Page 21 - Revista da Armada
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Foi também durante o reinado de D. Luís que deira da Companhia. Logo iniciou a sua carreira to de capitão-de-mar-e-guerra em 9 de Março de
a cultura em Portugal mais se evidenciou. No quando ainda nesse mesmo ano, acompanhou 1859. Das diversas comissões destacam-se em
campo literário destacaram-se escritores que para o almirante inglês Parker nas manobras de uma 1858 a viagem à Madeira e Açores. Sobre esta,
sempre permaneceram nos anais da história de esquadra inglesa no Tejo. Como seria de esperar, D. Luís recordou-se até aos últimos dias da sua
Portugal, com especial destaque para a «Ques- o jovem D. Luís teve uma rápida ascensão hierár- vida, como tendo sido a viagem mais dura de-
tão Coimbrã», as «Conferências do Casino» e o quica mas que, e como indicado anteriormente, vido ao forte temporal que apanhou no regresso
Grupo dos «Vencidos da Vida». Eça de Queirós, não era atribuída à posição honorífica que o prín- a Lisboa. Efectuou nos anos seguintes comissões
Camilo Castelo Branco, Júlio Dinis, Teófilo Braga, cipe detinha, muito pelo contrário, atingiu-a pela à Europa e Norte de África, sendo de realçar a
Antero de Quental, Ramalho Ortigão, Alexandre devoção à Armada e pela carreira a tempo inteiro viagem em Abril de 1859 em que foi a Inglaterra
Herculano, Cesário Verde, Guerra Junqueiro, são que desempenhou entre os anos de 1851 e 1861. buscar o príncipe Jorge da Saxónia que iria ca-
alguns dos nomes mais sonantes deste período. sar com a sua irmã, Infanta D. Maria Ana, e em
Com 13 anos apenas é promovido a segundo- Setembro de 1861 quando transportou até Antu-
Na pintura e escultura sobressaíram igualmen- -tenente e em 1854 embarca, juntamente com érpia a sua irmã D. Antónia e o marido príncipe
te alguns dos artistas mais importantes da nossa o seu irmão D. Pedro V, na sua primeira grande Leopoldo, recentemente casados.
história, como Marciano Henriques da Silva, viagem de navio pela Europa. A bordo da corveta
Marques de Oliveira, João Vaz, José Malhoa, Co- Mindelo, D. Luís escreveu um pequeno diário da Retirado da carreira naval pelas obrigações que
lumbano, Soares dos Reis, Rafael Bordalo viagem onde se destaca a sua tristeza e desconten- a coroa impunha, D. Luís, directa ou indi-
Pinheiro, entre outros. tamento por sofrer algo de comum a quem anda rectamente, sempre marcou a sua presença
no mar: o enjoo! Promovido a capitão-tenente nos assuntos da Marinha. Acompanhando
Figura extremamente sensível às questões em 29 de Outubro de 1854 e já com o irmão no os progressos das técnicas navais, visitando
culturais interiorizadas durante o processo de trono, D. Luís vai intensificar o estudo e a partici- frequentemente navios de guerra nacionais
educação enquanto jovem, devido à forte in- pação efectiva dos deveres da Armada, o que lhe ou estrangeiros que aportavam em Lisboa,
fluência e estímulo por parte de D. Fernando, valeu em 15 de Setembro de 1857 a nomeaçãode e usando o seu título de Almirante General
o monarca embora não tivesse o peso que comandante do brigue Pedro Nunes. Em Janeiro do da Armada Portuguesa, por inerência da fun-
seu pai teve nestas matérias, sempre se esfor- ano seguinte, efectuou um cruzeiro na costa de Por- ção de rei, influenciou e apoiou os progra-
çou por estabelecer uma ligação direta com tugal e uma comissão a Gibraltar, sendo promovi- mas navais dos seus ministros da Marinha,
os vários artistas e às novas correntes, visi- do em 24 de Março ao posto de capitão-de-fragata. na tentativa de renovação e aumento da
tando regularmente inúmeras exposições de Entregou o comando do navio em 21 de Junho ao esquadra, fortemente debilitada após a inde-
pintura, adquirindo ao mesmo tempo a título primeiro-tenente Domingos de Sousa Rodrigues a pendência do Brasil. Encontrou na Marinha
pessoal algumas delas para as expor na Gale- fim de tomar o comando do mais recente navio da um complemento à sua formação, e o seu
ria de Pintura do Palácio da Ajuda. Monarca Armada, a corveta Bartolomeu Dias. carácter e personalidade em muito revela-
de personalidade literata e artista, foi também va essa paixão e tristeza, de um marinheiro
ele autor de diversas pinturas e gravuras de Seria também durante esse período que D. Luís vagueando pelas ruas de Lisboa ao sabor do
marinha, dedicava-se à música tocando com iria completar a sua formação naval, instruída por seu infortúnio.
