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REVISTA DA ARMADA | 539
VIGIA DA HISTÓRIA 108
A GUERRA E
OS INTERESSES
ECONÓMICOS
o início do séc. XIX, a principal, e praticamente única, fonte de receita
Nda colónia de Moçambique era a que resultava do tráfico de escravos,
em especial os destinados às ilhas francesas no Oceano Índico.
Com o início da guerra com os franceses a suspensão de tal actividade,
segundo as autoridades daquela colónia, iria conduzi-la à ruína, razão
pela qual, apesar da situação de guerra, tal actividade se foi mantendo,
muito a contragosto dos ingleses que, não conseguindo entender tal pro-
cedimento, apresentavam frequentes reclamações.
O irmão do Governador da colónia, que, em Março de 1808, se encon-
trava nas ilhas Maurícias, garantiu às respectivas autoridades que o
irmão, apesar da situação de guerra declarada entre as duas nações,
estava na disposição de estabelecer um acordo que permitiria a manu-
tenção das relações comerciais (leia-se tráfico de escravos) por forma a
que os navios franceses pudessem frequentar os portos de Moçambique
e os navios portugueses os das ilhas francesas.
Para que tal se verificasse deveriam os navios franceses, à aproximação
dos portos portugueses, içar a bandeira portuguesa enquanto os navios
portugueses arvorariam a bandeira francesa à aproximação dos portos
franceses. A oposição dos ingleses parece ter estado na origem da não
concretização de tal acordo, levando a que os navios dos dois países
entrassem em conflito.
No decurso desse conflito ocorreu um episódio que, pela sua singulari-
dade, entendo ser merecedor de divulgação.
Deu-se o caso que um português, de nome António Miguel, e um
natural de Manila casado com uma portuguesa, tendo sido aprisiona-
dos pelos franceses, foram obrigados a combater embarcados no navio
francês Aurora, onde já se encontrava aprisionado um outro português,
de que não ficou registado o nome, ele também obrigado a combater.
No decurso de uma viagem, os três, aproveitando uma altura propícia,
atacaram os tripulantes franceses, cujo número era bastante reduzido,
e puseram em fuga os lascares que constituíam o grosso da tripulação,
ficando assim senhores do navio que conduziram para Moçambique.
Cmdt. E. Gomes
Fonte: Mozambique and the Napoleonic War, por Paul Mazey
N.R. O autor não adota o novo acordo ortográfico
ABRIL 2019 27
DR