Page 238 - Revista da Armada
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da cidade do Porto, estavam os Montes de Santa Catari-  Porta (ou Portas) estava no sítio do actual Largo das Duas
            na. Em resumo,:1 santa protegia o acesso marítimo à cida-  Igrejas, ficando extramuros os lugares onde depois foram
            de do Porto em três sítios: ii enlrada da barra (S. João da   implantadas as igrejas do Loreto e da Encarnação('). No
            Foz), no meio (Lordelo) e no fim (Porto). Nos arredores   Alto de Santa Catarina,  também chamado Monte Sinai,
            foram ainda edificados, pelo menos, oulras duas ermidas   Pico de Belver e Boa Viagem por dominar uma grande ex-
            da  mesma invocação, uma em  Afurada (Gaia), margem   tensão do Tejo, da margem sul  e do mar, o rei  D.  João
            esquerda do Douro junto à foz, e oulra na foz do rio Leça   III e a rainha  D. Catarina fundaram em  1557 uma igreja
            perto do Castelo de N.- S.a das Neves, actual sede da Ca-  que  foi  sede-freguesia  de  Santa  Catarina,  instituída em
            pitania do Porto de Leixões.                        1599.  A igreja tinha no adro uma ... Cruz de Pau» que deu
               Também tutelava O acesso ao porto de Lisboa em três   nome à Rua da Cruz de Pau, depois Rua Marechal S:tlda-
            locais: à entrada da barra (S. Julião), no meio (Santa Ca-  nha, e que, segundo a tradição, servia  para orientar os
            tarina  de  Ribamar) e  no  fim  (Alto de Sama Catarina).   marítimos até à barra(8). O Alto é assim mencionado nas
            Numa descrição de  Lisboa de 1554 (.Olisiponis Descrip-  ..Memórias Paroquiais de  1758 .. :  No mais Alto cume do
            tio»). diz  Damião de Góis:  (. .. ) A  pequena distância  (de   Mome Sil/ai desta cidade ( ... ) está situada a paroquial igre·
            Cascais), pelo rio acima, há uma baía em forma decotove-  ja  da  Virgem,  Mártir e  Domora Sal/ta  Catarina,  de  wjo   •
            lo em cujo vértice edificaram a Cllpela de S.  Julião, e,  mais   mal/te se descobre a principal parte do Tejo Olé à barra de
            ao alto, outra dediCllda a Sanla Catarilla ( .. .). Desta ermi-  Lisboa e lima grlmde porção do mar Oceal/o, avistaI/do-se
            da  junto  a S.  Julião da  Barra  não conhecemos  notícias   jU1llamente  as  nobres  vi/as  de  Aldeia Galega  (M01llijo),
            posteriores.                                        Palmela, Barreiro e Almada, com os lugares do Seixal, Ar-
               Uma carta hidrográfica holandesa da segunda metade   remela,  Cacilhas,  Porto  Brandão,  Murfacém  e  Trafaria,
            do século XVI inscreve em lugar de destaque o convento   formando  este  dilatado  mapa  uma  das  mais  deliciosas
            de Santa Catarinâ de Ribamar, situado num alto que do-  perspectivas com que se faz continuadamellte frequentado
            minava a entrada do Dafundo à Cruz Quebrada, conside-  de  nacionais  e  estrangeiros  a  eminência  deste  monte
            rando-o o ponto conspícuo mais importante do porto e).   (. . .) f). Mas antes era ainda mais pronunciado porque so-
            O convento foi fundado em 1551 para substituir uma anti-  freu  aluimentos de  lerras  pelo  menos em  152 1,  1597  e
            ga ermida de Santa Catarina de Ribamar, que já em 1171   162 1; no de 1597 desaparecerem três ruas, cento e sessen-
            era igreja paroquial, a segunda criada depois da conquista   ta casas e um cais de pedra na praia da Boa Vista. Os marí-
            de Lisboa aos Mouros(4), e que deu nome de Ribamar a   timos  da  capital manifestaram  por outras Cormas o seu
            toda a zona ribeirinha a jusante de Lisboa, incluindo os   culto a esta santa: no convento de Santos estava sob o seu
            reguengos de Oeiras e de Algés, como se lê em cartas dos   patrocínio uma  capela com  uma  imagem  da  Senhora da
            reis D. Dinis (<<Os meus reguengos de Ribamar de par de   Bonança pela qual os fI(lveg(mtes e os pescadores têm gran-
            Lisboa») e D. Fernando (<<Os meus rcguengos de Oeiras   de devoção, diz Frei Agostinho de Santa Maria no .San-
            e de Algés que sâo em  Ribamar .. ) (s).  Mais abaixo, entre   tuário Mariano ...  A ermida da Senhora da Graça que os
            a Cruz Quebrada e Caxias. estava outra ermida de Santa   pescadores tinham no sítio do actual Largo do Corpo San-
            Catarina para onde os frades se mudaram em 1618, fun-  to, com um hospital e uma confraria do Corpo Santo, aco-
            dando outro convento de Santa Catarina quando O de Ri-  lheu também uma confraria de Santa Catarina, instituída
            bamar ameaçava ruína(6), mas sendo este depois repara-  em 1615 e mais tarde reunida à confraria do mesmo orago
            do, o da antiga ermida passou à invocação de N.- S.· da   erecta na paroquial dos MártiresCo).
