Page 14 - Revista da Armada
P. 14

DISPOSITIVOS DE SEGURANÇA MARÍTIMA

                       SERVIR PORTUGAL NO MAR

         Ensina a História que prosperidade e navios no mar foram sempre sinónimos na língua
                   portuguesa; que época em que estamos alheados do mar é época de decadência1.
Portugal dispõe, nas suas diversas vertentes, de um mar imenso, que se
      desenvolve em torno de três núcleos – Continente, Açores e Madeira  de caráter administrativo, eliminando burocracias desnecessárias e demais
      – caraterizado por 14 051 km2 de águas interiores, 50 960 km2 de    entraves, condições sem as quais não se afigura viável captar os imprescin-
                                                                          díveis investimentos, tanto nacionais como estrangeiros.
mar territorial e 1 660 456 km2 de Zona Económica Exclusiva (ZEE), enquan- Os desideratos expostos passam, conforme refere a Estratégia Nacional
to a área terrestre não ultrapassa os 92 764 km2. Por seu turno, a totalidade para o Mar 2013-2020, recentemente colocada em discussão pública, pelo
do comprimento da linha de costa portuguesa, incluindo a dos arquipélagos recriar de uma forte identidade marítima nacional, consentânea com a glo-
atlânticos, ascende a 2447 quilómetros2. Em reforço da reconhecida iden- balização em curso mas sem renegar os venerandos valores tradicionais, que
tidade marítima nacional, importa ainda sublinhar que Lisboa é, em todo o devem ser preservados, de forma a constituírem a referência que norteia o
espaço europeu, a única capital atlântica, fator que terá pesado na decisão processo de redireccionamento da nossa economia. Nesse sentido, urge dar
da União Euro-                                                                                                                                                                                                                                           corpo a uma
E ao imenso oceano ensinam estas quinas, que aqui vês, o mar sem fim é português 8peia de aí sediar                                                                                                                                                      nova dinâmi-
                                                                                                                                                                                                                                      CFR Bessa Pachecoa Agência Eu-ca capaz de
ropeia de Segu-                                                                                                                                                                                                                                          criar riqueza
rança Marítima                                                                                                                                                                                                                                           e gerar empre-
(EMSA).                                                                                                                                                                                                                                                  go, cumprin-
Os números                                                                                                                                                                                                                                               do, dessa for-
acima referidos                                                                                                                                                                                                                                          ma, o desígnio
colocam Por-                                                                                                                                                                                                                                             de tornar a so-
tugal no vigési-                                                                                                                                                                                                                                         ciedade por-
mo (20.º) lugar                                                                                                                                                                                                                                          tuguesa mais
mundial no que                                                                                                                                                                                                                                           próspera, justa
respeita à exten- A ZEE nacional e o mar territorial português comparados com os países da Europa que ocupam a mesma área.                                                                                                                               e consciente
são do mar sobre o qual dispõe de soberania e jurisdição, ao passo que em da sua relevância e, ao mesmo tempo, despojada de sentimentos de resig-
