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RUY DE CARVALHO
Oactor Ruy Alberto Rebelo Pi-
          res de Carvalho nasceu a 1 de    público, e por várias experiências de        Naval. Era o mundo dos cadetes, no fi-
          Março de 1927, na cidade de      teatro de repertório, interpretando per-     nal dos anos quarenta do século XX, não
Lisboa. Filho de um Oficial do Exército    sonagens mais elaborados, em textos de       muito diferente, na sua componente hu-
e de uma professora de música e pianis-    autores consagrados, que foram grandes       mana, daquilo que ainda é hoje.
ta, que foi aluna de Viana da Mota, foi    desafios profissionais e que hoje recor-
criado num ambiente ligado às artes e      da com o prazer próprio de um grande          Com uma carreira de cerca de 66 anos,
ao espectáculo, observando a carreira de   actor que analisa a riqueza do seu per-      o actor Ruy de Carvalho construiu uma
dois irmãos mais velhos no mundo do te-    curso artístico. Não podemos enumerar        reputação artística ímpar, que mereceu
atro. Pisou pela primeira vez o palco com  aqui todos os seus êxitos, nem é possível    relevo além-fronteiras e a todos nos or-
sete anos de idade, na cidade da Covilhã,  fazer deles um resumo abreviado sem          gulha, enquanto seus compatriotas e
numa representação infantil, de            conspurcar a sua grandeza. Digamos           admiradores. Em Portugal recebeu múl-
cuja memória guarda apenas a               que foram muitas centenas de produ-          tiplas distinções e galardões, de que
ansiedade de entrar em cena e              ções teatrais a que se juntam os filmes,
de querer fazer tudo bem fei-              as telenovelas, séries televisivas e muitas             destacamos as condecorações
to. Com 15 anos integrou um                outras realizações artísticas. Dos diver-               com a “Medalha de Mérito
grupo de teatro amador e par-              sos filmes em que participou, realçamos                 Cultural do Governo Portu-
ticipou na primeira produção               a produção “Eram Duzentos Irmãos”,                      guês”, o grau de comendador
teatral, dirigido por Francisco            realizado por Armando Vieira Pinto, em                  e a Grã-Cruz da “Ordem do
Ribeiro (o conhecido Ribeiri-              1948. Faz agora 65 anos. O enredo da                    Infante D. Henrique” e o grau
nho), seguindo-se a frequência             película desenrola-se na Escola Naval                   de comendador da “Ordem de
do curso de Teatro no Conser-              e na “Sagres”, tendo como personagens                   Sant’Iago da Espada”. Esta últi-
vatório Nacional, que concluiu             principais um grupo de cadetes da “ca-                  ma atribuída em 1998, quan-
com a classificação de 18 va-              marata 21”: jovens de diversas origens,                 do fazia a peça “O Rei Lear”,
lores, e o abraçar de uma car-             divididos nas encruzilhadas da vida, en-                de William Shakespeare, no
reira profissional que começou             tre paixões e contingências, unidos no                  Teatro Nacional D. Maria II, e
no Teatro Nacional D. Maria II,            espírito de corpo e na fraternidade dos                 imposta pelo Presidente Jorge
dirigido então pela batuta de              200 irmãos que são os alunos da Escola                  Sampaio, em acto público que
Amélia Rey Colaço.                                                                                 teve lugar no final de um es-
                                                                                                   pectáculo. Em 2010, receberia
  Desde então, a sua voz e                                                                         ainda o grau de oficial desta
presença foi uma constante na vida dos                                                             mesma ordem, que se destina
portugueses que cedo se habituaram a                                                               a premiar o mérito científico
admirá-lo nas salas de espectáculo, no                                                  literário e artístico.
teatro radiofónico, no cinema e, mais                                                    Esta Escola viu-o há 65 anos como o
tarde, também na televisão, onde ainda                                                  cadete António Jacinto, de “Eram Du-
hoje é uma presença constante e uma                                                     zentos Irmãos”, mas essa memória foi
referência de excelente artista.                                                        constantemente avivada pelos êxitos
                                                                                        que foi acumulando. A homenagem
  Da companhia de Amélia Rey                                                            que hoje lhe prestamos é um tributo de
Colaço e Robles Monteiro, no                                                                       reconhecimento do valor ar-
Teatro Nacional, passou para                                                                       tístico de um grande actor, a
o Teatro Nacional Popular,                                                                         que é preciso juntar e realçar
dirigido por Ribeirinho e, cin-                                                                    a militância cívica exemplar,
co anos depois, para o Teatro                                                                      sobretudo virada para a cultu-
Monumental, do empresário                                                                          ra e para as grandes questões
Vasco Morgado. Naquelas dé-                                                                        sociais do nosso tempo, não
cadas de cinquenta e sessenta,                                                                     hesitando em colocar o seu
do passado século, o teatro                                                                        prestígio, enquanto figura pú-
era, provavelmente, a forma de                                                                     blica, ao lado das mais nobres
expressão artística preferida do                                                                   causas. É a grandeza de quem,
público português, permitindo                                                                      apesar de tudo, se define como
a existência de várias com-                                                                        um homem simples. Tão sim-
panhias de teatro comercial,                                                                       ples como só o conseguem ser
que ocupavam muitas salas                                                                          as figuras de carácter singular
de espectáculo na capital e na                                                                     e enorme generosidade. Um
cidade do Porto, realizando di-                                                                    grande artista, um grande ho-
gressões por todo o país, com                                                                      mem de cultura e um exem-
grande êxito. Sem a omnipresença da te-                                                            plo de vida guiada pelo talant
levisão, que hoje temos, a atracção pelo                                                de bien faire, que foi lema do Infante
espectáculo cénico, enquanto lugar pri-                                                 D. Henrique e nos inspira a todos nós.
vilegiado de sonho e fantasia, era muito                                                 Bem-haja senhor Ruy de Carvalho.
intensa num público que distinguia bem
os espaços do teatro e do cinema.                                                                             J. Semedo de Matos
                                                                                                                              CFR FZ
  Ruy de Carvalho conseguiu assim
construir uma carreira que passou pelo                                                  N.R.
teatro comercial, destinado ao grande                                                   O autor não adota o novo acordo ortográfico.

                                                                                        REVISTA DA ARMADA • AGOSTO 2013 23
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