Page 14 - Revista da Armada
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geiros e da Política de Segurança Comum e as        reação negativa às hipóteses de mutualiza­        ramos que a UE não se esqueça que poderá
Cooperações Estruturadas Permanentes), mas          ção e especialização das forças europeias em      contabilizar ativos se mantiver a paz e a pros­
não se assegurou à genética os meios para a         ordem a contornar o ambiente orçamental e         peridade alcançadas pelos seus povos, na base
sua edificação. Neste último âmbito interessa       financeiro restritivo, basta pensar na atual po­  dos valores da liberdade, tolerância, diversida­
realçar que a sétima inovação do Tratado de         sição britânica.                                  de e solidariedade.
Lisboa correspondia ao alargamento do pa­
pel da Agência de Defesa Europeia, através da         É de prever que quanto mais a crise se pro­       Ao terminar este artigo, importa lembrar que
qual se pretendia desenvolver uma verdadeira        longar maior será o risco correspondente à        o futuro nos reserva outros desafios, porventura
política comum de armamento e coordenar o           ameaça de violência nos países mais pobres        ainda mais complexos do que o Euro, nome­
esforço de aquisição de material militar por        e, ao mesmo tempo, menores os meios para a        adamente os relacionados com as alterações
parte dos diferentes Estados-Membros, ten­          conter ou para reagir a desafios externos. A Su­  climáticas, com outras vertentes da globaliza­
tando evitar a duplicação de programas atual­       íça, que não faz parte da zona euro, está preo­   ção, com a dificuldade no acesso à energia,
mente existente.                                    cupada com os problemas que atravessam os         com o impacte da crise demográfica e com
                                                    países do sul da Europa e realizou em setembro    a insegurança fomentada por novas ameaças.
  O que chega ao conhecimento público in­           um exercício militar, o “Stabilo Due”, para se
dica que a operacionalização pouco avançou          aprontar para responder à atual instabilidade       É necessário colocar o pensamento político
e até se pode dizer que regrediu, basta citar o     na Europa e para testar a velocidade com que      no nosso tempo e uma das lições a tirar é que
exemplo do fim anunciado da EUROFOR. Do             o seu exército pode ser mobilizado (quer para     temos de regressar ao estudo da geopolítica
ponto de vista genético a crise está a afetar, ne­  missões próprias quer para apoio a outras au­     (ao estudo da dinâmica do poder no espaço
gativa e significativamente, os volumes de fi­      toridades competentes).                           geográfico). Porventura, se a geopolítica tivesse
nanciamento dedicados às atividades de I&D,                                                           sido considerada, os europeus tinham-se aper­
bem como os fundos que já estariam planea­            Também devemos pensar que, numa pers­           cebido da «desmaterialização do espaço e da
dos para os grandes programas conjuntos euro­       petiva estratégica, o fosso entre europeus        compactação do tempo».
peus, nomeadamente o “EurofighterTyphoon­ ”         e americanos se vai alargar, impedindo os
e o “A400M”.                                        europeus de participarem corretamente ao                                                             
                                                    lado dos norte-americanos na resolução das                               Armando J. Dias Correia
  Dizia-se que o Tratado de Lisboa levaria os       crises. Por certo, os europeus serão mantidos
maiores países da UE a assumirem uma lide­          sob pressão para que sigam as orientações e                                                                CFR
rança ativa da Europa para assim haver uma          escolhas americanas sem poder mesmo dis­                                                  Membro do CINAV
mais rápida resposta aos grandes desafios que       cuti-las, porque não têm meios consequentes
nos afetam a todos. Na prática, com a crise,        para as resolver.                                 Notas
pouco se tem avançado em termos de apro­                                                                 1 Liderada por Édouard Balladur, que ocupou o cargo de
fundamento da união e muito menos em ma­            CONSIDERAÇÕES FINAIS
téria de Política Comum de Segurança e Defe­                                                          primeiro-ministro da França entre 1993 e 1995.
sa (PCSD). Neste âmbito podemos justamente            O Professor Ernâni Lopes dizia que «Eco­           2 Para fins sociais, económicos e políticos, refere-se
pensar que a existência de um exército europeu      nomia é Poder» e, acrescentamos nós, não há
e uma diplomacia europeia, ou até, em termos        verdadeiro poder sem instrumentos de força        ao sul da Itália.
mais abrangentes, numa segurança e defesa           coerciva. Que poder terá agora a Europa com          3 Referência a estadistas como Konrad Adenauer, Wins­
europeias, estarão mais longe da sua concreti­      uma grande crise económica e sem capacida­
zação, nem a retórica lhes tem dado atenção.        des militares comuns?                             ton Churchill, Alcide de Gasperi ou Robert Schuman.
                                                                                                         4 O comércio marítimo passou a ter maior dimensão no
  Em contrapartida, individualmente, os pa­           O Euro foi uma idealização política e, por
íses continuam a dar atenção às questões de         isso, foi posto em prática com uma série de       Oceano Pacífico do que no Oceano Atlântico em 1985.
defesa, em especial às que dizem respeito aos       características que um projeto económico             5 Um «cisne negro», ou seja, um evento inesperado que
espaços marítimos, já que sabem que aí se           não aprovaria. Foram aceites países com eco­
colocam os grandes desafios de segurança do         nomias muito divergentes, com diferentes ní­      força as pessoas a reverem as ideias preconcebidas que
século XXI. Por exemplo, a França e a Itália es­    veis de emprego, inflação e produtividade, que    tinham acerca do mundo.
tão com grande dinamismo na construção das          não estavam preparados para a moeda única,
novas fragatas FREMM (FREgate Multi-Mission)        para o fim da possibilidade de desvalorizarem        6 Já dizia John Maynard Keynes que «O mercado pode
