Page 334 - Revista da Armada
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Antologia do Mar




                                   e dos Marinheiros





             HOMERO






                                   Pelo ap.-frag.  Crist6vlÍo Monira


               Elar de Homero. é falar das duas obras grandiosas que a
             His!ória lhe auibu;:  a . lIfada .. e a .Odisseia,.,  Porque da vida
             do maior pocla épico da Grécia, daquele que foi o pai da Poesia
             c  mescre  primeiro da literatura de Ioda a  humanidade. quase
             nada se sabe. Terá vivido, segundo Heródolo, por volta dos 850
             anos antes de Cristo; já a moderna histÓria o situa entre 900 e
             llOOda mesma era. Existiu, pois. há cerca de 3OOOao05. A gran-
             deza de Homero logo ai se mostra: a sua obra resistiu à erosão
             de Ifês milénios. Depois de terem ccnstilufdo a base duma cuhu-
             Ta  Ião rica como era a grega, as duas epopeias do poela chega-
             ram aos nossos dias com a força do génio. mantendo inlacta essa
             grandeza que  se  comunica  ao próprio idioma dos  homens -
             usa-se  a  palavra  .. homérico ..  para  significar  tudo  aquilo  que
             tenha invulgar dimensão,
                Não existe aqui lugar para entrarmos na complexidade das
             conjecturas e análises polémicas dos investigadores e dos críti-
             cos, que ao longo dos séculos se têm debruçado sobre a existên-
             cia de Homero e a génese dos monumentos literários que o poe-
             ta grego legou à posteridade. Produto de um homem ou de uma
             civilização, a  presença de Homero nesta antologia dispensa as
             explicações, e aparece duplamente justificada: porque além de
             ser tido, indiscutivelmente, como um dos mais altos expoentes   Homuo. E.scultura- Museu do Loul're, Pam,
             do património cultural da Humanidade, ele figura  na  HistÓria
             como autor do imenso poema do ma~que é a .. Odisseia .. ,   de Homero, do seu sentido ético da justiça e da paz, do valor
               Surgida na sequência da «Ilíada», que Homero construiu  à   da vida para altm do carácter irremediável da morte, e de uma
             volta do lendário cerco de Tróia, a .. Odisseia .. é a narrativa das   escrita, como disse Mateus Arnold, .. rápida e directa na síntese
             aventuras de Ulisses, que depois desse cerco de dez anos vagueia   e nas palavras, e todavia eminentemente nobre - um mestre no
             por mares deseonhecidos dura~lIe outros dez anos, em demanda   grande estilo da simplicidade ...
             da  pátria,  a  ilha  rochosa  de  Ttaca; enquanto sua  fiel esposa.   E, tal como O nome do seu autor, também a .. Odisseia .. , pela
             Penélope,  resiste  ao  assédio  dos  pretendentes,  e  seu  filho   força da sua narrativa, se tornou uma palavra que, três mil anos
             Telémaco abala à procura do pai,                    depois, os homens usam para significar o difícil e extraordinário
                No encanto duma linguagem simples e pura, envolvendo fá·   de uma aventura: ai nda que, quando falam de .. esforçoshoméri·
             bulas c mitos, mágicas c deuses, a «Odisscla,. é considerada um   cos .. , ou lêem num jornal o relato da «odisseia dos sobreviventes
             livro unico, como outro jamais se viria a escrever, Composto de   de  um  naufrágio .. ,  poucos conhecem o  autor e  a  obra donde
             24 contos (ou rapsódias). t um documento vivo da objectividade   essas palavras nasceram. e também para sempre ficaram,




             Da «ODISSEIA»

             (Séculos IX e XI antes de Cristo)

                         CANTO XfI
                                               qUt nasce de manhã cedo, ellviei os meus  gum ignoral'a o 1I0SS0 regresso do Hades,
                Quando a nal'e deixou o curso do rio   companheiros à mamão de Circe, a fim de  e não demorou a acorrer.  bem ata'viada;
             Oceano e atingiu as olldas do mar de lar-  rrazerem  o  corpo sem  vida  de  E/penor.   ('''/11 eI" .'in/w/II IIÜIS quI' If(l::i",,, pán. ('Ilr·
             gos camillhos, depois a ilha de Eeia, onde   Tendo COr/ado achas, queim6mo·lo 110 si·  nes abundantes e vinho tinlo de reflexos de
             resil/e com seus coros a Aurora, qUt nasce   tio  mais alto  do  cabo,  pungidos e derra·  fogo. Colocando·u 110 meio de nós, a i/llS'
             de manhá cedo, onde se ergut Hélio, enca-  mando pesadas /6grimas.  Quando o cadd·  tre deusa disse·nos: .. Infelizes,  que entras·
             lhámos  logo  à  chtgada  a  nau  sobrt  as   I'er foi consllmido com as armas do morto,  tes vivos na morada de Hades, e que mor-
             areias r mlnlmos para Itrra por ell/re a ar-  erigimos·lhe  um  túmulo,  erguemos·lhe  rereis duas vezes, quando todos os outros
             rrbrwaçao do mar.  Em seguida adorme·   uma esteIo e no alIO da sepulwra crav6mos  homens "ão se finam senão uma,  I'amos,
             cemosrsperando pela brilhallle Aurora,   um remo lnm manejável. Cumpríamos as·  comei esras  prol'isrns,  belni vinho,  aqui
                Mal surgiu a Aurom de róseos dedos,   sim IOdos os rilOS:  mas Circe de modo 01-  mesmo.  duranre  todo  o  dia,  Logo  que

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