            Boa Viagem - era de tanta devoção entre os marítimos,   Tal como a muralha  fernandina de Lisboa também a
            dos  quais  recebia  muitas aCertas  de objectos de ouro e   muralha  medieval de Setúbal, erguida de  1325 a 1360, ti-
            prata, que lIem a Sé de Lisboa nem OUlra igreja da Penln-  nha  uma  Porta  de Santa Catarina  no extremo noroeste
            sula posSllia cousa tão rica neste género, diz Pinho Leal no   (no sítio da actual Rua de Santa Catarina), donde se avis-
            «Portugal Antigo e Moderno».                        tava a barra do Sado, decerto porque lá existiu uma antiga
               À chegada a Lisboa, no sítio dos actuais largos Trinda-  ermida dessa invocação(II).
            de Coelho (de S.  Roque) e da Trindade, isto é, na parte   O infante D. Henrique fundou em Sagres uma povoa-
            mais alta dos arrabaldes ocidentais da cidade, onde  de-  ção a que deu o nome de «Vila do Infante», para estabele-  ,
            pois foi construído o Bairro Alto, uma antiga ermida de   cer uma escola de ciência náutica (a .Escola de Sagres .. )
            Santa Catarina do Monte Sinai deu nome ao Alto de San-  e, como diz Zurara na .Crónica de Ceuta», para que to-  ,
            ta  Catarina, à  Porta  (ou  Portas)  de Santa  Catarina  (da   dos os navios que alravessassem do Levante para o Poente
            muralha que o  rei  D.  Fernando fez em 1373-75  quando   pudessem ali fazer devisa e achar mamimentos e pilotos,   •
            alargou os limites da cidade) e à Rua das Portas de Santa   assim como fazem em Cádis -  tencionava pois criar um
            Catarina, depois Rua do Chiado e agora Rua Garrett; a   importante porto para escolher a navegação que transita-
                                                                va entre o Mediterrâneo e o Atlãntico. Numa carta de 19
                                                                de Setembro de 1460 indica os dois templos que lá implan-
               e) A. Fan/Quro do Casto,  .A Marinharia das D~scobrim~n/O$ •. td.
            198J. p. 340.                                          (') A.  Vitira do Silvo,  . Disptrsos_.  Vol.  f, Lisboa,  1968, pp.  113.
               (.) Mário Sampayo Ribtiro •• Do Sitio do Rtsttla e das Suas Igr~jas   195,259,381.
            dI' San/a Maria dI'  Bt/lm_,  Lisboa.  1949.  p.  303;  F. da Sitva Nogutira.   (8) ldtm.  Vol. U. 20. td .. Lisboa, 1985, p. '85.
            "Dt'monstrac;ão  Hist6rica  da  Primtira  I'  Rtul  Parochia  dI'  Lisboa_,   (I)  Ft mtmdo  Por/ugal  I'  A'[rtdo  dI'  Mutos.  " Lisooa  tm  1758_,
            Lisboo.1750.                                        Lisboa, 1974, p. 79.
               e) Llvio da  Cosia  Cutdts, ,,0  Arco Btltm - S.  Julião da  Barra.   C~ "Sonllldrio  Mariano,..  Vol.  Vff.  p.  93;  Júlio  dI'  Cos/ilho,
            COlltomoda Emtadadt Poc;odtArcos_,  Lisboa. 1986, p. 49.   "A RibtirodtLisboa~, VoI.1V, 40. td"p. 71.
               (6) Fr. Agostinho dI' San/o Marill, .Sontudrio Mariallo_,  Vol.  VII.   C I)Jooquim Soarts I' C.  TaVaftS da Silva,  . Muralhas Mtdit.·ois dI'
            Lisboo. 1706. p.  18.                              Sttúbal_. St/úbal. /982.
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