Page 26 - Revista da Armada
P. 26

HIERARQUIA DA MARINHA                                                                                                     3

Apalavra arrais é de origem árabe                    ARRAIS                                      também foi concedido aos arrais de Lisboa.
         e, segundo a Grande Enciclopédia                                                           Existem outros documentos que con-
         Portuguesa e Brasileira, significa     sa anterior a 1460”, é afirmado o seguinte:
mestre ou patrão de embarcação. A sua uti-         «D. Dinis pela graça de Deus Rei de           firmam «todos os seus privilégios, foros,
lização em Portugal remonta ao início da                                                         liberdades e bons costumes de que sempre
nacionalidade, quando identificava o pa-        Portugal e do Algarve a quantos esta carta       usaram» e, a par destes, outros em que se
trão de uma embarcação de pesca, tal como       virem, faço saber que eu querendo guar-          renovam ou afirmam os seus direitos, des-
hoje acontece relativamente às de mais pe-      dar aos alcaides, arrais e petintais das mi-     tacando se os de 3 de Junho de 1388 e de 11
queno porte.                                    nhas galés os foros (pensões) e costumes         de Fevereiro de 1397, promulgados no rei-
                                                que houveram com os outros Reis que              nado de D. João I, nos quais se estabelece a
   Relativamente à tripulação das galés, é      antes de mim foram, e querendo-lhes fa-          parte que competia aos arrais na divisão das
de notar que a designação de arrais aparece     zer graça e mercê; outorgo-lhes nesta gui-       coisas tomadas pela frota a que pertenciam.
usualmente a seguir à palavra alcaide. Tal      sa, que sejam quites doste (?) e danuduua
facto indicia que, a bordo desses navios mi-    (?) e de fossadeira (tributo) e das outras           Refere Silva Marques, em “Descobri-
litares, o posto de arrais era inferior ao de   peitas (tributos) que a mim pertencem.           mentos Portugueses”, que os arrais de Lis-
comandante, equivalendo, provavelmente,         E eles devem estar prestes para entrar           boa não dependiam da justiça civil, mas
ao de mestre. Valdez dos Santos refere, em      nas minhas galés, quando mester fizer. E         sim do almirante ou do alcaide do mar,
“Hierarquia Naval”, que esta ilação é cor-      aqueles alcaides e arrais e petintais que aí     enquanto no Porto a sua jurisdição era uma
roborada por Santa Rosa de Viterbo, quan-       forem, assim eles como os seus filhos que        competência dos juízes ordinários da cida-
do afirma que «... o arrais não era o primei-   aí ficarem depois deles, devem vir perante       de. Ainda sobre os privilégios dos arrais,
ro oficial ou personagem das reais galés.».     o meu almirante... E outrossim mando e           Valdez dos Santos, na obra antes referida,
                                                tenho por bem que se os ditos alcaides e         afirma que no século XVII, por intermédio
   Os arrais gozavam de alguns privilégios      arrais e petintais fizerem alguma coisa, ou      de um alvará régio (1657), os «Homens do
e isenções fiscais e jurídicas, como se pode    deverem algumas dívidas, que o alcaide           Mar de Riba Tejo e Costa, mestres, arrais e
ler num extracto de uma Carta Régia, da-        nem os alvazires (oficiais de justiça) nem       marinheiros» foram dispensados do serviço
tada de 6 de Janeiro de 1298, e intitulada      os mordomos não os travem deles nem              nas fronteiras, tendo só que prestar serviço
«Confirmação do foro dos alcaides e arrais      os constranjam por nenhuma dívida que            na Marinha.
e petintais das galés», passado por D. Dinis.   devam...».
Neste documento, apresentado por Carbo-                                                                                     António Silva Ribeiro
nel Pico em “Terminologia Naval Portugue-          Relativamente aos arrais de Setúbal, o docu-
                                                mento estabelece que não eram obrigados a ter                                                   CALM
                                                cavalos «contra suas vontades», privilégio que

VIGIA DA HISTÓRIA                                                                                                         30

                                   AINDA A ESCRAVATURA
Em 28 de Março de 1684 D. Pedro fez
       publicar uma lei sobre a arqueação dos   ções por dia a cada escravo e água em quanti-    e multa aos oficiais da Coroa que permitis-
       navios negreiros porque , até aí , “ os  dade para lhes fornecer 1 canada por dia .       sem carregar mais escravos do que a lotação
                                                                                                 enquanto os mestres dos navios , que o fizes-
                                                   Estabelecia – se , para o cálculo da água e
carregadores e mestres das naus violentavam mantimentos , que a duração da viagem de sem , seriam degradados por toda a vida para
de tal forma os escravos embarcados , trazen- Angola para Pernambuco seria de 35 dias , a Índia e pagariam multa .
do – os tão apertados e unidos o que resultava para a Baía seria de 40 dias , e para o Rio de    O diploma em causa não logrou , pelo me-
na morte de muitos deles “ .                    Janeiro de 50 dias                               nos de início , ser cumprido como se extrai de
As normas estabelecidas na Lei em causa,        No cálculo dos mantimentos e da água uma carta do Bispo de S. Tiago datada de 13
que seguidamente se resumem , ajudam a deveria ser incluída a parte correspondente à de Julho de 1684 na qual escrevia :
perceber quão má deveria ser a situação até guarnição .                                          “ Em 24 de Junho chegou do Cacheu o
então Sempre que algum escravo adoecesse de- mestre João Gomes e nele esperava viessem
Estabelecia – se que todos os navios fos- veria ser colocado separadamente dos outros algumas peças ( escravos ) que lhe tinha man-
sem arqueados , nos portos , pelos oficiais e convenientemente tratado                           dado buscar …. E com efeito me vinham 5 ou
da Coroa . Os navios que saíssem de Angola      Em cada navio negreiro deveria seguir 6 peças escolhidas as quais morreram todas
deveriam ser arqueados , mesmo que já o ti- embarcado um padre para dizer missa aos no mar por ocasião de que a viagem foi de 19
vessem sido anteriormente , não podendo a dias santos e assistir aos moribundos (1)              dias , pouca água traziam e muita gente que
nova arqueação ser superior à anteriormente     Quanto estivessem a carregar escravos meteu com ambição dos fretes de que morre-
fixada .                                        era proibido que os navios contactassem com ram mais de 130 peças “ .
   Se o navio fosse de coberta e nelas hou- quaisquer outras embarcações e , ao largar ,
vesse portinholas seriam lotados em 7 ca- deveriam ser acompanhados até 2 a 4 léguas                                   Com. E. Gomes

beças por cada 2 toneladas , não havendo        de terra por uma lancha enviada pelo Gover-      Nota: Durante alguns anos estalou um conflito por-
portinholas seria lotado em 5 .                 nador .                                          quanto muitos padres alegando a escassez de paga-
                                                                                                 mento se recusavam a embarcar.
   Todos os navios seriam obrigados a levar        O diploma estabelecia quais as penas pa-
mantimentos suficientes para fornecer 3 refei- ras as infracções , degredo , perda do ofício Fonte: Monumenta Missionária Africana vol. VI – 2ª série

26 MARÇO 2011 • REVISTA DA ARMADA
   21   22   23   24   25   26   27   28   29   30   31