Page 83 - Revista da Armada
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doa propriedade de FajlJ de Cima.  Precisam   Os apitos de um lado e de outro nlJo cessa-  - O outro copitOo,  o·Sr.  Mano? Ele tam-
          use ano de  colher bastallfe  milho  e feijlJo   vam.  O Monte Cara obedeceu e foi rirando,   bém lhe  chamam o  relógio de milhas.
          para ajudar a construir o Sol-Nascente. Deus   I'irando,  para  estibordo,  até  se  colocor   - Pronto, estou stJ/is feito.  ntJo precisas
          é  grande!  Os pingos  batiam  nos  I'idros  da   paralelo ao casco do cargueiro, que par seu   de acrescemo r mais nada. AlençtJo ao rumo.
          ponte  de  conumdo e  rolal'am  precipitada-  turno manobrou  no sentido inverso,  isto é,   Sempre  para leste.
          mente para dar lugar a OUtros que se suce-  para  o  seu  bombordo.  Os  bojos quase  se   - Sempre paro  leste.
          diam com igual I'igor.  Sem Ii$ibilidade, tinha   roçaram quando as dois na~ios atingiram o   Sentou-se  numa  caixa  para  fomar  um
          de tomar algumas prolidinciru. A primeira   mesmo grau de aproamLnto, como se estÍl'U-  cigarro. Além do malraqueardru IllÓquinos,
          prolidincia  era  mandar  apitar  cada  dois   sem o  nO~'egar em plJrelha.  Tudo se possou   apenas o  som  rouco da  sirena  se  oUI'ia  de
          minutos.  A  ugunda era  nlJo  arredar pé de   tlJo célue. IdO inesperado, que o equiplJgem   espaço li espaço.  Oilo nós d  hora  que esti-
          junto do leme, pois a naloegaçlJo seria agora   inteira Jicou de boca abena a olhor plJra  a   I'esse a  andor o Monte Cara,  só ló poro as
          por estimtUl\'O, já que nlJo possu(a a bordo  potlll'Zjnha de comando, onde o bodona fiaria   seis  e  meia.  pt!rto  da  boquinha  do  noite.
          qualquer meio auxiliar de orientaÇilO, sah'O   salvo o Monte Cara e toe/a a gente a bordo.   estariam a demandar a baía. Ainda UI"  pouco
          a agulha.                         Foi então que da mesma pollleúnha, atravls   cedo para se ol'islar direito a  luz  do farol.
             - Tris apitos lle dois em dois minUlOS.   do  megafone,  se  oUI'iram  palavras  ml/ito   Era forçoso pairar ao largo ati  cair a noite
             - Tris apitos de dois em dois minutos-  estranhas ao capitlJo Alfredo.   paro  melhor se dislinguir o pisca-pisca  do
          seguiu a ordem de boca em boca mé chegar   - Porra,  merda,  chiça!   filrol.  A  chuI'a continual"a a roncar 1/0 mar.
          ao cabo da sirena.                   Ficaram  lodos  assarapantai/os  com   IOfdalldo tudo em  redor, limitando o aleance
            Lá estm'a outra coisa errada no Monte   aquela  de  Nh ·Alfredo.  homem  eilucai/O,   dos apilos.
          Cara.  Até  pt/ra  opitar  ert/  preciso  gritar   capitão compelellle. a mUlular IXlfavrIJes ttlo
          daq/le/a maneira.  Era" mesma história do   feios.  A  rail'a dele era com certeza contr(la
          telégrafo.  para ali (II'"riollo  a diJicultar as   equipagem.  Ninguém a bordo jamais o des-
          l/tal/obras.  Tlnba de ser /lula arranjado e aJi-  respeitara,  a  começar  pelo  comramestre.
          lIat/O  para  segurança l/O  lIlH'io  e das  ~'idas   Depois de lltal/obra ttlo proma, Mo perfeita,
          também.  /fá  quase dois  meses que  comlm-  não  era  fácil  eme/lder  essa  exploj·iJo.  Ele
          dom o Monte Cara, e  1011/0 ail/da por nor-  al/dal'O de facto comrariai/o naquele lugar.
          malizar!  Nunca  vira  semelhall/e  desleixe.   Merecia coisa melhor.  Porlm,  a tripulofilo
          Nesse poli/O,  Francelina tillha razlJo qllllndo   não til/ha  culplJ.
