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O Tratado da Constituição da Europa
O Tratado da Constituição da Europa
SIM ou NÃO
No número de Novembro
de 1995 da RA escrevi “Ao Editora Ulisseia
entrar o século XXI não te-
remos formada uma Europa
federal, à semelhança das
federações americanas, suí-
ça ou alemã. Teremos muito
provavelmente uma organi-
zação supra-nacional, híbri-
da, original, situada juridi-
camente entre a Federação
de Estados e a Organização
Intergovernamental, cons-
truída sobre um tratado que
muito se assemelhará a uma
constituição” .
Aí o temos, dez anos depois,
aprovado pelos 25 Estados-
-membros, ao que parece
prematuro e ao que dizem
precipitado, vítima talvez
da forma pouco hábil, e
longe dos cidadãos, como
a União Europeia tem sido
conduzida nos últimos anos.
Apesar de conter um con-
junto de opções correctas e
que parecem neste momento indis- na declaração de 9 de Maio de 1950, do desde o ano 2000 um país com uma moe-
pensáveis, já sofreu duas recusas, Ministro Francês dos Negócios Estrangei- da desvalorizada, sofrendo de uma dolorosa
da França e da Holanda, e vários ros, Robert Schuman. Fazendo notar que inflação e de uma alta taxa de juros.
adiamentos. “a Europa não se fará de uma só vez, nem Em 29 de Outubro de 2004, foi assina-
sur girá como uma construção de conjunto, do pelos 25 plenipotenciários dos Estados-
mas sim através de realizações concretas, -membros o “Tratado que estabelece uma
o dia 1 de Janeiro de 1986, Portugal criando em primeiro lugar uma solidarieda- Constituição para a Europa”, com 448 arti-
tornou-se membro de pleno direito de de facto”, a declaração Schuman definia gos, 36 protocolos e 2 anexos, na maioria
Nda Comunidade Económica Euro- uma estratégia funcionalista, a qual tomou resultantes da integração de disposições
peia. Foi uma opção natural porque Portu- a dianteira sobre a concepção dita “cons- dos tratados que regulam, desde o início,
gal sempre pertenceu à Europa, pela situa- titucionalista”, que desejava ver instituída, a formação e o funcionamento da União
ção geográfica, pela fatalidade étnica e por sem demora, uma organização política de Europeia.
mérito próprio: no sedimento cultural da Eu- tipo federal. Quando o Tratado foi pacífica e unani-
ropa encontram-se as Universidades Medie- As assinaturas de meia dúzia de tratados memente assinado, ninguém pensava, com
vais Portuguesas e os artífices dos grandes que gradualmente introduziram alterações uma ou duas excepções, que ele não entra-
Descobrimentos; no seu Renascimento e na e aditamentos ao Tratado de Roma de 1957 ria em vigor em 2006: os Parlamentos apro-
sua evolução para a modernidade tiveram e que Portugal prontamente subscreveu, variam para ratificação o que fora aprovado
influência os conhecimentos por nós adqui- mostram que a Europa seguiu, até agora, pelos Governos das suas maiorias e, onde
ridos e as culturas por nós importadas. Na um prudente caminho na consolidação eco- houvesse referendos, estes seriam pouco
implantação da Europa no mundo só fomos nómica e no progresso político. mais do que um pró-forma para dar ao Tra-
ultrapassados pelo Império Britânico: torná- Portugal tem fortes razões para se orgu- tado um certo cunho democrático. Mas – e
mos o Mundo eurocêntrico. lhar de pertencer à Europa e devemos con- só o digo a título jocoso -, o Tratado come-
Para além de bases socioculturais, exis- gratular-nos hoje por ver Portugal como çou por ser infeliz logo no seu artigo 1º,
tem já na Europa, como se sabe, uma re- membro de pleno direito da União Euro- onde se lê que o Tratado “foi inspirado na
alidade económica e uma potencialidade peia, fruto de uma opção política relati- vontade dos cidadãos e dos Estados da Eu-
política em resposta a dois conceitos a que vamente à outra opção que consistiria em ropa”. Ora, alguns referendos já efectuados
deu vida a Segunda Grande Guerra: a gran- remeter o País, quase certa e irremediavel- não dão bem essa impressão.
de zona económica e a superpotência. mente, para um terceiro-mundismo instável, São as seguintes, em resumo, as inova-
A realidade institucional das Comuni- amorfo e subdesenvolvido. Se não fosse a ções do Tratado.
dades Europeias encontra a sua origem adesão ao euro, seríamos provavelmente O presidente do Conselho Europeu passa
8 AGOSTO 2005 U REVISTA DA ARMADA