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REFERÊNCIAS GEOGRÁFICAS 5
Pólos
Os lugares que designamos como pólos1 meçou também a ser utilizada como referência a forma ao escudo conhecido como magnetosfera,
geográficos resultam da intersecção da constelação10 do Cruzeiro do Sul, designadamen- que protege a vida da componente nefasta da ra-
linha fictícia que constitui o eixo de ro- te as estrelas Acrux e Gacrux em passagem meri- diação solar.
tação da Terra com a superfície do planeta. É nos diana, muito embora estas se encontrem bastante Contrariamente ao que sucede com o eixo de-
finido pelos pólos geográficos, que passa exacta-
pólos que convergem todos os meridianos, sen- afastadas do Pólo11. De referir que a famosa missi- mente pelo centro daTerra e cujos extremos ocu-
pam posições opostas na superfície terrestre, a
do igualmente os lugares onde a latitude atinge o va redigida por Mestre João a D. Manuel, em Por- linha imaginária que une os pólos magnéticos, que
não são antípodas, passa a uns 530 Km daquele
valor máximo, 90 graus Norte ou Sul. Conquanto to Seguro, a 1 de Maio de 1500, é o documento local. De resto, o Pólo Norte magnético (J=82º 42’
N; L=114º 24’ W) dista, presentemente, cerca de
possa à primeira vista parecer estranho, para uma onde pela primeira vez aparece a representação 900 Km do Pólo Norte geográfico, ao passo que
o Pólo Sul magnético (● – J=64º 53’ S; L=137º
pessoa que esteja exactamente sobre o Pólo Nor- gráfica desta famosa constelação, aí identificada
86’ E) se encontra 2.800 Km afastado do
te2, tudo quanto se encontra à sua volta está a Sul, como «la crus». Pólo Sul geográfico.
pelo que esta é a única direcção que existe partir Ao mencionado ciclo de precessão, sobrepõem- Como é sabido, as agulhas magnéti-
cas ou bússolas alinham-se com o cam-
daquele ponto3. -se, ainda, o movimento de NutaçãoAstronómica po magnético terrestre, apontando, não
fora a existência de outras influências,
A estrela Polar4, que se constitui actualmente e um outro conhecido como Círculo de Chandler. na direcção do Pólo Norte magnético.
No entanto, devido a perturbações mag-
como a grande referência no que respeita néticas que variam de lugar para lugar,CTEN António Gonçalves
em grande medida fruto da existência
aos aspectos da orientação nocturna no de elementos ferrosos na composição
da crosta terrestre, na realidade a agulha
hemisfério Norte, deve o seu nome ao magnética aponta numa direcção que
não é exactamente o Norte magnético.
facto de se encontrar muito próxima do Surge assim o conceito de declinação
magnética (D), que expressa o ângulo,
Pólo Norte Celeste, ponto imaginário em num determinado local e momento, en-
tre o Norte geográfico e o Norte magné-
torno do qual aparenta girar o céu noc- tico, valor esse que não só varia de lugar
para lugar, mas também ao longo do tem-
turno setentrional. No entanto, devido po15. À linha que une lugares com igual
declinação magnética dá-se o nome de
ao movimento de precessão5 do eixo da isogónica ou isógona16. No caso particu-
lar da linha que une pontos da superfície
Terra, o Pólo Norte, tal como sucede com terrestre com declinação magnética nula,
isto é, os lugares onde o Norte magnético
um pião a girar, descreve igualmente um coincide com o Norte verdadeiro, esta re-
cebe o nome de linha agónica17. Embo-
trajecto quase circular em torno de um ra não se saiba quem descobriu a existência des-
te fenómeno, o certo é que os pilotos Portugueses
ponto médio6, dele distando um valor do século XV já tinham em conta esta grandeza,
designadamente na longa volta peloAtlântico Sul,
angular que coincide com a inclinação no sentido de terem uma ideia da distância a que
os seus navios se encontravam do cabo da Boa
da órbita em relação à Eclíptica, isto é, Esperança. Isto porque um pouco a leste daquele
mítico lugar, passava, naquela época, uma linha
cerca de 23,5 graus. O ciclo de preces- agónica, num local que, coerentemente, foi bap-
tizado como cabo das Agulhas18.
