêiÃÊ`iÊ«ÀiÛiXKÊ`iÊVyÌÃÊiÊ`iÊ Estruturadas Permanentes são
de Lisboa fortalece os meca- manutenção de paz; aprovadas pelo Conselho por
nismos de acção no âmbito UÊÃêiÃÊ`iÊvÀX>ÃÊ`iÊVL>ÌiÊ«>À>Ê>Ê}iÃ- maioria qualificada. Esta dispo-
dos negócios estrangeiros e tão de crises (incluindo as missões de restabe- sição abre caminho a que núcle-
da segurança e defesa, pelo lecimento da paz e as operações de estabiliza- os de Estados-Membros estabe-
que a mudança de designa- XKÊÊÌiÀÊ`ÃÊVyÌî° leçam cooperações mais estreitas
ção também pode (e deve) Apesar do alargamento do leque de mis- e compromissos mais fortes no
ser entendida como um si- sões, elas continuam a caracterizar-se por uma domínio da segurança e defesa,
nal disso mesmo. Importa grande componente civil e por uma reduzida passando a permitir políticas de
acrescentar que as decisões componente militar. segurança e defesa diferenciadas
relativas à PCSD continuam Em quinto lugar, o Tratado de Lisboa alarga aos vários Estados-Membros.
a ser adoptadas pelo Conselho, por unanimi- os domínios das Cooperações Reforçadas. Este Para que uma Cooperação Es-
dade, sob proposta do Alto Representante da tipo de cooperações já estava previsto nos Tra- truturada Permanente se constitua, os partici-
União para os Negócios Estrangeiros e a Polí- tados de Amesterdão e de Nice, constituindo pantes deverão comprometer-se a um conjunto
tica de Segurança (Tratado da União Europeia, um mecanismo que permite a um grupo de, de objectivos que servem para aferir o compro-
artigo 42.º, n.º 4). pelo menos, nove Estados-Membros aprofun- metimento de cada país na segurança e defesa
darem a sua cooperação, numa determinada e que estão detalhados num protocolo adicio-
A segunda inovação tem a ver com a intro- matéria. A partir do Tratado de Nice este me- nal ao Tratado da União Europeia. O último
dução de uma disposição que poderemos de- canismo passou a aplicar-se explicitamente artigo do protocolo estabelece que a Agência
signar como “cláusula de defesa mútua”: “Se à Política Externa e de Segurança Comum Europeia de Defesa (European Defense Agency
um Estado-Membro vier a ser alvo de agres- (PESC), mas sem poder incidir em matérias - EDA) contribui para a avaliação regular dos
são armada no seu território, os outros Es- que tivessem implicações militares ou no do- contributos dos Estados-Membros participan-
tados-Membros devem prestar-lhe auxílio e mínio da defesa. O Tratado de Lisboa estende tes em matéria de capacidades, o que significa
assistência por todos os meios ao seu alcance, o mecanismo das Cooperações Reforçadas a que esta agência terá um papel importante na
em conformidade com o artigo 51.º da Carta essas matérias. Importa acrescentar que, no manutenção e eventual exclusão de cada um
das Nações Unidas. Tal não afecta o carácter dos participantes nas Cooperações Estrutura-
específico da política de segurança e defesa das Permanentes.
de determinados Estados-Membros. Os com- Isto remete directamente para a sétima ino-
promissos e a cooperação neste domínio res- vação do Tratado de Lisboa, que corresponde
peitam os compromissos assumidos no qua- ao alargamento do papel da EDA, através da
dro da NATO, que, para os Estados que são qual se pretende desenvolver uma verdadei-
membros desta organização, continua a ser ra política comum de armamento e coordenar
o fundamento da sua defesa colectiva e a ins- o esforço de aquisição de material militar por
tância apropriada para a realizar” (Tratado da parte dos diferentes Estados-Membros, tentan-
União Europeia, artigo 42.º, n.º 7). do evitar a duplicação de programas actual-
mente existente.
Em terceiro lugar, foi instituída uma cláu- Em síntese, são estas as principais inovações
sula de solidariedade (Tratado sobre o Fun- do Tratado de Lisboa na segurança e defesa,
cionamento da União Europeia, artigo 222.º), as quais marcam uma vontade de aprofunda-
segundo a qual os países se comprometem a mento da integração nestas matérias.
prestar assistência a um Estado-Membro que
seja “alvo de um ataque terrorista ou vítima de Z
uma catástrofe natural ou de origem humana
(Colaboração do ESTADO-MAIOR DA ARMADA)
REVISTA DA ARMADA U FEVEREIRO 2010 5