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REVISTA DA ARMADA | 544


              ESTÓRIAS                                                                                          52



              O EMBARQUE DE UM “INTRUSO”


              1ª Parte – A ação “SAR”































                 ive o privilégio de viver uma semana a bordo do patrulha   águas, no conƟ nente e nas regiões autónomas, e garanƟ r que a
              TFigueira da Foz, a convite do ALM Silva Ribeiro, então CEMA/  nossa vasta e rica ZEE não seja cobiçada por terceiros. Esta classe de
              AMN e atual CEMGFA. Seria a minha terceira viagem numa unidade   navios subsƟ tui, com vantagem, as corvetas e os patrulhas da classe
              da nossa Marinha e logo a mais longa delas. Em fevereiro de 1997   Cacine, vinte unidades construídas nos anos sessenta e setenta. No
              mergulhei durante quatro horas no oceano ao largo de Sesimbra, a   decurso da viagem à volta do mundo que realizei durante três meses
              bordo do Albacora (ocasião para apreciar as condições duras de vida   e meio, pude apreciar em setembro de 2015, o patrulha Cacine no
              a bordo de um submarino e dos caracterísƟ cos cheiros a comida,   porto do Funchal.
              óleo e suor), sendo que o almoço, na segunda ronda, foi dos melho-  No dia seguinte, depois de um almoço à marinheiro, deixámos para
              res peƟ scos que saboreei. Em maio de 2016, a bordo da fragata Bar-  trás a Figueira – tudo pode acontecer nos próximos dias. Na zona das
              tolomeu Dias, fomos saudar, à entrada da barra, a fragata Vasco da   Berlengas faz-se senƟ r o efeito da ondulação mas, para marinheiros
              Gama, procedente do Golfo da Guiné.                 experimentados nos domínios de Neptuno, isso são apenas carinhos.
               Curioso o facto de embarcar, num fi m de tarde ameno de verão, no   Ao terceiro dia passamos ao largo da sempre bela Sesimbra e
              porto que tem o nome do patrulha. Desembarcaria no porto onde   rumamos a Tróia. São visíveis golfi nhos que, saltando, parecem que-
              foi construído – Viana do Castelo. Vicissitudes várias levaram a que   rer saudar todos a bordo. Sinal de que as águas azuis do Sado volta-
              o estaleiro local – que, nos anos 60 e 70, construiu muitos navios   ram a ser puras?
              para a Marinha Mercante e para a Armada, casos da fragata Maga-  O descanso foi curto, pois recebemos um pedido de socorro pro-
              lhães Correia, dos patrulhas da classe Maio, de várias lanchas de fi s-  veniente do pequeno pesqueiro Calysto – à deriva perto da Nazaré,
              calização e do petroleiro S. Gabriel – apenas entregasse o navio, o   após um incêndio na casa das máquinas. Lá fomos rasgando as
              segundo navio da classe Viana do Castelo, em 2013.  ondas a alta velocidade, pois uma das mais nobres tarefas dos
               Trata-se de uma unidade com um deslocamento de 1850 tonela-  homens do botão de âncora é o salvamento maríƟ mo. Entretanto,
              das - idênƟ co ao de um destroyer dos anos 40 ou de uma fragata dos   fomos informados que o rebocador Sam Brás, enviado em apoio do
              anos 50/60 – que dispõe de uma plataforma para um helicóptero   pesqueiro a parƟ r de Peniche, anda também à deriva devido a uma
              ligeiro; pode aƟ ngir os 21 nós de velocidade. A sua guarnição é com-  avaria elétrica. Um duplo azar para os homens do mar.
              posta por seis ofi ciais, nove sargentos e vinte seis praças. À data, dez   Felizmente, tudo se resolveu a contento; às 06h30 chegámos ao
              desses elementos eram mulheres (um ofi cial, três sargentos e seis   local, onde já se encontrava um segundo rebocador, e demos o
              praças) – 23,8% do total, sinal de que as nossas mulheres gostam de   necessário auxílio às duas embarcações. Às 07h00 já retemperáva-
              servir na Armada. Adicionalmente, estavam embarcados dois mer-  mos forças à mesa, peƟ scando ovos mexidos, queijo e pão torrado.
              gulhadores e quatro grumetes em instrução.          O “intruso” estava cansado – a noite fora agitada e as emoções ricas
               A receber-me, com uma simpaƟ a extrema, o Comandante, CTEN   e graƟ fi cantes – pelo que recolheu ao camarote atribuído. A Mari-
              Guardado Neto, que logo se dispôs a orientar este “intruso” que   nha Ɵ nha marcado presença e, eventualmente, seis homens do mar
              queria conviver com todo o pessoal embarcado. Neste primeiro dia   não Ɵ veram um fi m dramáƟ co.
              a bordo, fui ainda apresentado a cinco ofi ciais – a 1TEN Ana Trin-
              dade e os GMAR Lico, Morais, Rosa e Viegas. O Figueira da Foz tem               Manuel José Rafael de Jesus Alves
              por missão principal zelar pela vigilância e integridade das nossas        Procurador da República Adjunto (jubilado)


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