Page 341 - Revista da Armada
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vesse tempo para  descansar ou limpar o barco que,   paquete chegou á  fala,  pela T.S.F. , com o vapor «Por-
       indistintamente, servia para transporte de munições,   tugalll que regressava de Africa com oficiais e solda-
       de  gado,  de  homens,  ou,  ainda,  de  navio-hospital.   dos  em  licença  de  campanha.  Diáriamente  os  dois
           De Lourenço Marques para Madagascar e  daqui    barcos foram  trocando as posições e,  quando o  «Ma-
       para  Bordéus,  carregado com  oito mil toneladas  de   chicoll demandava o p6rto das Canárias, o «Portugal»
       conservas para abastecimento das tropas francesas,   navegava a  quarenta e cinco milhas de distáncia, na
       o  ((Machicoll continuava a sua missão e os marinhei-  sua  esteira.
       ros  portugueses  cumpriam  galhardamente  o  seu       No dia 13 de Novembro de 19170 ((diário de bordo»
       dever. Se até então as viagens tinham sido diticeis e   registava  que,  por estibordo, se tinham avistado os
       perigosas, por motivo dos carregamentos e natureza   faróis das ilhas Fuenteventura e Lanzarote, e por bom-
       das  missões,  na  nova  rota  que  lhe  f6ra  traçada,  o   bordo o da Gran Canária.  O mar apresentava-se com
       ((Machico» tinha que contar com um perigo que ofus-  vaga grossa  de nordeste e  o  tempo era  de pesados
       cava todos os outros: - o dos submarinos alemães que   aguaceiros do mesmo quadrante. Quando rompeu a
       então começavam a  ser assinalados ao sul da  costa   manhã ainda se avistavam aquelas ilhas.
       portuguesa.                                             As nove,  já nenhuma  delas  estava  à  vista,  nem
           Foi nessa viagem que começou a parte mais trá-  qualquer outra do arquipélago das Canárias. O oficial
       gica da odisseia do ((Machico».  Em meados da Outu-  de  quarto,  vivamente  emocionado,  foi  prevenir  o
       bro safa o  vapor de Madagascar,  p6rto de Mnnjuga,   comandante  de  que,  pela  amura  de bombordo,  se
       para Bordéus, com escala por Lisboa, tocanào t,'illlbém   encontrava  uma  pequena  embarcação  parada  que
       no Cabo para meter carvão,  aguada e  frescos.      desaparecia de quando em vez no IIcolo da  vaga»,  e
       No Indico foram interceptados rádios das estações cos-  lhe parecia ser um submarino.
       teiras da África do Sul, assinalando a presença de sub-  O capitão Vieira Dionfsio subiu imediatamente à
       marinos ao largo e  ao sul da costa portugue,<;a,  mas   ponte e,  com o auxilio de um binóculo, viu que real-
       sem  que  tivesse  sido  registado  qualquflr  torpedea-  mente se tratava dum submarino e, como não se avis-
       menta.  As  mesmas  informações  foram  dadas  pelo   tava no local outra embarcação, logo calculou que não
       governador da ilha de Madagascar, quando Partiu o   se tratava de qualquer submarino aliado em exercicios.
       barco.                                              Era por conseguinte  um submersfvel inimigo.
           Na  Cidade do  Cabo foi recebida a  bordo a  infor-  Mais rápido do que seria necessário para o descre-
       mação seguinte: «Até Lisboa podem navegar à  von-   ver, marcou a embarcação inimiga por trinta graus NW
       tade,  sem  qualquer  preocupação,  devendo  fazer  a   da agulha, ao mesmo  tempo que ordenava ao timo-
       viagem pelo caminho mais CUrtOIl.  Reinava no navio   neiro que carregasse  todo  o  leme por estibordo.  O
       a alegria. O barco faria escala por Lisboa, os tripulantes   navio começou a torcer e, quando estava já com o sub-
       mitigariam saudades, alguns dias seriam concedidos   marino pela proa;  ouviram-se  dois  tiros de canhão,
       para descanso e,  para cúmulo de tanta felicidade,  os   caindo um dos projecteis por bombordo, muito próxi-
       submarinos eram um perigo de que os tripulantes mui-  mo da linha de água, indo o segundo, depois de pas-
       tas  vezes  ouviam falar ... · mas do qual começavam  a   sar por cima do tejadilho das baleeiras, cair também
       duvidar. E tinham razão para acreditar que êsse perigo   no mar. Antes, alguns tripulantes viram passar pela
       não existia. As informações colhidas em Madagascar   p6pa um torpedo, que se foi perder na imensidade das
       e confirmadas no Cabo, pelo Almirantado, eram claras   águas. Do barco alemão não contavam que o navio por-
       e perentórias: ((Pelo AtlA.ntico Sul e Atlântico Norte até   tuguês  virasse tão depressa.
       Lisboa,  nada  de  novo!...»                           Dado rebate,  todos  os  tripulantes  e  passageiros
           Passados  poucos  dias  de  excelente  viagem,  o   procuraram as baleeiras que previamente lhes tinham
        Aguarela do Mestre Alberto de Sousa (1916), existente no SincilCllto dos CapjtAes, Ofjdais Pjlotos,  Comissários e Radiotécnic;os da Marinha
        Mel"ClI1Ite.





























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