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Arquivo CTEN António Gonçalves




















         Os dois navios da esquerda têm as vergas arriadas e o da direita tem a vela caçada.
         dos em cada bordo, actuando como lemes.  sua base não sendo ainda nesta altura utiliza-  ta de costa. O regresso era feito à vela, aprovei-
           A avaliar pelos abundantes testemunhos ico-  dos brandais , razão pela qual seria impossível  tando o vento predominante favorável.
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         nográficos que chegaram até aos nossos dias,  aguentá-lo nessa posição dada a enorme pres-  Os progressos da arqueologia nas últimas
         só a partir de c. 1.600 a. C. o mastro passou a  são do vento sobre a vela. Aliás, os primeiros  décadas vieram juntar mais dados aos sabe-
         ser utilizado próximo de meio-navio. Depre-  mastros dos navios egípcios eram constituídos  res existentes, permitindo-nos ter uma ideia
         endemos que terá sido descoberta por esta  por duas secções, em forma de «V» invertido,  muito concreta quanto às características dos
         época a forma de navegar à vela sem ser ex-  espigando uma a partir de cada bordo e unidas  navios que acabámos de descrever. Basica-
         clusivamente com o vento na popa. De resto,  no galope, aguentados para ré por uma espécie  mente em forma de colher, dispunham de um
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         esta alteração coincide no tempo com uma  de contra-estais . O movimento horizontal da  fundo chato e sem quilha. O seu comprimen-
         notável transformação na própria vela, que era  verga superior, sempre que necessário optimi-  to rondaria os 24 metros, com uma boca de 6
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         feita em linho. Com o objectivo de rentabili-  zar a mareação , era efectuado através de dois  metros e 1 metro de calado, quando comple-
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         zar a força do vento a área vélica foi grande-  braços  dizendo para ré, um em cada bordo,  tamente carregados. O remo utilizado como
         mente aumentada. Na impossibilidade de as  tal como hoje acontece. Na manobra de car-  leme, indispensável à manobra, viu aumenta-
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         escotas  serem eficazmente utilizadas, uma  regar a vela eram folgados os inúmeros aman-  das as suas dimensões e passou a ser fixado
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         vez que o comprimento da esteira  passou  tilhos  da verga superior. Por acção do respec-  na popa do navio.
         a ser muito maior do que a boca da própria  tivo peso, esta era arriada até assentar sobre a   Na opinião de muitos especialistas, os de-
         embarcação foi aí cosida uma segunda verga,  verga inferior, parcialmente fixa. Face à irregular  senvolvimentos feitos pelos Egípcios na nave-
         garantindo que por acção do seu peso a vela  distribuição e sentido da força exercida pelos  gação à vela terão sido adoptados por Fenícios,
         estaria sempre bem mareada face aos ventos  amantilhos, as vergas adquiriam uma forma  Gregos e Romanos. Aliás, fruto da navegação
         da região. De acordo com vários estudos, al-  curva, surgindo os terços  numa posição mais  que estes praticaram com regularidade na costa
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         guns deles de carácter eminentemente prático,  baixa do que os respectivos laises.  oriental africana, depois da construção de um
         esta alteração veio tornar possível a navegação   Por volta de 2.500 a. C os navios de maiores  canal que ligava o Nilo ao Mar Vermelho, c.
         à vela com o vento aberto, no máximo, até 40º  dimensões passaram a ter o seu casco em ma-  2.000 a. C., tudo indica que as suas técnicas
         a contar da popa .                 deira de cedro, fruto das relações comerciais es-  de construção naval e de navegação à vela te-
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           Pelos documentos que analisámos parece-  tabelecidas com a região do Líbano. Não sendo  nham também sido apreendidas pelas culturas
         -nos que este incremento da área vélica, privi-  ainda conhecido nem praticado o método de  do Índico, com quem contactaram. De resto,
         legiando o aumento do gurutil  e da esteira da  construção a partir de uma ossada constituída  a descoberta dos destroços de um navio com
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         vela em detrimento das respectivas testas , teve  por quilha e balizas, a necessária rigidez estru-  características similares na península Arábica,
         como principal objectivo minimizar o efeito de  tural do casco era conferida por um conjunto de  datado desta época, mais não fez do que con-
         adornamento e os perigos decorrentes da su-  longarinas e vaus, colocados a posteriori.  firmar estas suspeitas.
         bida do centro de gravidade do navio . Além   As regulares viagens até à Síria, um pouco   Ainda antes de 1.400 a. C. os Minóicos,
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         disso, o mastro encontrava-se apenas fixado na  mais a norte, eram feitas a remos, sempre à vis-  originários da ilha de Creta, constituíam já o
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                                                                               Eram apelidados de «Povos do Mar», pelos
                                                                               Egípcios, fruto das incursões que de forma
                                                                               inesperada praticavam junto das populações
                                                                               ribeirinhas. No entanto, os seus primeiros na-
                                                                               vios eram um tipo de galé, movido exclusiva-
                                                                               mente a remos. O que denota o seu desco-
                                                                               nhecimento acerca da navegação à vela, pelo
                                                                               menos numa primeira fase. Talvez devido ao
                                                                               contacto frequente com o povo do Nilo, pas-
                                                                               saram a dispor, mais tarde, de navios à vela.
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                                                                               sido os Minóicos os primeiros a dotar os seus
        Museu Naval de Madrid – Foto CTEN António Gonçalves
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                                                                               para ré, com objectivo de manter o mastro em
                                                                               posição, bem como a utilização de brandais.
                                                                               Outros indícios sugerem ainda que estes terão
                                                                               sido pioneiros a navegar com o vento verda-
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         À esquerda encontra-se um navio egípcio do Império Antigo (2575-2134 a.C.) e à direita um do Império Novo   deiro  pelo través, o que implica o desenvol-
         (1550-1070 a.C.).                                                     vimento de técnicas de construção naval com
                                                                                     REVISTA DA ARMADA U AGOSTO 2005  15
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