Page 21 - Revista da Armada
P. 21
cem a sua obra, sem lisonja, considero esse ilustre membro não visitaram a exposição, vou dar uma visão do que foi o
da nossa Academia excepção àquela regra, por o reconhe- seu encadeamento de imagens, pelas quais o expositor se
cer como um desses historiadores. ,evelou tão tocado pelo sortilégio japonês como eu.
Quan to à .. Sagres"_ destaco a s ingularidade do ~Diário No catálogo da mostra, o director-adjunto do IIDiário de
de Noticias', ter acompanhado com especial interesse a sua Noticias" (» dizia:
última viagem de circum-navegação e enviado ao Japão os Eduardo Tomé esteve embarcado, de Ósaca a Nagasá-
jornalistas Rosa Dias e fotógrafo Eduardo Tomé - este o qui, passando por Tanegashima, no nosso veleiro·embaixa-
elq)Ositor daquela mostra - cujo entusiasmo ficou patente da, cuja importáncia nem sempre tem sido reconhecida. Ele
nos artigos e suplementos do jornal, que constituem precio- fezoseupróprioitinerário "pordentrOIl do Japão.
sa lembrança da actualidade japonesa que eu n Ao voltei A visita á exposição é obrigatória para quem queira ac-
a ver. tualizaras seus registos visuais sobre um pais que tecnolo-
, Na secção "Reportagem. do numero de Outubro de 84, gicamente ttjá mudou . desécu1o, sem perdera alma.
esta Revista fez alusão a essa exposição. Congratulo-me No que particularmente respeita à "Sagres ~, expu-
por ter estado presente no acto da inauguração e voltei lá nham-se três dezenas de fotografias, das quais destaco os
depois, para saborear demoradamente as imagens expos- seguintes aspectos:
tas, talvez por ser do tempo em que se namorava em reca- Visto pelo través, o veleiro-embaixada navegando, do-
to, longe das vistas. nairoso, a todo o pano, com a beleza imposta pelas suas cru-
Das palavras então proferidas pelo almirante CEMA, zes de Cristo, mastreação e massame: aspecto nocturno,
permito-me destacar a seguinte passagem: definido pela iluminação de gala: vista de popa, a todo o
Se, para reforço da aproximaçâo do Japão com PortugaJ pano, adornado para EB, aproveita o ló chegado ao vento
for necessária ajuda, digo-lhe Senhor Embaixador, que para entrar no porto de Ósaca, maravilhand0200 mil expec-
podecontarcom a Marinha. tadores que assistiram ao cortejo naval, além dos milhões
O embaixador do Japão, dr. Fumya Okada, por seu lado, que o seguiram pela te/evisão- diz a reportagem do «DN»;
afirmaria que essa exposição era a maior do género que atá instantâneos da vida a bordo - da botica à cozinha e ao
hoje se efectuou no pais. gurupés; cerimónias em que participou a guarnição: em
Ouanto ao expositor, disse ser a forma de sensibilizar as Ósaca - o comandante recebendo a bordo crianças das es-
pessoas de que a grande potlmcia económica e industn'aJ colas japonesas, autores das melhores composições escri-
que é o Japão, está receptiva a tudo o que é portuguf}s, pelo tas sobre a história comum do Japão e Portugal; aspectos
profundo conhecimento e respeito que tfJm pela história de casamentos shintoistas japoneses, celebrados a bordo:
comum dos dois paises. Imagem insólita de milhares de visitantes subirido a pran-
Tenho aqui apontado nomes de heróis, santos, sábios e cha, passada do navio ao cais: marujos da . Sagres- assi-
mártires - André Pessoa, Francisco Xavier, Fernão Men- nando autógrafos, a bordo e na rua; a multidão com carta-
des Pinto, Luls de Almeida, João Rodrigues, Diogo de Car- zes representando o navio: um sorridente e bigodudo mari-
valho, etc. - que são .Figuras de Silêncio_ (2), representa- nheiro com uma admiradora do seu exotismo namban -
das num monumento do nosso pavilhão da Exposição inter- que foi fotografia de capa dum suplemento a cores do
