Page 269 - Revista da Armada
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A sereia do porto de Copenhaga.
































         pIes, quão natural e simples era o marinheiro s"eu pro-
         tagonista.
            Haviam passsado dez meses de viagem. A barca
         «Sagres!)  estava prestes a  terminar a  sua primeira
         viagem de circum-navegação ao serviço desta velha
         casa Lusitana.  Agora, perante nós -  eu era um dos
         elementos da guarnição -  estava o magnifico porto
         de Marselha.
            Contudo, mais um porto, após tanto tempo de via-
         gem, quase s6 servia para aumentar as saudades da
         sua santa ternnha a tantos e tantos marinheiros que
         se  lamuriavam  e  queixavam  de  que  a  viagem  não
         mais tinha fim.
            Para muitos outros, no entanto, um porto a  mais
         era mais uma oportunidade de conhecer novas terras,
         novos costumes, nova gente. E este, o porto de Mar-
         selha, se assim se pode dizer, era uma coisa já aqui
         à nossa beira, a paredes meias com a nossa casa
            Porém,  verdade se diga, para uns e  para outros,   Até queenfim,Ja veJo a filha do faroleiro ..
         melhor dito, para todos, o termo da viagem era ansio-
         samente  desejado.  O  saudosismo,  a  incógnita  de
                                                             terra, e o desabafo de quem desperta para uma nova
         como irão as coisas por lá,  a  vontade de abraçar os   vida -: I< Até que enfim, já vejo a filha do faroleiro)).
         pais, a  mulher, os filhos, há tanto tempo distantes e   Era  natural que um ou outro menos aguçado na
         ausentes, faziam com que um ou outro elemento, um   perspicácia se não  apercebesse do sentido daquele
         ou outro murmurio nostálgico se fizesse ouvir de proa
                                                             profunda desabafo.
         à popa.
                                                                Outros, sim, de tal maneira se aperceberam que,
            Eu contemplava, aqui e além, essas cenas de com-  dias após, já defronte do farol do Bugio gracejaram:
         paixão, esse carpir de mágoas abafadas.
                                                             «também já quase vejo  a  filha  do faroleiro!!.  E,  mo-
            Se assim não fosse,  não teria eu pasmado com a
                                                             mentos após,  no cais da Marinha,  lá estavam as se-
         cena a que me vou reportar.
                                                             reias de terra, as amadas esposas, aguardando o en-
            A quilha do navio rasgava, calmamente, as águas
                                                             laçar de braços do marido que voltava.
         bonançosas. Uma velha muralha, suporte de medie-
                                                                Essas, sim, as verdadeiras ninfas e sereias.
         val  fortaleza,  avolumava-se  à  nossa  visão.  Alguma
         gente no cais.  E lá ao fundo, na ponte do molhe, um
         pequeno farol se erguia como presença de segurança
         para quem,  de  noite,  demanda aquele  maravilhoso
         porto.  A  nossa entrada fazia-se em pleno dia,  pelas                              Delmar Barreiros,
         dez horas matinais. E  vai dai,  sem peias nem entra-                        capelão graduado em cap.·frag.
         ves, sem artificialismos nem protocolos, faz-se ouvir
         a voz de um marinheiro -  braços erguidos, olhos em   ••••••••••••••••••••••••••••••

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