são, que tem uma duração de cerca de Quanto à chegada do Homem aos lugares ex-
tremos que constituem os pólos, ela só se verificou
25.780 anos, faz com que o astro mais no século XX. Convém em qualquer dos casos su-
blinhar, que o Pólo Norte se situa sobre a calota de
próximo do Pólo Norte não seja o mes- gelo do Oceano Glacial Árctico, podendo dizer-
se que está praticamente ao nível do mar. Contu-
mo ao longo do tempo, pelo que, em do, o Pólo Sul encontra-se em pleno continente
da Antárctida, a uma altitude de 2.835 metros, o
determinadas épocas, não haverá ne- que, só por si, justifica as maiores dificuldades
para o alcançar.
nhuma estrela suficientemente próxima Embora envolto em alguma polémica, tudo in-
dica que tenham sido o Comandante Robert Pea-
para efeitos da obtenção da latitude de ry (1856-1920) e Matthew Henson (1866-1955),
forma expedita7. Neste particular, recor-
damos que em meados do século XV a
declinação da estrela Polar era aproxima-
damente 86,5 graus, pelo que a determi-
nação da respectiva altura nem sempre
conduzia, de imediato, à latitude do lu- Os movimentos do eixo da Terra.
gar. Para o efeito, e na maior parte dos casos, havia O primeiro, a que já nos referimos anteriormente, é
que proceder a um cálculo simples, tendo como provocado pela acção do campo gravítico da Lua
base o estabelecido na regra empírica conhecida sobre a Terra, sendo o seu ciclo de 18,6 anos12.
como Regimento do Norte. Desta ténue oscilação do eixo daTerra, resulta uma
Ainda no que respeita à estrela Polar, a sua de- minúscula elipse, cujos semi-eixos medem, ape-
clinação continuará a aumentar até cerca do ano nas, cerca de 9,21 e 6,86 segundos de arco13.
2100, o que significa que até lá se aproxima do Relativamente ao segundo movimento, cujo
Pólo Norte8. Por essa altura atingirá o valor máxi- período varia entre os 416 e os 435 dias, deve o
mo, próximo dos 89,5 graus, afastando-se progres- seu nome ao astrónomo norte-americano Seth
sivamente a partir de então. Chandler (1846-1913), que em 1891 identificou
Como é sabido, em relação ao Pólo Sul não esta subtil oscilação do eixo daTerra, tendo como
existe nenhuma estrela próxima, o que, convém base os estudos desenvolvidos pelo matemático
recordar, acarretou problemas no que concerne ao suíço Leonhard Euler (1707-1783), em 1758, bem
posicionamento dos navios quando os Portugue- como as observações astronómicas realizadas em
ses se estrearam a navegar no hemisfério Sul, na 1884 pelo astrónomo alemão Friedrich Küstner
segunda metade do século XV. O Sol, cuja altura (1856-1936)14.
da passagem meridiana cedo se constituiu como Devido à existência de um núcleo ferroso no
elemento chave para a determinação da latitude seu interior, a Terra, além dos pólos geográficos,
em ambos os hemisférios, obriga a um cálculo dispõe também de pólos magnéticos, que não
onde intervêm a declinação do astro e a altura coincidem com os primeiros. Estes constituem
observada (a) ou, mais frequentemente, a distân- os pontos através dos quais, tal como num íman,
cia zenital (Z)9. fluem as linhas de força do campo magnético ter-
No hemisfério Sul, ainda antes de 1500, co- restre. No seu conjunto, estas linhas de força dão
12 MARÇO 2010 U REVISTA DA ARMADA