Page 334 - Revista da Armada
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Estes dois últimos ataques são um bom teste-  afundarem de forma a bloquear locais de trá-  presentar um excelente meio para a destabili-
         munho de que o «Terrorismo marítimo» pode  fico intenso, ou mesmo para os fazerem explo-  zação económica internacional, pois, hoje em
         ter como objectivo, alvos militares ou civis. No  dir num porto de oportunidade. A “Intenção”  dia, cerca de 90% dos fretes mundiais movem-
         entanto, serão estes últimos, que devido à sua  assenta no facto de que os grupos “terroristas”  -se pelo mar, sendo muitos deles para fazer
         maior vulnerabilidade, estarão mais expostos  se possam virar para o mar, para fugir às aperta-  face a encomendas “just enough, just in time”.
         a ataques “terroristas”.           das medidas de segurança que se fazem sentir  Assim sendo, na indústria marítima, a luta con-
                                            em terra nos últimos anos. A extensão do mar  tra o “Terrorismo marítimo” irá ter que fazer
         AS COMPLEXAS E MULTIFACETADAS      e das costas oferece também a estes grupos  sempre parte da rotina da vida comercial.
         RAZÕES PARA ESTE TIPO DE ACTOS     uma excelente possibilidade de movimentos,                         Z
                                            de ataques e até de se esconderem, de uma             H. Portela Guedes
           Apesar do «Terrorismo marítimo» ser actual-  forma não possível em terra.                          CFR
         mente uma ameaça permanente, os oceanos
         não têm sido historicamente um lugar de gran-  PERSPECTIVANDO O FUTURO  Notas
                                                                                  Fonte: PSUK – Primary Solutions (UK) Ltd – Global
                                                                                 1
         de actividade neste âmbito, pois estes nunca                          Counter Terrorism Solutions;
         representaram para os “terroristas” um local de   O “terrorismo”, infelizmente, tem prova-  2  Fonte: World Maritime Day 2007. Disponível em
         oportunidade, capacidade e intenção. As orga-  do ser uma actividade de sucesso, para todos   http://www.worldmaritimeday.com/world_trade/glo-
         nizações “terroristas”, de um modo geral, nun-  aqueles que estão preparados para utilizar a   bal_transport.asp. Acedido em 051500FEV08;
                                                                                 3
                                                                                  A International Maritime Organization foi cria-
         ca estiveram localizadas nas regiões costeiras,  violência extrema para suportar os seus na-  da em 1948 através das Nações Unidas, inicialmente
         nem nunca dispuseram de meios apropriados  cionalismos fanáticos, culturais, religiosos ou   com o nome Inter-Governmental Maritime Consulta-
         para estender os seus actos ao meio marítimo.  crenças, existindo pois, todas as razões para   tive Organization, com a finalidade de coordenar a
         Este tipo de actividade requer perícias no meio  acreditar que o uso ilegal da violência irá con-  segurança marítima internacional e as práticas com
         náutico, embarcações apropriadas para levar  tinuar no futuro.        ela relacionadas;
                                                                                 4
                                                                                  A Resolução A.584(14), “Medidas para prevenir
         a cabo os eventos, capacidade para montar   Os ataques “terroristas” de 11 de Setembro   actos ilícitos que ameacem a segurança dos navios,
         e sustentar operações fora do meio terrestre,  de 2001, nos EUA, vieram mostrar ao mundo   dos seus passageiros e tripulações”, foi adoptada pela
         entre outras. O modelo de ataque dos “terro-  que o “terrorismo” internacional, não era ape-  assembleia da IMO, em 20NOV1985;
                                                                                 5  O Maritime Safety Committee está integrado na
         ristas” e os constrangimentos impostos pelas  nas um bluff dos vários serviços secretos, mas   IMO;
         limitações de recursos têm afastado tradicio-  sim uma dura realidade, que esperava apenas   6  A MSC/Circ.443, “Medidas para prevenir actos ilí-
         nalmente estes do meio marítimo. Por outro  por uma oportunidade. Apesar destes ataques   citos contra passageiros e tripulações a bordo dos na-
         lado, um ataque a um navio no mar não tem,  terem utilizado na íntegra meios aéreos, penso   vios”, foi adoptada pelo MSC, em 26SET1986;
                                                                                 7  De 9 de Dezembro de 1985;
         nem o imediatismo, nem a mesma cobertura  poder afirmar que, no futuro, com o crescente
                                                                                 8  Também conhecida por SUA (Convention for the
         por parte dos media, que um qualquer outro  aumento e primordial importância do comér-  Suppression of Unlawful Acts against the Safety of
         ataque em terra. Apesar de todas as razões  cio marítimo mundial, os navios passarão a ser   Maritime Navigation), Convenção de Roma ou Con-
         apontadas, que indiciam uma baixa possibi-  um meio muito apetecido para o “terrorismo”   venção para a Navegação da IMO. Foi adoptada em
         lidade de um ataque deste género no mar, o  atingir os seus fins.      10MAR1988 e entrou em vigor em 01MAR1992;
                                                                                 9  A Resolução A.924(22), “Revisão das medidas e
         certo é que esse risco tem crescido acentuada-  Os actos ilícitos contra os navios e respec-  procedimentos para prevenir actos de terrorismo que
         mente nos últimos anos, assumindo agora um  tivos passageiros e/ou tripulações, não repre-  ameacem a segurança dos passageiros e tripulações e
