Page 13 - Revista da Armada
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mo militar e disciplina. Recruta em 1920, grumete em 21 , çasas cãmaras frigoríficas , agulhas giroscópicas, radares,
chegador em 22, segundo-marinheiro em 26, cabo foguei- beliches para todo o pessoal em várias cobertas ... o navio
ra em 37 (posto máximo que então podiam atingir as pra- deslocava-se com motores Diesel a velocidades até 23 nós
ças desta classe), segundo-sargento em 54 (revogada que e ainda por cima todo o pessoal podia levar a família para
fora a disposição citada), passagem à Reserva em 56 e à junto de si.
reforma em 70. Uma vida ...• 50 anos ao serviço, sempre O «Bérrio». antigo rebocador adaptado a navio-hi·
com devoção e muito amor à Marinha. drográfico, andava a carvão. não tinha frigorífico , a mari-
Adorando andar embarcado passou por muitos navios nhagem dormia em macas e a monte numa única coberta,
e pouco tempo esteve em terra. a água era. normalmente, racionada, o navio linha apenas
Orgulhava-se de, em 1922, ter assistido, no Centro de 500 toneladas de deslocamento e velocidade que ia. bem
Aviação Naval de Lisboa, onde prestava serviço, à parti- puxada . aos 13 nós. Ouanto a agulhas. ilpenas a magnéti-
da do .. Lusitãnib para a primeira travessia aéra do Atlãn- ca, e para sondar, em vez das modernas sondas acústicas
tico Sul; de ter feito o périplo de África; de ter estado em da corveta, o ancestral prumo de mão!
Inglaterra durante a modernização dos contratorpedeiros Duas eras completamente diferentes, apesar de sepa·
da classe .. Vouga .. ; de ter assistindo à exposição de Nova radas por menos de meio século!
Iorque; de ler apanhado muitos temporais no mar, elc., O comandante Vicente Moura nunca andou em na-
elC. vios a carvão, mas eu. que ainda naveguei em três desse
Bom militar (a média das suas informações é de 17/19 tipo, posso tentar dar uma ideia de como era. Ouando ha-
valores), não andava a mudar de situação constantemen- via faina de carvão, era costume mandar de licença para
te. O seu record de permanência foi o contratorpedeiro terra o pessoal que não inlervinha directamente nela, em·
«Tejoll, no qual esteve embarcado 15 anos! bora todos lhe sofressem as consequências. Eram nuvens
No verso da fotografia que publicamos, que mandou de poeira, pessoas enfarruscadas, pó de carvão nos anná-
de Moçambique a sua mulher, escreveu: ( ... ) oferece a sua rios, gavetas, beliches ... até a roupa da cama e as fardas
forografia. de seus camaradas, dos Snrs. oficiais e sarge"- tinham de ser bem sacudidas e escovadas!
tos, que Irouxeram o "allio de Lisboa, demorando 3 meses Depois dos paióis alestados e fechados começava a
na viagem. barrelageral ao navio; primeiro, com mangueiras de água
Seu filho José. estando embarcado na corveta "Gene· salgada, para tirara maior, e depois, tudo bem lavadinho
ral Pereira d'Eça,., em Moçambique. em 1971; escreveu com água e sabão, por dentro e por fora. No fim até se
uma carta ao pai, já reformado, lamentando-se da dureza respirava melhor!
da comissão que efectuava e queixando-se de estar sepa- A navegar, todo este carvão era metido nas fornalhas,
rado da família há cerca de dois meses, apesar de esta se à pazada, pelos pobres chegadores que faziam quartos de
encontrar também em Moçambique, mas na cidade da 4 horas. seguidas de 8 de folga, durante as primeiras qua-
Beira. tro das quais só em caso de emergência, podiam ser cha·
A resposta, na volta do correio deixou-o envergonha- mados. Fora dos quartos e nas quatro horas restantes fa·
do, pois estabelecia a diferença entre as condições em que ziam certos serviços na máquina.
este vivia a bordo e as que o pai viveu, na mesma provin- Atendendo à dureza do seu serviço, no verdadeiro ln·
cia, 40anos antes. ferno de Dante que era a casa das fornalhas, os chegadores
De facto. por ser dos oficiais mais antigos da corveta, eram abonados de dois decilitros de vinho , extra, e uns
tinha camarote individual, havia ar condicionado. espa- gramas de açúcar. para fazerem reCrescos durante o quar-
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