Page 32 - Revista da Armada
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NOVAS HISTÓRIAS DA BOTICA (27)

   O Velho de Sta. Clara

 (…) Sentia-me muito indefeso e muito só. E     do antigo Colégio de S. Francisco Xavier                medos e esperanças…em tudo semelhantes
sem vontade, agora de chamar por ninguém        (também conhecido como Hospício dos Je-                 aos nossos, só que de outro tempo.
porque (sabia-o) há travessias que só se po-    suítas ao Paraíso), prolongando-se as obras
dem efectuar sozinho, sem ajudas, ainda         até 1806 (data em que foi inaugurado).                   Esse tempo fará sempre parte da memória
que correndo riscos de ir a pique numa des-     O seu edifício, na altura bastante moder-               coletiva do país que somos e particularmen-
sas madrugadas de insónia que nos tornam        no, foi  Fparborjie1ta. do  pelo  arquiteto  Francisco  te deve fazer parte da memória dos mari-
Pedro e Inês em cripta de Alcobaça, jacentes    Xavier                                                  nheiros da Armada de todas as idades e de
de pedra até ao fim do mundo (…)                Senti-me perdido, da mesma forma que o                  todos os tempos…
                                                excerto acima descreve, jacente dentro de
 In Memória de Elefante de António Lobo         mim próprio, esquecido de sentimentos.                   Se quiser acreditar, o ousado leitor, pare-
                                                Esta sensação foi ainda mais agravada, por-             ceu-me que uma parte da alma de Portugal,
VAntunes,1979                                                                                           da nossa alma estava posta à venda. Lem-
        i a notícia. Estava na página           que, aparentemente, na referida legislação              brei-me que noutros países, com histórias
        da intranet da Marinha. Tudo            se colocam também à venda outras estrutu-
        certinho, com o referido des-           ras hospitalares, de outros ramos, algumas                  mais recentes, casas com cerca de uns
pacho…tudo certinho…Fiquei para-                também antigas, mas outras muito mais                       meros 100 anos, são consideradas mo-
do, ali, por momentos, no espaço e              recentes…sem demonstrar a devida reve-                      numentos nacionais e referências cultu-
no tempo. Não parecia real…Dizia                rência pela antiguidade secular do nosso                    rais. Fiquei “jacente na pedra”, quando
a notícia que o Hospital da Marinha             velhinho. Este parece tratado como uma                      me surgiu que um povo sem memória,
estava à venda…                                 vulgar propriedade, uma parcela de terreno,                 perdeu a parte mais importante do seu
                                                anónima…                                                    todo…perdeu a sua identidade…
 Não parecia real. O Velho Lobo do
Mar, o Velho de Sta. Clara na minha              Ora eu já ao longo de muitos escritos re-                    Acredito ainda, algumas horas depois
cabeça e (estou certo), na cabeça de            velei que as pedras têm alma. A alma dos                    da notícia, que apesar de todas as “Wall
muitos, pareceria – depois de tantos            muitos seres humanos que por lá passaram.                   Street” do mundo, apesar dos mercados
serviços prestados à nação – destinado ao       Muitas vezes, por lá senti as vozes de doen-                bolsistas, apesar da crise, parece estra-
Serviço Público. Admitia-se que fosse usa-      tes de outros tempos, tratados por Físicos an-              nho fazer “time sharing” com a histó-
do no domínio público, como hospital de         tigos, de barba e bigode. Lembro as suas do-                ria…Afigura-se-me que se há súbita ne-
cuidados paliativos, por qualquer institui-     res e os seus padecimentos. Os seus anseios,            cessidade de dinheiro, haveriam em Lisboa
ção, que passasse a museu, enfim que per-                                                               outras propriedades, admite-se com menos
manecesse nosso – português…                                                                            carisma do que o Velho de Sta. Clara, alie-
                                                                                                        nado assim de forma tão pouco honrada…
 Afinal o Velho de Sta. Clara é um dos                                                                   Certamente hoje vou sonhar com o Velho
mais antigos hospitais de Portugal, que                                                                 de Sta. Clara. Nesse sonho espero encontrar-
até há alguns meses se mantinha ainda                                                                   -me um dia junto à Feira da Ladra, com um
em (moderno) funcionamento. Foi criado,                                                                 dos meus filhos e dizer. Trabalhei aqui. Era
como Hospital Real da Marinha, pelo Al-                                                                 o Hospital da Marinha, tem muita história.
vará com força de Lei do Príncipe Regente                                                               Serve agora o País de outra forma…
D. João de 27 de setembro de1797, sendo
secretário de Estado dos Negócios da Ma-                                                                                                          Doc
rinha e Ultramar D. Rodrigo de Sousa Cou-
tinho. O hospital foi construído no local                                                               Nota
                                                                                                        1 Informação baseada em muitos trabalhos do
                                                                                                        Almirante MN Rui Abreu, que dedicou parte da
                                                                                                        sua vida à história do Velho do Restelo.

    ASSOCIAÇÃO DE FUZILEIROSo passado dia 21 de maio, na sala                                            Discursaram depois aquelas duas individua-
                                                                                                        lidades. O Presidente da Direção agradeceu a
         da Sede da Associação de Fuzileiros                                                            presença dos convidados, especialmente a do

N(AFZ), na cidade do Barreiro, realizou-
-se a cerimónia de inauguração da figura de                                                             ALM CEMA, e reiterou o principal objetivo da
“O Fuzileiro” em alto-relevo, da autoria do                                                             Associação o apoio, de várias naturezas, aos
escultor Tolentino de Lagos e a entrega de di-                                                          sócios e em particular a todos quantos traba-
plomas de sócio honorário e de mérito.                                                                  lham ou trabalharam em benefício da nossa
Entre os numerosos convidados destaca-                                                                  Marinha. Por sua vez, o ALM CEMA salientou
vam-se o CEMA, ALM Saldanha Lopes, o                                                                    que desde os tempos de Guerra de África,
CN, VALM Montenegro, e os Presidentes da                                                                embarcado em águas de Moçambique, muito
Câmara Municipal e da Junta de Freguesia do                                                             apreciou à meritória ação dos Fuzileiros em
Barreiro, Senhores Carlos de Carvalho e Raul                                                            operações e a eles ficou ligado.
Malacão, respetivamente.                                                                                Seguiu-se um jantar volante que foi acom-
A obra de arte foi descerrada pelo Almirante                                                            panhado por música ao vivo e a declamação
CEMA acompanhado pelo Presidente da Dire-                                                               de poemas pela sua autora, a Drª. Laurinda
ção da AFZ, CMG Lhano Preto, após o que foi                                                             Madeira.
feita a entrega solene dos diplomas.

                                                                                                        REVISTA DA ARMADA • AGOSTO 2013 31
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