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REFLEXÃO ESTRATÉGICA 9
O VALOR ESTRATÉGICO DOS SUBMARINOS
INTRODUÇÃO exploração sustentável. No futuro, aquelas tare- pacidade de operar durante largos períodos (au-
A persistência do debate sobre o valor estra- fas deverão ser estendidas à área marítima que tonomia de 60 dias) longe das bases de apoio
tégico dos submarinos para Portugal decorre, resultar da reclamação da extensão da Platafor- (alcance de 12000 milhas náuticas).
principalmente, do facto de há mais de duas ma Continental.
décadas não estar perfeitamente configurada Uma análise geográfica destes espaços (Fig. ADACODINSSSUECAUSÃÇOÃO
uma ameaça que coloque em sério risco a se- 2) permite concluir que a Zona Económica Ex-
gurança nacional. Por isso, desenvolveu-se e clusiva possui cerca de 1.6 milhões de km2, que Para se conseguir a dissuasão das ameaças
adquiriu primazia entre nós a visão idealista da correspondem a 18 vezes o território nacional militares, erosivas e sistémicas que podem afec-
política internacional, assente na paz e na coo- e a 40% da área terrestre da UE. A reclamação tar a segurança nacional nos espaços marítimos
peração. Esta concepção utópica relegou para da extensão da Plataforma Continental permitirá onde Portugal exerce soberania e jurisdição,
plano secundário o imperativo realista do dese- acrescentar a soberania nacional no solo e no seriam necessários meios navais de superfície,
quilíbrio de forças ser propício às alterações da subsolo marinhos em cerca de 2.1 milhões de com uma qualidade e em tal quantidade, que
ordem internacional, na medida em que facilita km2, que correspondem a 23 vezes o território consumiriam recursos financeiros essenciais a
as divergências políticas, por vezes levadas ao nacional e a 49% da área terrestre da UE. outros sectores da vida nacional, caso o sistema
extremo da guerra, como meio últi-
mo para fazer prevalecer a vontade de força naval não integrasse sub-
de um Estado. marinos.
O debate sobre o valor estratégico
dos submarinos, sendo útil, porque Na realidade, os submarinos são
permite apoiar a tomada de deci- determinantes na consecução da
são política e esclarecer a opinião dissuasão contra aquelas ameaças,
pública, também é paradoxal, por- devido às suas características ope-
que a segurança nacional encontra- racionais específicas. Com efeito, a
-se afectada por ameaças militares dissimulação, a autonomia, a mo-
e por ameaças erosivas (tráficos e bilidade, o alcance, a discrição, a
criminalidade transnacional) e sisté- sobrevivência, a prontidão, a resili-
micas (terrorismo e proliferação de ência, o potencial de destruição, a
armas de destruição massiva). Estes precisão e diversidade de armas e
três tipos de ameaças decorrem das sensores, a independência das con-
instabilidades verificadas em regiões dições de mar, e a capacidade de
geograficamente próximas, ou onde comando, controlo, comunicações
Portugal possui interesses importan- NRP Tridente a navegar no Tejo. e informações, facultam a explora-
tes, e a sua contenção requer o em- ção da surpresa e a imposição de
prego da força naval e, concretamente, dos sub- Se, aos imperativos geográficos, adicionarmos elevados graus de incerteza e risco,
marinos, como tem acontecido no Atlântico, no uma análise estratégica que evidencie as rela- que inibem os eventuais adversários
Mediterrâneo e no Índico. ções e o uso do poder, percebemos que os es- militares e infractores não militares de agir con-
Este artigo tem como objectivo apresentar os paços marítimos de Portugal: estão situados na tra os interesses nacionais.
argumentos que se consideram mais relevantes linha de fractura cultural, económica, religiosa e Nestas circunstâncias, pode afirmar-se que os
no quadro de uma análise à valia estratégica dos militar entre os hemisférios Norte e Sul; ocupam submarinos contribuem para a consecução da
submarinos para Portugal. Como está incluído uma posição central no Atlântico Norte, entre dissuasão, porque permitem a defesa directa do
num conjunto de trabalhos alusivos ao centená- a Europa e os Estados Unidos da América; en- território nacional e dos espaços marítimos onde
rio dos submarinos, houve o cuidado de evitar a globam as principais rotas do tráfego marítimo o país exerce soberania ou jurisdição, reduzem
repetição das matérias tratadas por outros auto- de reabastecimento das economias ocidentais; o risco de escalada, consubstanciam a principal
res. Para isso, cingiu-se o seu conteúdo ao plano permitem que Portugal tenha acesso directo a resposta militar de Portugal contra meios navais
estrito da fundamentação estratégica teórica dos outros países e continentes, por via marítima, hostis, e protegem o território e as actividades
submarinos para o exercício da soberania e ju- livre de restrições de qualquer natureza e a cus- marítimas nacionais das ameaças erosivas e
risdição, para a consecução da dissuasão e para tos mais reduzidos; ligam as Zonas Económicas sistémicas. A defesa directa tem a ver com as
o desempenho militar do país, que são os pilares Exclusivas e as extensões das Plataformas Conti- capacidades dos submarinos para tomarem a
da função militar do Estado. nentais do Continente, dos Açores e da Madeira; iniciativa da guerra no mar e de negarem, pela
permitem actividades económicas que geram força, a consecução dos objectivos de um inimi-
EOJEUXREIRSCDÍICÇIÃOODA SOBERANIA cerca de 12% do PIB nacional; possuem subs- go. O risco de escalada é reduzido pelos efeitos
tanciais reservas de metais com potencial eco- dos ataques dos submarinos poderem tornar os
nómico (ouro, prata, zinco, cobalto e níquel), custos de uma acção militar contrária, superior
O exercício da soberania e jurisdição nos es- bem como espécies vivas com grande interesse aos ganhos dela decorrentes. Para a relevância
paços marítimos nacionais está associado à pre- para as indústrias farmacêutica e cosmética. da resposta militar dos submarinos contribuem,
sença naval e à protecção e defesa de recursos. Para o exercício da soberania e jurisdição nos não só, as características operacionais espe-
Estas duas tarefas do poder naval, na actualida- enormes espaços marítimos nacionais, o sub- cíficas anteriormente referidas, mas, também,
de são concretizadas através de patrulhas do marino revela-se muito eficaz, por poder actuar aquelas que estão relacionadas com as dos
mar territorial e da Zona Económica Exclusiva, dissimulado com o meio, exercendo, desta for- meios aeronavais utilizados pelos potenciais an-
destinadas a exercer a vigilância preventiva e ma, uma profícua verificação das actividades tagonistas para os detectar, atacar e destruir. Na
correctiva necessária à sua boa governança e em curso, para a qual é indispensável a sua ca- protecção do território e das actividades maríti-
mas nacionais relativamente às ameaças erosi-
vas e sistémicas, são críticas as capacidades dos
4 ABRIL 2013 • REVISTA DA ARMADA