Page 225 - Revista da Armada
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De  . PLATERO Y yo.                De . ANTOLOGIA POÉTICA.  De . mSTÓRIAS
        (1907-1916)                                                          Y CUENTOS.
                                             o  postar,  languidamente       (.mSTÓRlAS  E  CONTOS.)
                                             com o  cajado nos ombros,
                                             olha,  contando,  os pimheiros,
        PLATERO
                                             do horizonte  brumoso;          EL  VIElECtTO  PORTUGUtS
           Pio/era  i  pequeno,  peludo.  suave;  tao   e o rebanho sonolento   (O  VELHINHO PORTUGUtS)
        macio por fora,  que se diria  todo de  algo-  levanta  nuvens de pó,   (NOVA  IORQUE)
        doo.  que ndo um ossos. Apenas os espelhos   e chora  com seus  chocalhos
        de azeviche de StW olJws slJo duros como dois   debaixo da  lUiJ  de  ouro.   Encontraram-no  sem  untidos  na  rua
        ucorlH'tlhos de  vidro negro.        A  aldeia do  l'ale eSltl       imensa, negra lodo, cam a esc/erótica ama·
           Deixo-c solto, e de vai ali  ao prado. e   quieta  em fumo  branco.  Tudo   reÚl, e levaram·no ao hospital. Ningubn pôde
        acarida sua~'emenu com o focinho. mal as   a  que era alegre ao sol,  sonho   dizer nada dele,  ~o lel'ava siMI nem docu-
        roçOlldo. as j1or<,inhas rosas, celestes e ama-  nllo sei  que amores chorosos.   mentos. Desorientados, os médicas decidiram
        relas ..  Chamo-o docemente:  «Plarero? .. , e   Já  rulQ  se  vi o  rio escuro   abri-lo para  ver  se  encontral'am  a  causa.
                                             perdido  em si mesmo.  Só
        e/e vl!m para mim com um trotn.inho alegre                              -  Mas  1'00 abri-lo  sem  saber porquê?
        que pareu que se ri,  em nt10 sei que tspe-  na  cega paz  imenso,      -  Pois  por isso  mesmo,  porque  nllo o
        rançado ideal ..                     se sente que tem fundo.         sabemos.
           Com  ludo  o  que  lhe  dou.  Gosla  das   Flutua o fumo branco.  O  vtJle   De  modo  que  o  abriram,  e  como  nllo
        laranjas  mondarlMs.  das  uvas  moscotbs,   fica  mais sozinho e  triste.   encontraram nada do que buscavam, toma-
        Iodas de dmbar, dosfigos cor de amora, com   Os chocalhos choram  mais.   ram  a fechl'l-Io.
        a crista!ifIQ  gota de  mel...       debaixo da  lua de ouro.           O pobra.ito ali ficou na sua cama,  com
           t ftnJO e mimoso como um menino. como                             a  alma mal sustida  com  umas paÚlvras de
        uma menina ..... mas fone e seco por defllro.   CRIATURA AFORTUNADA   médico apressado e frio.
        como se/asse de pedra. Quando passo mon-  CtJntando  vais,  rindo  peÚl  dgua,   No  oulro dia,  à  sesta,  ~o parava  de
         tado ntle, aos domingos, pelas últimas rue-  pelo ar assobiando  l'ais,  rindo,   queixar-se e de  mendigar debilmente:
         las da aldeia, os homens do campo, I't!stidos   em  ronda azul e ouro, preta  e  I'erde,   - Água,  dgua,  dgua,
        de  limpo  e  vagarosos,  ficam  a  oIM-/o:   ditoso de  passar e  regressar   Pareciam  000 entender o  que queria.
           - Tem  aço ..                     entre o vermelho primeiro brotar de Abril   - Por Deus,  um pouco de água  a  este
           Tem aço.  Aço e prata de lua, 00 mesmo   forma  distinla,  de  inStantlineas   desgraçado.
         tempo.                              igualdades de  luz.,  vida,  cor,   A enfemleira disse que a dgua tinha pas-
                                             connosco,  margens inflamados!
                                                                             sado jd, tU onze,  que era  a hora  de dá-la,
                                             Que alegre és lu,  ser
                                             com  que alegria  universal eterna!   e ele nlJo a tinho ,m/ido.  Tanto disse, quepor
         LA.  CAUE DE LA.  RIBERA            Rompes feliz.  o ondular do ar,   fim lhe trouxeram um capo, e dei a dgua ao
         (A  RUA  DA  RIBEIRA)               vogas contrdn'o  00 ondular da  dgua!   velhinho que ,depois de bebero copo, sorriu
                                                                             como um santo,
                                             NlIo  tens que comer nem que dormir?