termos de área terrestre o país não vai além de uma despretensiosa centési- nação e ressentimento. No fundo, a razão pela qual não podemos abdicar
ma décima posição (110.ª). Esta situação, a vários títulos extraordinária, ten- do nosso código genético intrínseco, que nos identifica como sociedade e
derá, dentro em breve, a tornar-se ainda mais paradigmática, na medida em como povo, prende-se com o facto de, sem ele, o país, as instituições e os
que se aguarda desfecho favorável à reclamação apresentada por Portugal cidadãos perderem, literalmente, o rumo.
junto da Comissão dos Limites da Plataforma Continental das Nações Uni- Em sintonia com as legítimas aspirações no que respeita ao lugar que o
das. Com a previsível extensão da plataforma continental, a soberania e ju- mar deve ocupar na economia e na sociedade portuguesas, o Relatório para
risdição portuguesas aplicar-se-ão, doravante, a uns formidáveis 3,8 milhões o crescimento sustentável – uma visão pós-troika, apresentado no final de
de quilómetros quadrados – cerca de 40 vezes a área terrestre – passando 2012 pela Plataforma para o Crescimento Sustentável, veio propor cinco
a existir continuidade de solo e subsolo soberanos entre o continente e as orientações de caráter vincadamente estratégico para que este possa, em
regiões autónomas da Madeira e dos Açores, que se estenderão, inclusiva- definitivo, ser assumido como vetor indispensável ao desenvolvimento do
mente, muito para além daqueles arquipélagos, numa superfície próxima nosso país:
daquela que é ocupada por todos os países da Europa3.                     - reorganizar, reestruturar e regular a economia do mar;
Pelo facto de ter subscrito as convenções Safety of Life at Sea (SOLAS-1974) - criar uma marca distintiva ancorada na aproximação dos portugueses
e Search and Rescue (SAR-1979), Portugal assumiu igualmente obrigações e ao mar;
responsabilidades no âmbito da busca e salvamento e salvaguarda da vida - reforçar o conhecimento, a ciência e a tecnologia e as competências na
humana no mar, num espaço que abarca mais de 5,7 milhões de quilóme- área do mar;
tros quadrados. Esta Search and Rescue Region (SRR), vastíssima, que confi- - estabelecer um novo modelo de financiamento e de governação do mar; e
na com áreas de responsabilidade análogas de países como Espanha, Mar- - proteger os oceanos das consequências das alterações climáticas.
rocos, Senegal, França, Estados Unidos, Canadá e Reino Unido, é a segunda Em virtude do processo de globalização em curso, as oportunidades e de-
maior no Atlântico Norte, logo a seguir à dos Estados Unidos, e está entre safios proporcionados pelo mar comportam também perigos e ameaças de
as 15 maiores do mundo. A sua superfície excede em 62 vezes o território ordem diversa – tanto no âmbito da security como no da safety 4 – sendo
nacional, correspondendo, na prática, à área conjunta de toda a Europa, que alguns deles não se encontram ainda perfeitamente identificados. Por
incluindo as grandes ilhas.                                               conseguinte, se o aproveitamento pacífico do mar exige confiança, no atual
Muito embora não tenha, no presente, a correspondente expressão no estágio de evolução das sociedades esta só pode ser conferida pela presença
Produto Interno Bruto (PIB) nacional, o mar encerra, todavia, um enorme contínua de meios e efetivos que exerçam a permanente ação do Estado,
potencial, cuja dinâmica se antevê crescente, perspetivando-se que possa por forma a afiançar um limiar de segurança moldado aos perigos e amea-
contribuir, de forma decisiva, para a expansão e despontar de múltiplas ati- ças que, mais a mais, afetam o mundo globalizado em que vivemos.
vidades em benefício da economia portuguesa, presentemente anémica e De outro modo, se esses perigos e ameaças não forem devidamente acau-
em busca de um novo paradigma, mais tangível e sustentável. No entanto, telados, comportarão, mais cedo ou mais tarde, efeitos com consequências
para que a economia do mar se possa desenvolver na justa medida das le- socioeconómicas perniciosas, que podem, no limite, colocar em causa o
gítimas aspirações e pergaminhos da tradição marítima portuguesa, torna-se Estado de direito e as instituições nele alicerçados e, consequentemente, a
fundamental dotar os setores por ela abrangidos de quadros normativos ade- própria democracia, situação que as últimas décadas vieram demonstrar
quados e, sobretudo, isentos de ambiguidades, que contribuam para uma não ser fenómeno exclusivo de certas regiões e latitudes. Neste sentido,
clarificação das competências dos diferentes agentes que nele atuam, com cumpre recordar que à criminalidade transnacional e aos tráficos de armas,
a finalidade de promover a segurança. Por seu turno, o (re)ordenamento do de narcóticos e de seres humanos, vieram, entretanto, somar-se outras amea-
espaço marítimo nacional deve caracterizar-se, antes de mais, por uma evo- ças, tão impercetíveis quanto nefastas, como a imigração ilegal, a pirata-
lução significativa em prol de maior flexibilidade e simplificação dos aspetos ria marítima, o terrorismo, a proliferação de armas de destruição maciça,

14 SETEMBRO-OUTUBRO 2013 • REVISTA DA ARMADA
   9   10   11   12   13   14   15   16   17   18   19