Page 387 - Revista da Armada
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D. A. – O plano da defesa de Diu que,
         devido à pequenez do território e aos
         reduzidos meios de que dispunha, era
         forçosamente simples, foi cumprido.
         Assentava ele fundamentalmente nos
         seguintes pontos:
           a) Resistência dos Postos exteriores da
             Guarda Fiscal e Polícia, enquanto pos-
             sível;
           b) Ocupação da zona do Aeroporto e
             arredores;
           c) Defesa da muralha exterior da cidade,
             a cargo da Companhia de Caçadores,
             menos o seu pelotão destacado para a
             zona do Aeroporto, e o Pelotão de
             Armas Pesadas que estava na Fortaleza,
             onde constituía uma base de fogos;
           d) Defesa final, efectuada na Fortaleza, à
             custa dos meios recolhidos, incluindo a
             Bataria de Artilharia, actuando como
             Infantaria;
           Não foi possível a sua execução comple-  esquadrilhas de aviões a jacto iam destruin-  R. A. – Conseguiu ouvir as palavras que
         ta, porque depois do primeiro embate em  do com uma rapidez incrível todos os pos-  o Comandante dirigiu à guarnição antes
         que se combateu toda a noite, até ao esgo-  tos fronteiriços e – pensámos nós – sepultan-  do combate?
         tamento de munições no caso dos Mortei-  do no seu interior os seus bravos defensores.
         ros, de manhã a U. I. entrou com os seus  Também na mesma altura se identificou  D. A. – Não. Mas durante o cativeiro e
         aviões a jacto e a partir desse momento era  ao largo de Diu, mas muito perto para os  como me continuei a dar muito bem
         completamente impossível sair sequer dos  seus canhões, o cruzador “Nova Delhi” que  com o pessoal da Marinha (tendo sido
         buracos onde nos tínhamos enfiado...  entretanto começara a bombardear a  até escolhido pelo Governador para
           A Fortaleza, nosso teórico último reduto,  Fortaleza.               recolher oficialmente o relatório deste
         estava completamente devassada e destruída.  Corri para perto do meu pessoal, pelo  pessoal), falámos várias vezes deste
                                            caminho fui atacado pelos aviões, e do  assunto tendo todos de uma forma geral
           R. A. – Quando começou a desenrolar-  buraco onde todos nos enfiámos, de vez  referido que as suas palavras tinham sido
         -se o combate?                     em quando vinha até ao cimo das mura-  de exaltação e estímulo, mais ou menos:
                                            lhas de onde...                    “Rapazes! Sei que vão cumprir assim
           D. A. – Na madrugada de 18 de                                       como eu! E que mais vós quereis se não
         Dezembro, cerca das 1.30, a U.I. iniciou a  R. A. – Assistiu à acção da “VEGA”?  acabarmos numa batalha! Fazemos parte
         invasão tentando entrar por dois pontos: a                            da defesa da Pátria e vamos cumprir até
         península de Gogolá, defronte de Diu, e um  D. A. – Assisti à acção da “VEGA”!  ao último homem e última bala! Eu até
         posto fronteiriço (Porto Covo).    Vejo-a sair a toda a velocidade a caminho  me vou vestir de gala porque assim mor-
           Em ambos os postos, sobretudo em  do cruzador, tendo sido atacada no cami-  rerei com mais honra!!”
         Gogolá onde havia mais concentração de  nho pelos aviões a jacto! O Comandante  E depois de isso, fizeram-se as despedi-
         tropas, e devido à forma maravilhosa como  manejando com perícia o leme, furtava-se  das, as fotografias dos entes queridos
         se comportaram os (poucos) homens da  repetidamente aos vários ataques que lhe  foram beijadas e guardadas nos calções e
         Guarda Fiscal e Polícia que neles se encon-  eram dirigidos (eram visíveis no mar os  partiram com aquele Comandante com
         travam, os ataques foram repelidos com  rastos das várias rajadas), e assim con-  quem iam até ao fim do mundo!!!
         bastantes baixas por parte da U. I. e apenas  seguiu atirar abaixo três aviões inimigos!
         alguns feridos da nossa parte. Para Gogolá  Fantástico! E continuava a gritar com o  R. A. – Hoje, 40 anos depois, o que se
         foi onde se concentrou todo o nosso fogo de  seu pessoal: Força neles! Dá-lhes agora,  lhe oferece dizer?
         apoio, quer por parte dos Morteiros, quer  Ramos! Boa Aníbal!” Extraordinário!
         por parte das peças de Artilharia.   Mas após um breve intervalo de rea-  D. A. – Analisando a atitude do
           Esta acção durou até cerca das 5.30 da  bastecimento, quando os aviões vieram  Comandante Oliveira e Carmo, de ter
         manhã, e como entretanto se tinham esgota-  outra vez, ao primeiro ataque desta vez  visto a forma como ele encarou a si-
         do as munições dos Morteiros que estava  cruzado, ao fugir de uma das rajadas, caiu  tuação, tem que se enaltecer o grande
         comandando, apresentei-me no posto de  em cheio no meio da outra, e foi o fim! As  patriotismo, honestidade profissional,
         Comando ao Sr. Major Lucena de Vas-  balas entravam por cima e saíam pelo  hombridade e enorme coragem. Ele teve
         concelos, Governador e Comandante-chefe,  fundo da lancha construída em fibra, e logo  tempo suficiente para se preparar e
         o qual me ordenou “que ficasse por ali”. O  nessa primeira rajada a embarcação ficou  preparar o pessoal para o combate, pre-
         posto de Comando tinha uma posição ele-  em chamas, a meter água, mas ainda com  parou-se para cumprir uma ordem e nesse
         vada e dispunha de uma janela sobre o  o atirador da peça de Artilharia a fazer  cumprimento, morreu. A guarnição estava
         canal de onde eu vi a lancha “VEGA”, com  fogo! O convés era um mar de sangue, pois  perfeitamente moralizada e o exemplo
         o seu Comandante Oliveira e Carmo de  foram cortadas ambas as pernas ao Oliveira  dele foi de tal forma empolgante que to-
         farda branca (adiante explicarei porquê) e  e Carmo e ferido de morte o marinheiro-  dos o seguiam.
         com o qual eu troquei uns acenos de  -artilheiro Ferreira. Ao Comandante ainda  Ainda há heróis em Portugal!
         saudação. Neste momento um marinheiro  com vida, tentaram passá-lo para uma balsa  Só lamento que o seu nome seja tão
         aproximou-se dele e disse-lhe qualquer  lançada entretanto na água, mas nova raja-  pouco conhecido e honrado, sobretudo
         coisa que fez com que ele se precipitasse  da acabou de vez com a sua vida!!  junto da nossa juventude!
         para o alarme de postos de combate, tendo-  Essa é uma imagem que jamais esque-
         -me acenado para a ponta da ilha. Ali duas  cerei!!!

                                                                                    REVISTA DA ARMADA • DEZEMBRO 2001 25
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