          dizia que nem os pobres nem os  ricos esti-  A  fIOl'egação  comilluan'a  lliftcil  até  ao
          mal'Om  bastame  as  suru  coisas.  Que  no   Pano Grande.  A sirena MO afogeman'a os
          Minho,  por exemplo,  os modestos lal'rado-  riscos,  ulna  w'z que a chl/I'a nlJo pemlitia a
          res  chegal'Om  a  lal'Or  os  cornos  ds  suas   propagação dos apitos a um pen'metro CO/I-
          l'OcaS,  sem  falar  nos  restall/es  pt!nences.   I'enieme.  E ela caia grossa,  cerrada.  como
          Fosse  como fosse,  elo  obsenY)u  bem.  Por   se fora milhfJes de bicas jorra/II/o águo.  Ser
          outro lado,  nlJo sentia qualquer enlusiasmo   copitlJo como del'e ser é cO/rhecer ludo que
          por aquela btJrcaça de que agora era mestre,   1/0 mar possa acomecu. NlJo é só pegar Ira
          ele,  que comandara nal'io de  vergas e fora   leme e seguir a rota que I'em /lO mapa.  CO/l-
          imediato l/O  Douro. De dois em dois minu-  du;jr um nario /Ião é o mesma coisa qlle guiar
          tos corria alguém para a corda do apito, de   um  auto/flÓl'el.  De  qualquu marreim.  Inla
          tronco nu, sob a cargo da  chul'O fustigando   chuI'o aquela que desabal'a generosamente.
          a chaparia do coI/l'ls. Impunha-se assim aler-  Como I'iera do ql/adrame sul. as ilhas ,odas
          tar embarcoçlJo que a essa hora estl\'esse a   estariam a essa hora a  Inber ouro llo ciu.
         percorrer o cmlal nemo sul ou rumo none.   FojlJ  de  Cima,  esse aliO,  hUl'ia  de  produzir
            - OUlMos menlos.                seus  bons  alqueires  de  milho  e  de  feijlJo.
            -  Ouvidos  atentos  -  repetiu  todo  o   - Quamas milhru  teremos mrdailo?  -
         mundo.                             perguntou Alfredo Araújo ao marilr/reiro do
            - Segue sempre para leste - disse para   leme.
         o homem do  leme.                     - NlJo sei,  ClIpillJo.  Tall'el  Imras  trinta
            -  Sempre  poro  leste  -  respondeu  o   milhas. A gente largou ds dilas ejá SOo quatro
         homem  do leme.                    e meia.  Del'e ser isso, capitOa.  Trinta milhas
            Alcançou o binóculo, que estal'tl pendu-  mais ou  menos.
         rado num prego.  Correu a  I'ista  por toda a   - Esle barco nUllca tel'e coma-milhos?
         circunferêllcia cujo Unlro era o barco. Alra-  - Já,  sim  senhor.
         l'ls dru  lell/es.  só  I'ia  o  I:onina  da  chIH'O.   - E porque é que deixou de ter?
         Para além da barreira de ógua, hal'en'o algo   - Foi Uln luborlJo ou uma gata que linha
         que pudesu pór em risco o nOI'io e a tripu-  atrós  de  nós e  acabou  por engolir o  bar-
         larlJo? Recordou nesu momentO o abalroa-  quinho.
         mento com o  l'Opor Iwrueguês.  próximo de   - Engoliu o  barquillha?
         Lil'erpool, também por falto de  risibilidade.   - Sim  senhor! Sopou a linho e engoliu
         Sossebó!  Guardal'a  ainda  na  co~ça a  1'0.1:   a  barquinha.
         bonita da  empregada  da  instituiçtJo que os   -  E  nunca  l/IOis  se  requisitou  outro
         acolhera quando desembarcaram em Lil"er-  conta-milhru?
         pool,  na  quoliilade de  náufragos.   - Ah, isso nOo sei.  O relógio até estd lá
            De repente surge um l'ulto negro o bom-  em baixo 1/0 câmara.
         bordo,  alto que nem  um  rochedo.  ameaça-  - Qual  relógio?
         dor  que  nem  uma  faca.  Era  a  proa  dum   - Aquela coistJ que tem um potueiro ptlra
         )'Opor,  apomai/o  exactamente para  (I meia-  marcar as  milhas.
         -nau do Monte Cara. GrilOS e correrias tres-  - Pois aquilo  é  que é propriilmellte  o
         loucada pusermn-IIQ fomile si.  Cambada de   cOllfa-milhos.  Nos  carros,  li  mesma  coisa
         cOl'ardes, berrou com qUlllllaforfa possu(a.   chama-se coma-qui/6metros.  Percebeste?
            - Cambada de COI'llrt/es,  máquina toda   - Percebi.
         d  I'ame.                               Oh.  sallla iglloflillcia!                (De  ..capilão-de·I/wr-i"Tam.
            - Nilo  dá  "lUis,  ClIpitilo  -  respolldeu   -  Bem,  a  geme  sempre  lhe  chamoll   PuhficaçikS  Europa-A"';n',",I
         alguém da  escotilha da  casa das máquinas.   assim.                             Cofrcçdo Sh:ufQ XX.  n. "  237)
            Rápido  que  "em  o  mbo  de  lagartixa,   - A geme,  quem ?
         empurrou  o  timol/eiro,  ugurou  a  roda  do   - N6s  todos.
         leme,  que lorceu,  torceu mé ela diur ntlo.   - E  o Sr.  Mmruel da Luz lamb/m?   **********

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