Page 28 - Revista da Armada
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HIERARQUIA DA MARINHA						 18

                  ESCRIVÃO

Otermo escrivão deriva do termo              coisas», que deviam ser dadas a conhe-     ler: «…mandamos aos escrivães de todas as
          latino scribãnus. Na antiguida-    cer, das quais se incluíam: o registo das  naus e navios que pelos livros da dita casa
          de era uma pessoa educada nas      vontades dos embarcados e dos óbitos,      [da Índia] assente cada um em seu livro em
artes da escrita que, sob as ordens de       bem como dos inventários de bens dos       título que disso fará apartado todas as pes-
uma autoridade, redigia as normas de         defuntos; os registos de propriedade,      soas por seus nomes que receberem do dito
um povo ou de uma religião. Cumula-          dos conflitos e das queixas; o registo     soldo…e cada um capitão na sua fareis alar-
tivamente, podia exercer várias funções      de todos os nomes, estado civil, filia-    do pelo assento dos ditos livros com toda a
administrativas, como contador, secre-       ção e soldos previstos para o pessoal      gente de cada nau e será então declarado no
tário, copista e arquivista.                 embarcado.                                 assento de cada um além do nome qualquer
                                                                                        alcunha ou apelido que tiver, e se for casado
  Nesta linha, na Marinha Portuguesa           Existem muitos registos feitos pelos     e onde, e nome do pai ou mãe se o tiverem
os escrivães dos navios tinham como          escrivães dos navios. A título mera-       ou qualquer outra mais declaração para que
missão registar tudo o que se passava        mente ilustrativo, destacam-se dois ca-    ao diante se cumprir possam ser melhor co-
a bordo, como refere o contrato, cele-       sos paradigmáticos. O primeiro registo     nhecidos» (Arquino Nacional Torre do
brado em 1317, entre o rei D. Dinis e o      e, porventura, o mais conhecido, é de      Tombo, Maço n.º 2 Leis, n.º 13).
almirante-mor Manuel Pessanha: «…            Pedro Vaz de Caminha, que se notabili-
os seus escrivães que forem nas Galés / que  zou como escrivão da armada de Pedro         Em suma, pode-se concluir que o
Jurem a mim e aos meus sucessores que bem    Álvares Cabral. Foi neste cargo que, a     escrivão era um funcionário adminis-
e direitamente escrevam em seus livros: as   1 de Maio de 1500, escreveu a célebre      trativo, incumbido de registar a vida a
cousas que no mar ganhardes e as outras      carta a D. Manuel I, que relata a chega-   bordo dos navios, com a finalidade de
coisas / que devem escrever e de que devem   da dos portugueses ao Brasil.              apoiar a gestão das actividades marí-
dar fé…» (chancelaria D. Dinis liv. 3º, fl.                                             timas de Portugal.
108). Por outras palavras, aos escrivães       O segundo registo foi extraído do
incumbia o registo fiel dos feitos marí-     re­ gimento que o rei D. Manuel I deu a                                                       
timos e de uma diversidade de «outras        D. Francisco de Almeida, em 1505, para                              António Silva Ribeiro
                                             a sua missão no oriente, onde se pode
                                                                                                                                             CALM

VIGIA DA HISTÓRIA						                                                                 45

A FUGA DO NÚNCIO APOSTÓLICO

Monsenhor Caleppi, que era o                   Não tendo logrado a obtenção de            No dia 19, tendo encontrado o Estre-
            Núncio Apostólico em Lis-        passaporte e quando preparava a fuga       la do Norte e apesar do oferecimento
            boa, terá manifestado junto      através de Espanha teve o Núncio co-       dos ingleses em os transportar, pas-
ao Príncipe Regente, o interesse em          nhecimento que, a 17 de Abril de 1808,     saram para bordo daquele navio que
acompanhar a corte portuguesa na             iria sair o navio português Estrela do     passou a ser escoltado pelo navio in-
fuga para o Brasil.                          Norte, capitaneado por Francisco Bení-     glês Mediador; o transbordo deverá
                                             cio de Carvalho que, a troco de 1200000    ter sido bastante difícil porquanto o
  No dia 26 de Novembro, o Secretário        reis, se propôs garantir o transporte do   Núncio seguia quase desfalecido de-
de Estado da Marinha e Ultramar diri-        Núncio para o Brasil, comprometendo-       vido ao enjoo.
giu-se a casa do Núncio entregando-lhe       -se, para o efeito, a esperar ao largo da
a ordem para que os comandantes dos          barra do Tejo, durante três dias.            Nas proximidades da Madeira, o Es-
navios Medusa e Martim de Freitas o re-                                                 trela do Norte foi abalroado, pelo navio
cebessem a bordo, na manhã seguinte,           No dia 18, o organizador da fuga, cuja   escolta,  ficando em risco de naufragar
juntamente com o respectivo séquito.         identidade não se encontra referida no     pelo que o Núncio passou para bordo
                                             texto consultado, compareceu pelas         da fragata inglesa nela seguindo para
  Contactados os referidos oficiais, na      18.30 horas, na residência do Núncio       Plymouth.
manhã do dia 27, estes não puderam           com uma carruagem que o levou, junta-
cumprir aquela ordem dado que os             mente com alguns acompanhantes, para         A atribulada viagem do Núncio só
respectivos navios já se encontravam         Pedrouços onde embarcaram numa fra-        terminou em 8 de Setembro, quando,
sobrelotados.                                gata do Tejo que, a coberto da noite, os   embarcado no navio inglês Stork, en-
                                             transportou para a barra.                  trou no Rio de Janeiro.         
  Falhadas as diligências oficiais ain-
da tentou o Núncio seguir viagem  na           Durante o percurso, feito dissimu-         Ao que se refere, existirá no Arqui-
companhia do bispo da Madeira, que           ladamente, descobriram que a bordo         vo do Vaticano, o diário da viagem
havia fretado um navio, hipótese que         seguiam ainda, escondidos, um casal        efectuada.
se gorou já que o respectivo capitão não     de jovens.
compareceu ao embarque .                                                                   
                                               Tendo conseguido sair a barra nessa                                      Com. E. Gomes 
  Obrigado a permanecer em Lisboa,           noite não lograram encontrar o navio
assistiu o Núncio à entrada de Junot em      contratado vindo a ser recolhidos pelo        Fonte: Anais da Biblioteca Nacional do Rio de
Lisboa o qual, passando junto à sua re-      navio inglês Ninfa que integrava a for-    Janeiro, Tom. 61.
sidência, teve a amabilidade de inquirir     ça inglesa de bloqueio do Tejo.            N.R.
sobre a sua saúde.                                                                      O autor não adota o novo acordo ortográfico.
28 JULHO 2012 • REVISTA DA ARMADA
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