           Aqui, nesta casa grande, hoje quartel da   Toda  a primal'era  é o teu lugar?   Perguntei-lhe  se  nllo  'inha famflia,  ou
         Guarda  civil,  nasci  eu,  Platero.  Como em   O  I'erde todo,  o azul todo,   amigos,  ou  conhecidos,  se  quena  que  lhe
                                                                             escrevesse uma carta para alguém em Por-
        menino eu  gastava e me parecia linda esta   O florescente  todo  é teu?
        pobre I'orando «mudejor,. do mestre Garfia,   NiJo  há lemor na  lua  glória;   tugal,  ou  ali,  110  Amén"ca ,  0//  fosse  ollde
                                                                             fosse,
        com  as suas estrelas  de  cristais  de  cores!   O teu destino  é  voltar,  voltar,  voltar,
                                                                                Disse-me:
         Olha pela cancela, Platero: os Jilazes, bron-  em  ronda prata e  verde,  azul e ouro,
                                                                                -  NlJo,  000,  Para  quê?  Sim,  tenho
        cos  e liIazes.  e as  campainhas azuis  conti-  por uma  eternidade de eternidades!   famflia, /fUIS para quê? Eu  vou morrer ama-
        nuam o enfeitar. penduradas,  a conceÚl de   Dd$-nos  a  m/1o,  num momento
                                                                             nM ou  depois,  de qualquer maneira.  - e
        madeiro, que o tempofa. negra, aofundodo   de Qfinidade passlvel,  de Qmor súbito,
                                                                             quase me tonwndo uma mllo - quando esti-
        p6lio.  de/fcia  da  minha  idade  primeira.   de conassOO radiante:
           PÚltero: nesta esquina da rua das Flores   e,  ao teu  contacto cdlido,   ver diante de Deus hei-de lembrar-me de si,
                                                                              que me deu dgua.
        punham-se d  tarde os marinheiros,  com os   em louca  vibraçllO de come e alma,
                                                                                NlIo  foi  omanh4  nem  depois.  Naquele
        seus  trojos  de  pano,  de  l'tlriOS  azuis,  em   ocendemo-nos de harmonia,
                                                                             mesmo dia a alma brancafai-se do corpa ene-
         regos,  como o campo de  OUlUbro.  Lembro-  nos esquecemos, novos, da mesma coisa,   grecido pelo caminho alto da primal'era, da
         -me que me pareciam imensos; que entre as   luziamos,  um instante, alegres de ouro.
                                                                              luz.,  cominho do  Deus  da  saúde e  da  pa~.
        suas pernas,  abertos pelo costume do  mar,   Parece  que também  vamos ser
         eu I'ia, ali em baixo, o rio, com as suas lislas   pem eces  como tu,
        paralelas  de  tlgua  e  de  1a.,lria,  brilhantes   que vtJmos  l'OOr do  mar ao monte,
        aquelas, secos estas e amarelas: com IUn bote   que  l'OmoS  saltar do c/u para o  mar,
                                                                              EL NINO EN EL  MAR
         lento 1/0 encanto do outro braço do rio; com   que  I"amOS  voltar,  voltar,  voltar,
                                                                              (O  MENINO NO  MAR)
        as  l'Íolentas  manchas coloridos no céu  do   por uma  etemidade de  etemidMes!
        ptNnte ... Depois  o  meu pai foi para a  RUiJ   E contamos,  rimos pelo ar,
        NovtJ, porque os marinheiros andOl'am sem-  peÚl  dgua rimas  e assobiamos!   Pelas tardes de Outona, ao sol quente e
        pre de MI'Olho,  porque  os  miúdos quebra-  Mas lU  000 te  tenS  que esquecer,   gosloso da aldeia em I'indimos,  as mulheres
         vam  Iodas as noires as lanternas do sagullo   tu  és presença  casual perpétua,   sentQm-se  o coser às portas, dOllde  se I'ê a
         e a sineta, e porque M  esquina fazia sempre   és a  criatura afortunada,   ribeira e, sobre as Angustias, o traço brilhan-
        muito  I'ento ..                     o mágico ser s6zinho,  o ser desperto,   te do mar.  A pobre mIJe, às vezes deixa a sua
           Do miradouro  vê-se o mar.  E jamais se   o adorado pelo calor e pela graça,   costura  e fica-se  extasiada  na  ocaso,  totla
        opogartl da minha memória aquela noite em   o  livre,  o embriagame  roubador,   transfigurada com a sua beleza e Q sua luz..
         que nos lel'aram ftl acima, a todos os meni-  que em ronda azul e ouro, prata e l'erd4   E de  repente,  grilo:
         nas, paro  I~r aquele barco inglb que eSlal'O   l'ais  rindo,  assobiando pelo ar,   - Olho que bonito eSld o meu menino,
        a arder na barra ...                 pela dgua  cantando  I'ais,  rindo!   dourado e  rindo,
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