Page 374 - Revista da Armada
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«Natureza Morta Metafísica.
delícias ... » O quadro está impregnado
de uma atmosfera melancólica que
reflecte a nostalgia do acaso, encon-
tros que só o sonho poderá prever, fora
de qualquer precisão realista.
Chirico vai-se aproximando de uma
pintura cada vez mais chegada ao
surrealismo, sem, no entanto, envere-
dar por. ele. A realidade, embora es-
pectro de si própria, permanece na
sua pintura. Porém, agora, acrescen -
ta-lhe um dinamismo novo e surgem
~
temas movimentados como os dos
cavalos que galopam em cenários
estranhos, vindos não se sabe donde
e com destino mais incerto ainda.
O seu universo friamente geometri-
zado, povoa-se mais tarde de silhue-
tas humanas de formas emprestadas
a manequins ou robots (geométricos
também) que, despersonalizadas, se
tornam como imagens-sombra inter:-
rogadoras e perturbantes, autênticos
catalisadores de impressões sobrena-
turais como em «O Vaticinadof», de
1915 .
Os quadros de Chirico criam sempre
uma impressão de desconforto pela
transfiguração da realidade. Não é o
caso, por exemplo, de Giorgio Morand
(1890-1964), que prefere tratar assun-
tos em que os objectos familiares, pela
maneira carinhosa como são tratados,
adquirem a dignidade de «pequenos
deuses lares» protectores. A sua arte
exprime-se com inefável serenidade,
espécie de religiosidade que empresta
às coisas um toque de sobrenaturali-
dade. Veja-se, por exemplo, o seu
quadro «Natureza Morta Metafísica».
Cario Carrá (n. 1881), na sua fase me-
tafisica, também não desdenha a rea-
lidade e procura através da «imagem
da forma» a «verdadeira essência das
coisas». A associação im prevista de
certos objectos acentua o carácter an-
gustioso de certas telas como em «Ca-
valheiro Embriagado». Poucas vezes
a perda de consciência e a obnubila-
ção da embriaguez terão sido sugeri-
das com tanta impressividade como
neste quadro de Carrá.
Q. Lemos
Cap··frag.
«Cavalhe iro Embriagado »
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