Page 135 - Revista da Armada
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O Decano dos Maquinistas Navais
             O Decano dos Maquinistas Navais

              stiveram reunidos na bela Vila da                                ra hábil assim como a afectuosidade como
              Ericeira, para ser mais correcto, no                             tratava todos os alunos, que nesse navio es-
         Epassado dia 8 de Maio de 2007, seis                                  tagiaram, me marcaram bastante.
         maquinistas navais, com a bonita soma de                                Mas falando ainda da sua vida de Mari-
         idades que perfaziam 479 anos, dando uma                              nha, entre outros navios em que embarcou,
         média aproximada de quase oitenta anos.                               há pelo menos um, em que reproduzo as
           Vem este encontro a propósito, que já                               palavras do seu então ilustre comandante:
         não sendo o primeiro e espera-se que se                                 Todos sabemos que é um bom navio, um
         continuem a realizar muitos mais, o de                                navio de sorte. Não é certo que foi ele, na
         conviver com o decano dos actuais ma-                                 nossa Marinha quem mais náufragos sal-
         quinistas navais.                                                     vou? Há 228 vidas que também nunca o
           É ele o meu caro amigo Joaquim de Al-                               poderão esquecer, a esse “Lima” que os foi
         meida Marrão Júnior. Estar com ele, é con-                            tirar na negrura da noite do mar sem fim.
         viver recordando o passado, e analisando                                Foi o Joaquim Marrão louvado pelo en-
         o presente com uma alegria contagiante,                               tão Capitão-tenente Sarmento Rodrigues,
         em que a sua fabulosa memória é posta em                              Comandante do contra-torpedeiro “Lima”,
         evidência, para uma pessoa que já soma a                              no período de uma heróica acção da nos-
         bonita idade de noventa e um anos.  Joaquim de Almeida Marrão Júnior - Praça da Armada.  sa Marinha na 2ª Guerra Mundial. Por ter
           Nasceu ele na Ericeira no dia 4 de Abril                            evidenciado extraordinário desembaraço e
         de 1916. Quando fala do seu nascimento,                               decisão no trabalho de alagamento dos tan-
         afirma que foi um acontecimento abençoa-                               ques de nafta que exaustivamente executou
         do. Sendo seu pai pescador, era para ter ido                          sob mau tempo, a bordo do N.R.P. “Lima”,
         para o mar, na véspera do seu nascimento,                             em 30-1-1943.
         mas como não queria deixar a sua mãe so-                                Além de condecorações, recebeu ainda
         zinha, pediu a um colega para o substituir,                           outros louvores de várias unidades onde
         e por infelicidade o mar estava bravo e um                            prestou serviço. Voltou à Marinha já na re-
         dos tripulantes morreu.                                               serva no período de 1-10-1976 a 9-1-1978, a
           Aos quatro anos foi forçado, por con-                               fim de actualizar a sua pensão de reserva.
         tingência da vida de seu pai, a ir para Lis-                            Serei breve, em falar de outras activida-
         boa, mas voltava à sua terra natal sempre                             des do nosso camarada, que continuamen-
         que possível.                                                         te mostrou todo o seu saber e talento, além
           Joaquim Marrão, estudou em Lisboa e                                 da sua dedicação e competência para tudo
         foi nessa altura, que surgiram, aqueles que                           em que metia as mãos.
         veio a considerar mais tarde, os seus pri-                              Durante anos foi responsável pelo Ar-
         meiros problemas.                                                     quivo-Museu da Ericeira. Fez parte da Liga
           No liceu que na ocasião frequentava,                                dos Amigos da Ericeira; do Clube Naval
         existia uma forte separação social e  foi en-                         da Ericeira; do Mar de Letras; do Grupo
         quadrado na pior turma. Teve um professor                             Gastronómico “Os Treze”, da Filarmóni-
         que lhe chegou a dizer que ele não prestava                           ca Cultural da Ericeira. Publicou trabalhos
         para a escola,  devia ir para casa e dedicar-se                       no Boletim Municipal, fez palestras espe-
                                             1SAR Joaquim Marrão.
         ao mar, tal como fizera seu pai.                                               cialmente sobre temas ligados à
         Foi para casa e perdeu o ano, re-                                             vida marítima. Esteve na apre-
         vela com amargura.                                                            sentação de inúmeras obras lite-
           Antes de ingressar na Mari-                                                 rárias, e sempre que a Cultura o
         nha, além do 3º ano do liceu,                                                 chamou ele disse: Presente!
         ainda completou o 5º ano da                                                     A Ericeira muito deve a todas
         Escola Industrial Machado de                                                  estas facetas do Joaquim Marrão,
         Castro, e concorreu para pra-                                                 desde a Pintura às Letras, pas-
         ticante de serralheiro no Arse-                                               sando pela História, em tudo ele
         nal de Marinha. Mas o seu so-                                                 sobressaiu com o seu trabalho.
         nho era concorrer a condutor                                                    Todos estes dados foram re-
         de máquinas, classe a que hoje                                                colhidos da publicação “O Car-
         correspondem os actuais ma-                                                   rilhão”, num artigo, quando o
         quinistas navais.                                                             nosso Joaquim Marrão, comple-
           Entrou na Armada aos vinte                                                  tou os 90 anos.
         anos, tendo saído aos quarenta e                                                Eis aqui em traços largos, o perfil
         dois, altura em que foi convida-                                              do nosso camarada, que deve ser
         do por um comandante a ir cola-                                               dos poucos elementos ainda vivos
         borar para uma fábrica instalada                                              do antigo N.R.P. “Lima”, quando
         em Angola, mais propriamente   Homenagem Joaquim Marrão.                      este em pleno mar açorean o e sob
         em Porto Alexandre.                  Tinham sido de 1956 os primeiros con-  violenta tempestade, atingiu em 10 de Abril
           Foi nesta localidade, que o escriba destes  tactos com o Joaquim Marrão quando este  de 1943 os 67 graus de inclinação.
         singelos apontamentos, quando se encon-  como o 1º sargento andava embarcado no                       Z
         trava em comissão no N.R.P. “Pacheco Pe-  N.R.P. “Nuno Tristão”. Foi a partir dessa         C. Batista Velez
         reira”, o encontrou, em 1960 ou 61.  data, que a personalidade, e a sua manei-                  1TEN OTT
                                                                                        REVISTA DA ARMADA U ABRIL 2008  25
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