Page 18 - Revista da Armada
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UMA FOTOGRAFIA -

TESTEMUNHO                                        entremastros altos, gafetope e sobres).           inferior ao habitual, pois o hélice estava a rodar
                                                   Na análise à meteorologia, durante a manhã,      a ré, não havendo descarga de água sobre a
EDO COMANDANTE                                                                                      porta do leme.
     screver sobre o desfile de grandes velei-    concluíra que a única forma de sair a barra do
     ros, realizado no Tejo, em 22 de julho de    Tejo com todo o pano içado e caçado seria          De qualquer maneira, com a máquina a ré
     2012, é escrever sobre um dos momentos       com a máquina a trabalhar a ré para, por um       toda a força, o leme 20˚ a bombordo e o vento
mais emocionantes do meu período de co-           lado, fazer com que o vento aparente abrisse,     aparente acima dos limites de utilização nor-
mando da Sagres. É, por isso, um relato pesso-    evitando ficar com o "pano às costas", e por ou-  mal, foi possível mostrar toda a imponência
al, mas que constitui também um testemunho,       tro lado, diminuir a velocidade do navio (que,    da Sagres – no ano do seu cinquentenário ao
para memória futura, de um momento único e        de outra forma, seria bem superior aos 5 nós      serviço de Portugal e no porto que lhe serve
inolvidável para todos os que o vivenciaram.      estabelecidos, pela organização, como veloci-     de base – liderando um desfile de 45 grandes
                                                  dade do desfile).                                 veleiros, a que se associaram centenas de pe-
  Feita esta nota prévia, importa referir que                                                       quenas embarcações que emprestaram um
este desfile marcou o encerramento da pas-         De qualquer maneira, exatamente à passa-         colorido inigualável ao rio Tejo.
sagem dos grandes veleiros por Lisboa, no         gem por debaixo da ponte, foi dada a ordem
âmbito das “Tall Ships Races”. A estadia dos      para içar e caçar todo o pano “de tacada” e        Testemunha privilegiada desse momento foi
grandes veleiros na zona de Santa Apolónia,       todo o velame se abriu em poucos segundos         o Presidente da República, que viajava num
entre 19 e 22 de julho, tinha sido um verda-      – com a Sagres a exibir toda a beleza das suas    avião de regresso de uma visita de Estado ao
deiro sucesso. Contudo, o ponto alto seria,       alvas velas. Rapidamente, o navio começou a       estrangeiro, em aproximação ao aeroporto da
como é habitual, a sail parade no Tejo, na        ganhar velocidade, adornando bastante para        Portela, tendo sobrevoado a Sagres no exato
tarde de domingo, dia 22 de julho. Como tem       bombordo. Tendo bem presentes as implica-         momento do desfile.
sido comum sempre que os tall ships vêm a         ções correspondentes, mandei colocar a má-
Lisboa, a Sagres foi escolhida para liderar esse  quina a ré. Contudo o vento foi aumentando         Contudo, só no dia seguinte toda a guarnição
desfile náutico, que se iniciaria com a sua       de intensidade, para quase 30 nós, obrigando      se daria conta do espetáculo proporcionado
passagem sob a ponte 25 de abril.                 a meter a máquina a ré meia força e, depois, a    pela sua barca. Nesse dia, já em plena regata
                                                  ré toda a força, de forma a evitar que o pano     para Cádiz, recebi, da APORVELA (organiza-
  A bordo, tudo tinha sido preparado para         ficasse “às costas”.                              dora do evento), a fotografia aérea que serve de
que o navio pudesse içar e caçar todo o pano                                                        mote a este testemunho. Divulguei-a interna-
"de tacada": as vergas estavam todas içadas e      Nessa altura, a Sagres navegava com um           mente e, ainda nesse dia, quase todos os PC’s
corretamente mareadas, sendo que o pessoal        adornamento de quase 15˚, perfeitamente           existentes no navio já tinham essa fotografia
(guarnição e cadetes) tinha as adriças e as es-   visível nalgumas fotografias que então foram      como wallpaper. Parecia um vírus a propagar-se!
cotas todas na mão.                               tiradas. Como era esperado, as velas da meze-
                                                  na dificultavam bastante a ação do leme, na        De facto, o cenário proporcionado pela
  Neste tipo de desfiles, procura-se sempre içar  medida em que forçavam o navio a orçar, facto     frente ribeirinha de Lisboa, com o estuário do
e caçar todo o pano possível, de forma a brin-    que obrigou a meter o "leme de encontro" para     Tejo pejado de embarcações, constituiu um
dar os espetadores com imagens dos navios         que este seguisse no rumo desejado. Nessas        complemento paisagístico de excelência para
a navegarem à vela em toda a sua plenitude.       condições, o desfile foi todo feito com 20˚ de    a Sagres. Foi, assim, um daqueles momentos
Porém, naquele dia, o vento soprava de N/NW       leme a bombordo, o que significava que, se        felizes em que tudo se conjugou para permitir
com cerca de 20 nós na zona da ponte, refres-     fosse necessário guinar para bombordo, a ma-      uma fotografia magnífica, que desde logo se
cando para quase 30 nós mais para jusante, o      nobra revelar-se-ia extremamente difícil, pois    tornou num dos ícones da Sagres!
que comprometia a saída da barra do porto de      já só era possível meter mais 5˚ de leme a esse
Lisboa com o pano redondo, dada a dificulda-      bordo. Acresce ainda que o efeito do leme era                             N. Sardinha Monteiro
de da Sagres em bolinar com o vento aparente                                                                                                  CFR
em marcações inferiores a 60˚.

  De facto, para um navio que arma em bar-
ca, como a Sagres, o vento estava nos limites,
tanto em direção (por estar na fronteira da orça
exequível), como em velocidade (pois com
ventos acima dos 20 nós é desaconselhável,
por motivos de segurança, a utilização das
velas que compõem a “crista” do navio: giba,

18 NOVEMBRO 2013 • REVISTA DA ARMADA
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