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REVISTA DA ARMADA | 518
RECORDANDO O NAVIO BALIZADOR
m 9 de Março último, na Base Naval de Lisboa, com
Ea cerimónia de Entrega de Comando e do arriar dos
Distintivos Nacionais, o NRP Schultz Xavier terminou o
seu serviço como navio da Armada.
Relembro Junho de 1976, quando assumi o coman-
do do Schultz, aumentado ao efectivo dos navios da
Armada em 1972 mas já então prestigiado devido às
suas complexas e ousadas missões, cumpridas com
sucesso, em apoio aos processos de descolonização .
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O navio, ao longo dos seus 45 anos de bons serviços,
teve 19 Comandantes e, embora classificado como
navio balizador, efectuou, além de balizagem, muitos
outros tipos de missões.
Foi o meu segundo comando no mar e logo em Julho
de 76 larguei para os Açores, na habitual missão de
apoio à farolagem do arquipélago que incluía, entre
outras tarefas, o abastecimento de garrafas de aceti-
leno dos faróis distribuídas pelas nove ilhas açorianas
e o principal ilhéu das Formigas, onde me apercebi de
quanto tinha sido árdua a construção do farolim do
ilhéu realizado pela Marinha em 1947 .
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Das outras missões, lembro a manutenção da bali-
zagem dos principais portos do Continente, com des-
taque para os de Aveiro, Lisboa, Setúbal e da Ria Formosa no Ansiada pela guarnição era a ida, em Agosto, às Festas de
Algarve, fainas demoradas que tinham de ter um planeamento Verão em Arcachon, famosa praia francesa, na Biscaia, onde o
cuidadoso, muitas vezes alterado devido a condições atmosféri- Schultz, durante anos, representou muito condignamente a Ma-
cas adversas. rinha Portuguesa.
Em Junho de 1977, foi o apoio à instalação dos primeiros faro- Em Outubro de 1978 entreguei o comando do navio. Tinham
lins nas Selvagens , missão em que se teve de resolver diversas sido quase dois anos e meio em que me senti plenamente reali-
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questões desde a segurança do navio num precário fundeadou- zado como marinheiro e grato de ter tido uma óptima e dedicada
ro, só de nome pois o Schultz teve de ficar amarrado a uma poita guarnição. Vários foram depois os meus comandos no mar e em
improvisada na ocasião, até aos relacionados com a logística. Re- terra, mas sempre acompanhei com muito interesse a actividade
cursos das Selvagens… só cagarras! Deve ter sido o único navio da operacional do meu antigo e saudoso navio balizador.
Armada que, nos tempos modernos, embarcou um burro para o Continuou o Schultz a desempenhar com sucesso as diversas
transporte de material em terra. tarefas que lhe foram sendo atribuídas, tendo passado nos últi-
O reboque do ex-draga-minas Horta, de Lisboa ao Funchal, foi mos anos a cumprir mais uma nova missão, a de fiscalização da
outra missão. Desta recordo o magnífico jantar (autêntico banque- costa nas áreas do Continente e do arquipélago da Madeira.
te), num famoso restaurante da Ilha, oferecido a toda a guarnição Termino, fazendo minhas as palavras proferidas pelo Comodo-
do Schultz pela empresa proprietária do antigo draga-minas. ro Nobre de Sousa, que presidiu à cerimónia atrás citada, quan-
Um dia, quando do regresso de uma missão nos Açores, com o do afirmou que o acto de arriar os Distintivos Nacionais era o
convés atulhado de material, inclusive uma viatura, o navio, sob momento em que, mais do que o fim de um ciclo, se assinalará
valente nortada, e após os rebocadores de Sines terem falhado o início de um novo, o de perpetuação do respeito pelo legado
várias tentativas, “safou” uma lancha de desembarque grande intemporal da alma do “Schultz”.
(LDG) que participava num exercício com fuzileiros e tinha ficado
encalhada na praia da Bordeira, situada no parque natural do Su- José Luís Leiria Pinto
doeste Alentejano e Costa Vicentina. CALM
Trago à memória outra ocasião em que se tornou necessário N.R. O autor não adota o novo acordo ortográfico.
dar apoio à então Base Aérea de S. Jacinto, visto a lancha de de-
sembarque média (LDM), que lhe estava atribuída, ter sofrido
um acidente. À chegada, após fundear e não ter avistado a em- Notas
barcação, solicitei que me indicassem a sua localização e recebi 1 “Regresso de África. Uma Missão Humanitária” RA nº 374/ABR2004
a informação de que estava no cais. Facto estranho, pois este en- “Uma missão de reboque. A Incrível Armada” RA nº 380/NOV2004
“Retorno de África - 1975. Uma Missão de Apoio”
RA nº 483/MAR2014
contrava-se vazio. Esclareceram-me que efectivamente a lancha 2 “Os Açores Ainda Desconhecidos” RA nº 087/DEZ1978
estava no cais mas… no fundo. A operação, inédita para o navio, 3 “Operação Cagarra Luminosa” RA nº 075/DEZ1977
foi cumprida e a LDM ficou atracada no cais mas… à superfície.
MAIO 2017 19