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REVISTA DA ARMADA | 496

objetivo era o de influenciar (com uma abordagem bottom up) o                      Foto 1SAR A Ferreira Dias
futuro Conceito Estratégico da NATO, cuja atualização há muito era
debatida, pois tinha sido escrito em 1999.                                                                    Boarding conduzido pela fragata “Álvares Cabral” no âmbito da Operação ACTIVE ENDEAVOUR

  Logo no mês seguinte, na cimeira de Estrasburgo/Kehl, os líderes                                              • Gestão de crises, que, para as forças navais, compreende ati-
dos países aliados avançaram formalmente para a elaboração de um                                              vidades como operações anfíbias ou apoio de fogos em suporte
novo Conceito Estratégico. Dessa forma, os trabalhos de preparação                                            a operações em terra, Maritime Interdiction Operations (MIO),
desses dois documentos estruturantes decorreram em simultâneo.                                                Non-Combatant Evacuation Operations (NEO), assistência huma-
À medida que os processos se foram desenvolvendo, foi decidido                                                nitária e resposta a catástrofes;
que a EMN só deveria ser aprovada após a publicação do Conceito
Estratégico (correspondendo a uma abordagem top down), acaban-                                                  • Segurança cooperativa, que engloba, no domínio marítimo,
do por retardar a sua aprovação, que estava prevista para o início de                                         atividades de diplomacia naval (e.g. visitas portuárias) e de apoio
2010 e veio a ocorrer apenas um ano depois.                                                                   à edificação de capacidades em países parceiros (através de exer-
                                                                                                              cícios e treino combinados);
  Como é sabido, em dezembro de 2010, na cimeira realizada
em Lisboa, a NATO aprovou o seu novo Conceito Estratégico, in-                                                  • Segurança marítima, que abarca o empenhamento, de acor-
titulado Active Engagement, Modern Defence. Um dos aspetos                                                    do com o direito internacional, em atividades de vigilância, pa-
essenciais desse documento é a identificação das três tarefas es-                                             trulhamento e interdição dos espaços marítimos em apoio a tare-
senciais da Aliança Atlântica:                                                                                fas de imposição da lei, visando nomeadamente combater a pro-
                                                                                                              liferação de armamento e assegurar a liberdade de navegação.
  • Defesa colectiva, que é a tarefa fundamental da NATO, decor-
rendo directamente do Tratado de Washington e, concretamen-                                                     É nítido o alinhamento com o enquadramento estabelecido no
te, do seu artigo 5º;                                                                                         Conceito Estratégico, mas também ressalta a inclusão de uma
                                                                                                              função-extra, que não constava do documento de topo: a segu-
  • Gestão de crises, que traduz a vontade de intervenção da                                                  rança marítima.
NATO para “ajudar a gerir crises emergentes que tenham poten-
cial para afectar a segurança da Aliança”;                                                                      Com efeito, a EMN enfatiza que a segurança coletiva é inal-
                                                                                                              cançável sem a segurança dos mares, apontando a necessida-
  • Segurança cooperativa, que reflete a intenção da organização                                              de da Aliança, sustentada na sua larga experiência em opera-
em se “envolver ativamente para incrementar a segurança inter-                                                ções navais, se empenhar para combater as ameaças em am-
nacional, através de parcerias com países relevantes e outras or-                                             biente marítimo e mitigar os riscos que põem em perigo o sis-
ganizações internacionais”.                                                                                   tema de tráfego oceânico mundial, que se baseia na liberdade
                                                                                                              de navegação e na exploração pacífica dos espaços marítimos.
  Curiosamente, coincidindo com uma altura em que a crescente                                                 Isso justificou a inclusão, pela primeira vez, da segurança ma-
importância dos desafios marítimos levara a NATO a atualizar tam-                                             rítima no rol de funções do poder marítimo aliado. Todavia,
bém a sua estratégia marítima, o novo Conceito Estratégico não                                                a segurança marítima não é propriamente uma função nova,
menciona nunca as palavras “ocean”, “sea”, “maritime” ou “navy”…                                              pois consiste em algo que as marinhas de todo o mundo vêm
                                                                                                              desempenhando desde sempre.
  Não obstante, pouco depois da divulgação desse novo Conceito
Estratégico, a NATO concluiu finalmente a sua nova EMN (aprova-                                                 Estranhamente, esta EMN – a primeira em quase três décadas
da em janeiro de 2011 e divulgada ao público em março de 2011),                                               – acabou por ter uma divulgação bastante tímida. O investigador
com a designação original de Alliance Maritime Strategy. Cabe                                                 do Colégio de Defesa NATO Brooke Smith-Windsor aponta três
aqui referir que, sendo o Conceito Estratégico um exemplo daquilo                                             possíveis razões para esse défice de publicitação: (1) não ofuscar
que se designa como uma estratégia geral, teria feito todo o senti-                                           a divulgação do novo Conceito Estratégico; (2) evitar dar a ideia
do que se seguissem estratégias particulares para as várias compo-                                            de um estatuto privilegiado para as forças marítimas (dada a ine-
nentes militares aliadas, ou seja, para as forças terrestres, navais e                                        xistência de estratégias particulares para as forças terrestres e
aéreas. No entanto, isso não aconteceu e apenas a vertente marí-                                              aéreas da NATO); e (3) não desviar da prioridade aliada, que, na
tima teve uma estratégia particular própria.                                                                  altura, era quase exclusivamente o Afeganistão.

  A nova EMN começa por caraterizar o ambiente de segurança                                                     Talvez essas razões tenham estado também na origem da de-
marítima, com alguns dados que – embora conhecidos – mere-                                                    mora em operacionalizar a nova EMN, uma vez que só em finais
cem ser destacados: 70% da Terra está coberta por água, 90% do                                                de 2013 se começou a abordar de forma determinada essa pas-
comércio mundial circula por via marítima e 75% desse comér-                                                  sagem das palavras aos atos. Contudo, essa é matéria que deixa-
cio passa por um número reduzido de canais ou estreitos (como                                                 mos para a próxima edição da Revista da Armada.
o Canal do Suez, o Canal do Panamá, o Estreito de Malaca ou o
Estreito de Gibraltar, entre outros).

  A partir dessa caraterização, o texto desenvolve o contributo
das operações e atividades marítimas aliadas para a segurança
da NATO, dividindo-o em quatro funções:

  • Defesa coletiva, que inclui o contributo naval para a dissuasão
nuclear, o controlo do mar e as operações expedicionárias e anfí-
bias, entre outras atividades de âmbito vincadamente combatente;

Embarcação suspeita de pirataria abordada por fuzileiros portugueses no âmbito da                             Sardinha Monteiro
operação OCEAN SHIELD                                                                                                            CFR

                                                                                                                        Silva Pinto
                                                                                                                      CFR EN−AEL

                                                                                                              MAIO 2015                5
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