e também estão a conseguir exportá-las para         a sua moeda como forma de intervenção na          manter-se irracional mais tempo do que nós podemos
os vizinhos do sul, nomeadamente para Mar­          economia.                                         manter-nos solventes».
rocos (uma) e para a Argélia (seis). A Espanha
continua empenhada na construção de fra­              Se avaliarmos o Euro pelo seu passado até          7 Só os 1343 milhões de chineses têm uma população
gatas F-100 (que também vai exportar para a         poderemos dizer que foi um sucesso. Se tomar­     ativa de 795,5 milhões de pessoas.
Noruega) e na construção dos quatro novos           mos em conta apenas o presente, pensando na
submarinos S-80. O Reino Unido está ocupa­          enorme dívida pública e na falta de uma pers­        8 Ainda que possa parecer uma expressão forte ou de
do com a produção dos novos submarinos da           petiva de solução realista, teremos de conside­   retórica, atente-se no que, em setembro de 2003, disse ao
classe «Astute».                                    rar que foi uma má opção, já que não é justo      Expresso, o Prof. Ernâni Lopes: « ...como obra humana,
                                                    fazer obra e passar as contas para as gerações    a União um dia poderá acabar. É poderosa e frágil, mas
  Os países que mais sofrem com a crise, à          seguintes. No futuro, o Euro terá mesmo de ser    não tem a inércia histórica do Estado-Nação. Necessita de
medida que forem acumulando os custos reais         um sucesso para quem embarcou no projeto,         injeção permanente de energia, fundamentada na vonta-
desta luta anti-crise, mais tenderão a diminuir     pois a alternativa é a desintegração da UE e      de política, na lucidez estratégica e no sentido de serviço
orçamentos, nomeadamente o da defesa. Estes         um regresso ao passado, com riscos políticos      do bem comum».
cortes sentir-se-ão, com maior incidência, nos      ainda não calculados, de impacte imprevisível.
grandes programas, exigindo, caso venham a                                                               9 Segundo o general Loureiro dos Santos «É possível
ser retomados, vários anos para que seja es­          O problema atual da UE tem a ver com a          que os países endividados não tenham outra opção senão
truturada uma nova cooperação comum ao              globalização, mais especificamente com a          acatar a vontade germânica, pois a alternativa poderá ser
nível da Europa. Por outro lado, por mais de­       falta de medidas de reação à liberalização do     de tal modo terrível que justifica todas as cedências. Mas,
clarações que possam vir a ter lugar por par­       comércio internacional que levou à desloca­       como países independentes à custa de muitos esforços,
te dos responsáveis políticos, voluntaristas e      lização das indústrias para a China. Assim, a     não deixarão de reagir à indesejada submissão quando
contraditórios, a crise poderá vir a provocar       única solução que se vislumbra viável para a      estiverem em condições de o fazer».
efeitos em sentido contrário, como seja o do        Europa é uma federação faseada, ao mesmo
exacerbamento dos interesses nacionais e a          tempo que se encontra um ponto de equilíbrio         10 «Não há nenhum exemplo na História de uma moe-
14 DEZEMBRO 2012 • Revista da Armada                na balança comercial com a China e com os         da a que não corresponda um só governo», refere o eco­
                                                    países em desenvolvimento acelerado. Espe­        nomista Rui Henrique Alves. Será uma grande incógnita o
                                                                                                      resultado e as consequências da eventual consulta aos bri­
                                                                                                      tânicos sobre o futuro do Reino Unido na União Europeia.
                                                                                                      Só a ideia de algum país desrespeitar um Tratado causará
                                                                                                      danos nas relações com os Estados-Membros.

                                                                                                         11 É curioso notar que o eixo de interesse político ten­
                                                                                                      dencialmente leste-oeste está hoje muito orientado para
                                                                                                      os diferendos norte-sul.

                                                                                                         12 OTratado de Lisboa introduz, para matérias de segu­
                                                                                                      rança e defesa, um mecanismo inovador e revolucionário
                                                                                                      em que não é requerida unanimidade no Conselho.Trata­
                                                                                                      -se da criação de «Cooperações Estruturadas Permanen-
                                                                                                      tes», que é específica da Política Comum de Segurança e
                                                                                                      Defesa e que prevê a possibilidade de existência de uma
                                                                                                      cooperação mais estreita entre os Estados-Membros que
                                                                                                      o desejem e tenham capacidade para realizar maiores es­
                                                                                                      forços em matéria de capacidades militares.

                                                                                                         13 Desde que antecipadamente estudem bem o pro­
                                                                                                      cesso federativo norte-americano e alemão.
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