         carácter de singular importância em termos  sentam apenas um perigo para estes, como   a segurança dos navios”, foi adoptada pela assembleia
         dos planeamentos nacionais e internacionais  também o são, no caso da sua ocorrência ter   da IMO, em 20NOV01;
                                                                                 10  SOLAS – Safety Of Life At Sea;
         de contra-terrorismo.              lugar dentro de um estreito ou num corredor
                                                                                 11  O Código ISPS foi adoptado em 12DEZ02 e entrou
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           Segundo a RAND , na sua publicação “Ma-  de tráfego, um sério risco para a navegação na   em vigor em 01JUL04. Este Código foi colocado no
         ritime Terrorism – Risk and Liability”, existem  vizinhança, devido à possibilidade de colisões.   Capítulo XII-2 Special measures to enhance maritime
         3 tipos de navios mais susceptíveis a ataques  Estes actos representam também, uma grande   security, da Convenção SOLAS de 1974 revista;
         deste tipo, e são eles, os navios de cruzeiro, os  ameaça para as economias regionais, que po-  12  Actualmente U.S. Customs and Border Protection;
                                                                                 13  Fonte: U.S. Customs and Border Protection, em
         Ferrys de passageiros e os porta-contentores,  dem mesmo, no limite, estagnar, pois imagine-  02OUT07;
         não se excluindo, por completo, qualquer ou-  -se, por exemplo, o impacte internacional que   14  Idem;
         tro tipo de navio, como por exemplo, os navios  teria o afundamento de um ou de vários navios   15  Esta iniciativa foi dada a conhecer ao mundo
         tanque de transporte de gás natural líquido.  de grande porte no Estreito de Malaca , por   pelo Presidente Bush, em Cracóvia – Polónia, em
                                                                        19
           As razões para este alto nível de apreensão  onde passa cerca de 1/3 do comércio global   31MAI03 e os seus princípios foram adoptados em
         são complexas e multifacetadas, mas podem  e cerca de 1/2 do crude mundial , transpor-  04SET03 em Paris;
                                                                    20
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         ser agrupadas em termos de “Vulnerabilida-  tado por mar.             assinados em 13FEV06, tendo os EUA procedido à sua
         de”, “Capacidade” e “Intenção”. A “Vulne-  Por mais medidas internacionais que se to-  assinatura em 17FEV06;
         rabilidade” da navegação, em geral, está re-  mem, nunca se conseguirá erradicar de vez   17  O paquete “Santa Maria” pertencia à Companhia
         lacionada com o deficiente policiamento no  com o «Terrorismo marítimo», pelo que a so-  Colonial de Navegação e era considerado na época
                                                                               como um transatlântico de luxo;
         alto mar, com o facto de muitos Estados litorais  lução terá que passar sempre por tentar reduzir,   18  A RAND é uma Corporação Internacional, criada
         terem falta de recursos e de vontade para apli-  quer o número, quer a violência de tais actos   nos EUA, que tem como missão auxiliar na melhoria da
         car programas sérios de vigilância da costa, e  ilícitos, sendo para tal necessário a imposição   orientação e decisão políticas, através da elaboração
         ainda com as características físicas e geográ-  de medidas decisivas e integradas que combi-  de estudos, utilizando como valores, a qualidade e a
         ficas do ambiente marítimo. A “Capacidade”  nem, essencialmente, as componentes políti-  objectividade. A RAND integra, entre outros, o Center
                                                                               for Terrorism Risk Management Policy;
         é cada vez maior, contribuindo para esta, por  ca, económica, legal, diplomática, de defesa,   19  Este estreito foi atravessado em 2005 por 62.621
         exemplo, o aumento das escolas de desportos  tecnológica, entre outras. Os Estados irão ter   navios, segundo o Marine Department, Peninsular Ma-
         náuticos e consequentemente o número de  sempre muitas limitações para fazerem face a   laysia com base no Annual shipping traffic traversing
         lojas com este tipo de artigos, que permitem  este tipo de actos, essencialmente devido às li-  the Straits of Malacca, reporting to Port Klang’s Vessel
                                                                               Traffic System center. A Lloyd’s of London estima que
         aos “terroristas” ganharem perícias básicas, as-  mitações das actuais leis, quer internacionais,   actualmente esse número deve rondar os 70.000 na-
         sim como, adquirirem equipamento adequado  quer do âmbito interno, à falta de políticas in-  vios mercantes;
         para atacar navios ou mesmo pipe-lines de gás  tegradas, quer regionais, quer bilaterais, e ainda   20  Fonte: Nazery Khalid do Maritime Institute of Ma-
         ou de petróleo. Há ainda a possibilidade dos  devido às deficientes medidas adoptadas para   laysia, em Burden Sharing, Security and Equity in the
         “terroristas” poderem vir a contratar “piratas”,  fazerem face a estes actos.  Straits of Malacca. Disponível em http://www.mima.
                                                                               gov.my/mima/htmls/papers/pdf/nazery/nazery%20
         para sequestrar navios de grande porte, como   No futuro, o «Terrorismo marítimo» poderá   -%20SOM%20burden% 20sharing%20for%20JapanFo-
         petroleiros, porta-contentores, etc., para os  ser visto como apetecível, pelo facto de ele re-  cus%20_13Nov06_.pdf. Acedido em 231730JAN08.
         8  NOVEMBRO 2008 U REVISTA DA ARMADA
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