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PONTO AO MEIO-DIA





                                            O Nó Górdio


                                  das Forças Armadas





                 o início dos anos 90, quando a exigiam consideráveis meios huma- lar o valor profissional dos efectivos; e
                 NATO adoptou uma nova nos e materiais.                        obter meios tecnologicamente adequa-
          Nestratégia militar, as forças                                       dos ao cumprimento das missões.
          armadas portuguesas ficaram envolvi-  Neste contexto e, como exemplo, refi-
          das num nó górdio que ainda não foi ra-se que a Marinha efectuou uma  Não há hoje um “império da Ásia”
          desfeito: a incompatibilidade entre as revisão global do seu planeamento para oferecer a quem desate o nó gór-
          responsabilidades decorrentes de uma estratégico, definindo claramente um dio das forças armadas portuguesas.
          estratégia vocacionada para a interven- modelo do sistema de força naval ade- Porém, é necessário que os mais altos
          ção em conflitos regionais e os orça- quado e exequível face às necessidades responsáveis políticos e militares nacio-
          mentos de defesa nacional, condiciona- e às possibilidades do país.   nais tenham a mesma coragem e de-
          dos por as prioridades políticas do país                             terminação que Alexandre demostrou
          estarem focalizadas na satisfação dos  Desta forma fixaram-se objectivos na lenda do rei da Frígia, e ponham em
          anseios de progresso e bem-estar dos muito claros, para os quais a instituição prática as medidas antes referidas, con-
          cidadãos.                         foi direccionada, o que associado às jugando-as com duas linhas gerais de
                                            melhorias nos processos de gestão, acção. Em primeiro lugar, declinando
            Como tais responsabilidades são ina- permitiu “recapitalizar” o orçamento; as concepções clássicas de reestrutu-
          lienáveis e essenciais à credibilidade isto é, com o mesmo dinheiro passou a ração das forças armadas, que pre-
          internacional e a outros interesses im- fazer-se mais. Porém, como durante conizam apenas as reduções de meios
          portantes do país, as tentativas de liber- muitos anos não se adquiriram ou materiais e de efectivos, o que, por si só,
          tação do nó górdio das forças armadas, modernizaram os meios militares, veri- não beneficia a relação custo/eficácia
          privilegiaram inicialmente a redução fica-se agora que tal iniciativa não gera da defesa militar.
          dos sistemas de forças da Marinha, do recursos financeiros suficientes para
          Exército e da Força Aérea. Cortar, pare- que as verbas de investimento e fun-  Complementarmente, como a opera-
          cia lógico e essencial para que se pudes- cionamento alcancem os montantes cionalização daquelas medidas requer
          sem aumentar as despesas de funciona- que as missões exigem. Daí a necessi- tempo, muito mais tempo que uma le-
          mento até aos níveis necessários ao dade de se conceber uma nova tentati- gislatura, importa estabelecer uma base
          emprego das forças armadas fora do va de libertação do nó górdio das política alargada de sustentação da
          território nacional. Por isso, alienaram- forças armadas, que adopte uma pers- reforma, bem como desenvolver um
          -se infra-estruturas e diminuíram-se pectiva ampla de reestruturação, apele esforço de captação do apoio da
          comandos, forças e unidades. Todavia, à inovação e seja dirigida para as áreas opinião pública, pelo esclarecimento
          verificou-se que estes cortes, por um mais prementes.                dos objectivos a alcançar, tarefas em
          lado, só disponibilizavam recursos                                   que as elites política e militar têm
          financeiros no muito longo prazo; por  Como se mantém a razão que im- grande responsabilidade. Só nestas cir-
          outro lado, reduziam o dispositivo à pede aumentos significativos dos orça- cunstâncias se assegurará que os encar-
          dimensão mínima para o cumprimento mentos de defesa nacional, a tarefa gos com a defesa são sentidos com alta
          das missões. Em consequência, foi en- reveste-se de elevada complexidade, rentabilidade pública, aspecto essencial
          saiada uma segunda tentativa de liber- requer grande responsabilidade e para se inverter a conhecida “desorça-
          tação do nó górdio das forças armadas, serenidade e, como é incompatível com mentação militar”, que se caracteriza
          tirando partido dos benefícios que a visões sectoriais ou individualizadas, por a aumentos do PIB não correspon-
          tecnologia proporciona.           obriga à integração dos múltiplos con- derem melhorias sensíveis no orçamen-
                                            tributos e perspectivas coadjuvantes da to das forças armadas, o que as remete
            Devido aos enormes progressos sociedade civil e das forças armadas. para uma permanente e desgastante
          dos sistemas de comando, controlo, Só desta forma se desenvolverá o luta pela sobrevivência, geradora de
          comunicações, vigilância e reco- amplo consenso nacional, indispen- considerável frustração institucional e
          nhecimento, dos sistemas de infor- sável à decisão dos órgãos de sobera- inibidora de um papel mais activo na
          mação, da mobilidade e da letalida- nia em assuntos de defesa. Neste con- afirmação de Portugal na NATO e no
          de das armas, tornou-se possível re- texto, identifico como medidas prior- mundo.
          estruturar as capacidades militares, itárias: impulsionar a definição de um
          de forma a que unidades ligeiras sistema de forças nacional mais equili-             António Silva Ribeiro
          desempenhem funções que antes brado, coerente e económico; estimu-                                CFR



         4 MARÇO 2001 • REVISTA DA ARMADA
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