nacional de Ósaca (1970), que foi oferecido à cidade de Na- ~DN»; aspectos duma mostra fotográfica do mundo que os
gasáqui. portugueses criaram, exposta no andar nobre do castelo de
Sentimentalmente, em ambas as histórias, houve tam- Ósaca: o adeus das raparigas, no cais, podendo ler·se um
bém portugueses atraidos pelo encanto das mulheres japo- cartaz que dizia: Good luck everybody! To Mr António Ro-
nesas - da lendária Wakasa, que o pai trocou pelos segre- sado and José Castilho.,. Em Kobe - colocação duma placa
dos da execução dos fechos de serpentina da arcaica arma no monumento evocativo de Moraes, dizendo: Homena-
fttepp6», até à frágil Ó-Yoné que enfeitiçou Wenceslau de gem da Marinha (Outono de 1983). Wenceslau de Moraes
Moraes e Ko-Haru cujas cinzas estão juntas com as dele, no da Armada Portuguesa, viveu e morreu no Japão, que a sua
sepulcro dum templo budista de Tokushima. alma cantou para a eternidade (ficou, assim, a haver uma
A mostra fotográfica do Museu de Marinha exibia cerca inscrição nesse monumento na lingua em que o incompará-
de 150 a mpliações a cores - imagens inéditas, belas e exó- vel escritor redigiu os seus livros que, até ai, só estava refe-
ticas- além de vitrinas com peças do Museu e cedidas pela renciado em japonês e inglês): bandeira nacional, que per-
Embaixada do Japão, destacando-se arranjos florais e a tenceu ao escritor e foi oferecida ao museu da cidade pelo
gentil colaboração da respectiva embaixatriz. Os japoneses seu afilhado e actual vice-cônsul de Portugal em Kobe. Em
e portugueses expuseram, com agrado, a medalha da Or- Nagasáqui - cerimónia em honra do navio, com os oficiais
dem Imperial Meiii (tesouro sagrado do Japão) concedida em formatura ; tambores nativos no cais, à despedida.
em 1930 ao capitão-de-mar-e-guerra João Carlos da Silva Marcando a chegada dos portugueses à ilhota de Tane-
Nogueira, durante uma viagem ao Japão no cruzador . Ada- ga (Tanegashima), no século XVI, uma dezena e meia de fo-
mastor., como homenagem à sua decisão de exigir a saida tografias mostrou-nos os monumentos, o museu, as suas
da esquadra russa da baia dos Tigres, em Angola, em 1904. gentes e festivais, que ainda os recorda, constituindo as
quando comandava a canhoneira «Limpopo_ - é que o Ja- suas mais fundas e duradoiras tradições - embora exista
pão nunca esquece quem o respeita e beneficia. Além desta hoje nessa ilha o ultramoderno centro espacial do Japão
condecoração, tão apreciada, expunham-se outras peças (NASDA). Deste conjunto destaco: cabo Kadokura (local do
do Museu, como a réplica do astrolãbio da RMadre de desembarque dos primeiros namban, assinalado por uma
Deus,,: o elmo ornamental dum guerreiro japonês (Cabuto), inscrição japonesa: monumento evocativo dos primeiros
oferecido em Nagasaqui à «Sagres", em 1978, após 340 bacamartes - com a forma duma bala, no parque público
anos de ausf}ncia: duas espingardas depp6~, oferecidas Wakasa; monumento dos navegadores portugueses, pro-
por um embaixador de Portugal em Tóquio; duas armadu- vindo da Exposição Internacional de Ósaca (1970) e ofereci-
ras de guerreiros; um biombo «nambanll: um IIsorobann do a Tanegashima: aspecto exterior do museu de Nishino-
(ãbaco) ao lado duma máquina «keisakj,1 electrónica de cal- -Omote, lembrando as formas duma nau: sala de projecções
cular .. da reconstituição cinematográfica da chegada dos portu-
Dai parecer-me necessário e justo que esse aconteci- gueses; reliquia, na forma de crucifixo, que esteve oculta
mento fique arquivado nas páginas desta Re\<;sta. Aos que enquanto o pais se fechou ao contacto com e do exterior
(') LivrodeMartinsJaneira (Lisboa, 1981). (') Dinis de Abreu.
19