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PRECURSORES DOS SUBMERSÍVEIS EM PORTUGAL

Na transição do século XIX para o XX sur-          marães, Capitão-tenente Carlos Rosa, Enge-           Foto Arquivo Histórico da Marinhasistema de visão com que ele estava equipado
       gem os primeiros submarinos com valor       nheiro Construtor Naval João Maria Galhardo                                           e que seria o mesmo a utilizar nos submarinos
  militar efectivo. Em Portugal conhecem-se dois   e Primeiro-tenente Baldaque da Silva.                                                 a construir.
  projectos, da autoria do Primeiro-tenente João
  Fontes Pereira de Melo e do Primeiro-tenente       Tanto quanto nos foi possível apurar, é tam-                                         O modelo foi construído no Arsenal da Mari-
  Júlio Valente da Cruz. Neste artigo serão apre-  bém neste ano que começam a surgir notícias,                                          nha, sob a direcção do engenheiro maquinista
  sentados ambos os projectos, sendo o primeiro    na imprensa, sobre o submarino Fontes. Assim,                                         de 1ª classe Francisco António de Sequeira.
  texto da autoria do CFR Costa Canas e o segun-   no número 419 da revista Ocidente, datado                                             Apesar de o nome não apontar nesse sentido,
  do redigido pelo CALM David e Silva.             de 11 de agosto de 1890 aparece uma primei-                                           encontramos várias referências ao facto de
                                                   ra notícia, assinada por «Grumete» na qual se                                         este engenheiro ser irmão de Fontes Pereira de
O SUBMARINO FONTES                                 fala de submarinos aparecendo a referência a                                          Melo. Construído em chapa de ferro era com-
                                                   um projecto português. Desta notícia merecem                                          posto por um cilindro central ao qual se liga-
 No final do século XIX, o Primeiro-tenente        destaque alguns pontos. Em primeiro lugar, o                                          vam duas pirâmides cónicas, à proa e à popa.
João Fontes Pereira de Melo desenvolveu os         autor do texto refere que o Arsenal da Marinha                                        O comprimento total era pouco superior a
planos de um submarino com potencial apli-         não teria capacidade para construir este género                                       onze metros.
cação militar. Apresentou o seu projecto ao
governo, tendo conseguido autorização para         CFR João Fontes Pereira de Melo.                                                        As primeiras experiências de avaliação ocor-
que fosse construído um modelo numa escala                                                                                               reram em 18 de Outubro de 1893, junto à
reduzida, destinado a testar as capacidades do     de navios, devendo a construção ser entregue                                          porta do dique do Arsenal da Marinha. O Te-
invento. Apesar de nestas provas ter consegui-     a particulares. Esta opinião era partilhada pelo                                      nente Fontes e dois operários do Arsenal em-
do resultados satisfatórios, pelo menos na sua     próprio autor do projecto, que provavelmente                                          barcaram no modelo e estabeleceram comu-
opinião, a proposta não conheceu mais de-          era também o autor do texto! Por outro lado,                                          nicações telefónicas com a muralha do dique.
senvolvimentos. Pereira de Melo prosseguiu os      é referido que o país deveria possuir «cem ou                                         Essas comunicações permitiam receber instru-
seus estudos e voltou a apresentar, alguns anos    duzentos torpedeiros submarinos» que garanti-                                         ções da comissão e reportar os resultados das
depois, uma versão modificada do seu projec-       riam a segurança dos nossos portos, incluindo                                         experiências. Nesse dia, o principal objectivo
to inicial, tendo continuado posteriormente a      os ultramarinos. Este tipo de navios era excelen-                                     foi testar a estabilidade do modelo. Para tal, o
desenvolver o seu invento. Felizmente, a in-       te para enfrentar os ingleses, que nesse mesmo                                        mesmo entrou em imersão e foi regulado de
formação que foi publicada sobre este assunto      ano tinham afrontado Portugal, devendo usar-                                          modo a permanecer perfeitamente horizon-
é imensa, provavelmente toda ela da pena do        -se verbas da Subscrição Nacional para finan-                                         tal. Seguidamente foram libertados uns pesos
autor do projecto. Esta quantidade de informa-     ciar a sua construção.                                                                que se encontravam no exterior, sem que a
ção permite-nos explicar, em traços gerais, a                                                                                            estabilidade tivesse sido afectada. No dia 31
evolução deste projecto.                             Passado quase um ano, e face à ausência de                                          do mesmo mês, foram levadas a cabo novas
                                                   resposta, solicitou, em 18 de Junho de 1891,                                          experiências, desta feita para testar o sistema
 A ideia terá começado a ser desenvolvida na       que fosse retirada a oferta que tinha feito. Final-                                   de visão. Após entrar em imersão, o Tenente
década de oitenta. No entanto, não era este o      mente, conseguiu um despacho afirmativo para                                          Fontes foi descrevendo pelo telefone o movi-
