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O Decano dos Maquinistas Navais
O Decano dos Maquinistas Navais
stiveram reunidos na bela Vila da ra hábil assim como a afectuosidade como
Ericeira, para ser mais correcto, no tratava todos os alunos, que nesse navio es-
Epassado dia 8 de Maio de 2007, seis tagiaram, me marcaram bastante.
maquinistas navais, com a bonita soma de Mas falando ainda da sua vida de Mari-
idades que perfaziam 479 anos, dando uma nha, entre outros navios em que embarcou,
média aproximada de quase oitenta anos. há pelo menos um, em que reproduzo as
Vem este encontro a propósito, que já palavras do seu então ilustre comandante:
não sendo o primeiro e espera-se que se Todos sabemos que é um bom navio, um
continuem a realizar muitos mais, o de navio de sorte. Não é certo que foi ele, na
conviver com o decano dos actuais ma- nossa Marinha quem mais náufragos sal-
quinistas navais. vou? Há 228 vidas que também nunca o
É ele o meu caro amigo Joaquim de Al- poderão esquecer, a esse “Lima” que os foi
meida Marrão Júnior. Estar com ele, é con- tirar na negrura da noite do mar sem fim.
viver recordando o passado, e analisando Foi o Joaquim Marrão louvado pelo en-
o presente com uma alegria contagiante, tão Capitão-tenente Sarmento Rodrigues,
em que a sua fabulosa memória é posta em Comandante do contra-torpedeiro “Lima”,
evidência, para uma pessoa que já soma a no período de uma heróica acção da nos-
bonita idade de noventa e um anos. Joaquim de Almeida Marrão Júnior - Praça da Armada. sa Marinha na 2ª Guerra Mundial. Por ter
Nasceu ele na Ericeira no dia 4 de Abril evidenciado extraordinário desembaraço e
de 1916. Quando fala do seu nascimento, decisão no trabalho de alagamento dos tan-
afirma que foi um acontecimento abençoa- ques de nafta que exaustivamente executou
do. Sendo seu pai pescador, era para ter ido sob mau tempo, a bordo do N.R.P. “Lima”,
para o mar, na véspera do seu nascimento, em 30-1-1943.
mas como não queria deixar a sua mãe so- Além de condecorações, recebeu ainda
zinha, pediu a um colega para o substituir, outros louvores de várias unidades onde
e por infelicidade o mar estava bravo e um prestou serviço. Voltou à Marinha já na re-
dos tripulantes morreu. serva no período de 1-10-1976 a 9-1-1978, a
Aos quatro anos foi forçado, por con- fim de actualizar a sua pensão de reserva.
tingência da vida de seu pai, a ir para Lis- Serei breve, em falar de outras activida-
boa, mas voltava à sua terra natal sempre des do nosso camarada, que continuamen-
que possível. te mostrou todo o seu saber e talento, além
Joaquim Marrão, estudou em Lisboa e da sua dedicação e competência para tudo
foi nessa altura, que surgiram, aqueles que em que metia as mãos.
veio a considerar mais tarde, os seus pri- Durante anos foi responsável pelo Ar-
meiros problemas. quivo-Museu da Ericeira. Fez parte da Liga
No liceu que na ocasião frequentava, dos Amigos da Ericeira; do Clube Naval
existia uma forte separação social e foi en- da Ericeira; do Mar de Letras; do Grupo
quadrado na pior turma. Teve um professor Gastronómico “Os Treze”, da Filarmóni-
que lhe chegou a dizer que ele não prestava ca Cultural da Ericeira. Publicou trabalhos
para a escola, devia ir para casa e dedicar-se no Boletim Municipal, fez palestras espe-
1SAR Joaquim Marrão.
ao mar, tal como fizera seu pai. cialmente sobre temas ligados à
Foi para casa e perdeu o ano, re- vida marítima. Esteve na apre-
vela com amargura. sentação de inúmeras obras lite-
Antes de ingressar na Mari- rárias, e sempre que a Cultura o
nha, além do 3º ano do liceu, chamou ele disse: Presente!
ainda completou o 5º ano da A Ericeira muito deve a todas
Escola Industrial Machado de estas facetas do Joaquim Marrão,
Castro, e concorreu para pra- desde a Pintura às Letras, pas-
ticante de serralheiro no Arse- sando pela História, em tudo ele
nal de Marinha. Mas o seu so- sobressaiu com o seu trabalho.
nho era concorrer a condutor Todos estes dados foram re-
de máquinas, classe a que hoje colhidos da publicação “O Car-
correspondem os actuais ma- rilhão”, num artigo, quando o
quinistas navais. nosso Joaquim Marrão, comple-
Entrou na Armada aos vinte tou os 90 anos.
anos, tendo saído aos quarenta e Eis aqui em traços largos, o perfil
dois, altura em que foi convida- do nosso camarada, que deve ser
do por um comandante a ir cola- dos poucos elementos ainda vivos
borar para uma fábrica instalada do antigo N.R.P. “Lima”, quando
em Angola, mais propriamente Homenagem Joaquim Marrão. este em pleno mar açorean o e sob
em Porto Alexandre. Tinham sido de 1956 os primeiros con- violenta tempestade, atingiu em 10 de Abril
Foi nesta localidade, que o escriba destes tactos com o Joaquim Marrão quando este de 1943 os 67 graus de inclinação.
singelos apontamentos, quando se encon- como o 1º sargento andava embarcado no Z
trava em comissão no N.R.P. “Pacheco Pe- N.R.P. “Nuno Tristão”. Foi a partir dessa C. Batista Velez
reira”, o encontrou, em 1960 ou 61. data, que a personalidade, e a sua manei- 1TEN OTT
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