grande desenvoltura violino e várias foram as alguns dos oficiais mais distintos da época. Ao Monarca de qualidades reconhecidas, her-
obras de Shakespeare que traduziu nos seus comando deste navio, e durante cerca de 3 anos dou de seu pai o gosto e a prática das artes.
tempos livres. Seguiu igualmente os passos e meio, vai efetuar diversas comissões aportando Portador de uma formação e sensibilidade
de sua mãe, e por sua ordem foram constru- em vários destinos, tendo sido promovido ao pos- cultural acima da média, destacou-se na car-
ídos e fundadas diversas associações cultu- reira naval, o que aliado a todos os fatores
rais. Mas mais que um simples artista, D. Luís mencionados, fez com que por sua iniciativa
era principalmente um homem das ciências, se criasse a 22 de Julho de 1863 o Museu
evidenciando-se na oceanografia, área onde de Marinha, funcionando na Escola Naval, à
investiu uma boa parte da sua fortuna em época sediada no Terreiro do Paço.
projectos e estudos científicos, grande parte Marcado pela doença e saturação política
elaborados pelo próprio. em que foi envolvido, o monarca iria passar
os últimos anos da sua vida em viagens pelo
Mas falar de D. Luís é falar obrigatoriamen- estrangeiro, visitando familiares, e deixando
te da sua ligação à Marinha e da sua paixão a regência do país a cargo do seu filho D.
pelas actividades marítimas que desde cedo Carlos. O casamento deste com a princesa
se fez sentir, não só pelo gosto pessoal do
próprio, mas porque era hábito nos países Amélia d´Orleães (1886), e o nascimento do seu
da Europa incorporarem-se os jovens príncipes neto Luís Filipe (1887), terão sido as suas últimas
das casas reais no exército ou na marinha para aí alegrias. Apaixonado pelas artes e ciência, pela
fazerem carreira. literatura, coleccionador de mérito, amado pelo
povo, considerado por muitos como o monarca
Não era de estranhar que segundo esta tradição, mais instruído da Europa, o “Popular” perece na
os seus pais colocassem o jovem príncipe nos tri- Cidadela de Cascais a 19 de Outubro de 1889.
lhos de uma carreira militar, não devendo a mes-
ma ser confundida com os propósitos de outros T. Resende de Carvalho
tempos passados, em que os reis e príncipes eram STEN TSN
colocados à frente dos seus exércitos para os con-
duzirem na guerra e ostentarem as suas fardas e Nota:
galões como simples aparato honorífico destinado 1 O casal real teve mais seis filhos: Pedro (1837), her-
a dignificar as Corporações e a prestigiar a Coroa. deiro por direito ao trono, João (1842), Maria Ana (1843),
Antónia (1845), Fernando (1846) e Augusto (1847). Nas-
O desejo de seus pais foi formalizado quando ceram outros quatro filhos, mas viriam a falecer após o
D. Luís, ainda não tendo completado 8 anos de parto atestando igualmente a elevada taxa de mortalidade
idade, em 9 de Outubro de 1946 foi alistado na infantil registada na época.
Companhia dos Guardas-Marinha. A cerimónia N.R.
decorreu na Sala do Risco do Arsenal da Marinha O autor não adota o novo acordo ortográfico.
perante a Companhia formada em parada e onde
a rainha D. Maria, acompanhada pelo seu esposo, REVISTA DA ARMADA • MARÇO 2013 21
viram o jovem infante prestar juramento de com-
promisso colocando a mão sobre a nova ban-