primeiro «invento» de Fontes Pereira de Melo.      a petição que submeteu em 24 de Outubro de                                            mento que ia observando no rio. Antes da rea-
Tendo assentado praça na Marinha em 1872,          1891. Desta vez, pedia que fosse construído um                                        lização das provas mencionadas, o modelo já
ainda nessa década, em 1877 sugere um mo-          modelo à escala, para testar as capacidades do                                        tinha sido testado pelo autor do projecto. Nos
delo inovador de máquina a vapor. Nos anos         seu invento. As experiências do modelo seriam                                         Anais do Clube Militar Naval de Setembro de
seguintes desenvolve estudos no campo da           avaliadas pela mesma comissão que analisou                                            1893 surge a referência a testes realizados jun-
electricidade. Para a defesa do porto de Lisboa    o projecto. Neste requerimento, Fontes referia                                        to à Cova da Piedade.
propõe um torpedo dirigível de sua autoria.        que o modelo era destinado essencialmente à
Para aumentar as capacidades deste seu torpe-      avaliação das condições de estabilidade e do                                            Não tendo conquistado o interesse das auto-
do, começa a preparar o projecto da estação                                                                                              ridades para o seu projecto, Fontes Pereira de
submarina. Esta estação submarina ficou tam-                                                                                             Melo apresentou, em 23 de Fevereiro de 1897,
bém conhecida como submarino Fontes, sen-                                                                                                um requerimento para que pudesse dispor do
do o tema central deste breve texto. Em 1889                                                                                             seu invento. Recordemos que ele pusera o seu
Fontes dava por concluídos os projectos da es-                                                                                           projecto à disposição do governo. Em 9 de Ju-
tação submarina e do torpedo dirigível, tendo                                                                                            nho do mesmo ano, foi publicada em Ordem
arquivado os mesmos. Nesse ano começou a                                                                                                 da Armada a licença para usar o invento como
estudar a concepção de um automóvel eléctri-                                                                                             entendesse. Com base nessa autorização de-
co, cujo funcionamento era similar ao da esta-                                                                                           legou na firma Alves da Rocha & C.ª poderes
ção submarina.                                                                                                                           para negociar o seu segredo. Vale a pena referir
                                                                                                                                         ainda que nesse mesmo ano, na sessão de 7 de
 No início de 1890, mais precisamente a 8 de                                                                                             Agosto, da Câmara dos Deputados o deputado
Fevereiro, Pereira de Melo dirige um requeri-                                                                                            Ferreira de Almeida apresentou, na discussão
mento ao monarca no sentido de oferecer os                                                                                               do orçamento, a seguinte proposta: «Proponho
planos da sua estação submarina. Esta sua deci-                                                                                          para que no Capítulo I – Construção de navios
são está relacionada com o facto de Portugal ter                                                                                         da armada se acrescente – Submarino Fontes».
sido sujeito ao Ultimatum inglês, no primeiro                                                                                             Conforme afirmámos anteriormente, a revista
mês daquele ano. Não tendo obtido resposta                                                                                               Ocidente começou a publicar textos sobre o
favorável, voltou a submeter a sua proposta em                                                                                           submarino Fontes em 1890. Em finais de 1893
30 de Julho. Este requerimento mereceu um                                                                                                voltou a notar-se o interesse da revista em re-
despacho da Direcção-geral de Marinha no-                                                                                                lação a este projecto, mantendo-se em vários
meando uma comissão para avaliar os planos                                                                                               números de 1894. Curiosamente, tal aconte-
e a memória descritiva do projecto. Integravam                                                                                           ce mais ou menos ao mesmo tempo que são
esta comissão: Capitão-de-mar-e-guerra Nunes                                                                                             realizadas as experiências acima descritas. Cer-
de Carvalho, Capitão-de-fragata Teixeira Gui-                                                                                            tamente que não foi apenas por acaso que tal
6 ABRIL 2013 • REVISTA DA ARMADA
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