Page 332 - Revista da Armada
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Terrorismo Marítimo
Terrorismo Marítimo
Realidade ou Ficção
Realidade ou Ficção
A 1 pudessem ameaçar os passageiros e/ou as tri-
superfície marítima do globo ocupa culdade em se determinar que “acto” ou “ac-
uma área de cerca de 130 milhões de tos” são para “fins políticos” ou “politicamente pulações dos navios, assim como aludia para a
milhas quadradas , sendo a maioria dela motivados”. Seria muito mais fácil de definir necessidade imediata das facilidades portuárias
considerada como alto mar, pelo que, salvo “terrorismo”, se fosse tido em conta apenas o e dos navios individualmente, terem um plano
raras excepções, não se aplica a jurisdição “acto” em si e não a sua motivação. de segurança, assim como um oficial para este
de qualquer Estado, existindo pois, uma certa No início da década de 80, do século pas- efeito. Ainda em 1986, o MSC adoptou a MSC/
“anarquia” em termos de lei. Circ.754, a qual incluía medidas
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Hoje em dia mais de 90% do de segurança para os passageiros
comércio mundial é transporta- dos Ferrys internacionais e para
do por via marítima. Atendendo os portos praticados por estes.
ao permanente crescimento des- Na sequência do sequestro
te e ainda à grande movimenta- “terrorista” ao paquete italiano
ção das esquadras militares, não “Achille Lauro”, em Outubro de
restam dúvidas que os actos de 1985, e depois da Assembleia
«Terrorismo marítimo» represen- Geral das Nações Unidas, através
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tam uma ameaça crescente e de da Resolução n.º 40/61 , convi-
extrema perigosidade para todo dar a IMO a «estudar o problema
o tipo de navios, atendendo so- do terrorismo praticado a bordo
bretudo à sua imprevisibilidade ou contra os navios, com vista
e consequências. O ambiente a formular recomendações so-
marítimo possui, pois, caracterís- bre a adopção de medidas apro-
ticas únicas, que o podem tornar priadas», esta sentiu-se obrigada
atractivo para acções “terroris- Paquete português “Santa Maria”. a realizar uma conferência para
tas”, como sejam, a falta de vigilância no alto sado, a International Maritime Organization abordar este tipo de actos ilícitos, o que veio
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mar e as débeis ou inconsistentes medidas de (IMO), começou a dedicar especial atenção a acontecer em 1988, tendo resultado desta, a
segurança que se aplicam nas áreas costeiras aos actos ilícitos que ameaçavam a segurança “Convenção para a supressão de actos ilícitos
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e nas instalações portuárias de muitos países dos navios, dos seus passageiros e das suas tri- contra a segurança da navegação marítima”
do mundo. pulações. Em 1985 foi adoptada a Resolução (SUA). A elaboração desta Convenção teve
A.584(14) , que reflectia uma grande preo- presente, os objectivos da carta das Nações
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O «TERRORISMO MARÍTIMO» À LUZ cupação com os perigos a que estavam ex- Unidas respeitantes à manutenção da paz e
DO DIREITO INTERNACIONAL. postos os passageiros e tripulações dos navios, da segurança internacionais e o desenvolvi-
AS INICIATIVAS DOS EUA como resultado do incremento do número de mento de relações amigáveis e de coopera-
incidentes envolvendo «pirataria», «assaltos à ção entre os Estados, assim como a Resolu-
- ANTES DOS ATENTADOS “TERRORISTAS” mão armada» e outros actos ilícitos contra os ção n.º 40/61, na qual entre outras matérias
DE 11 DE SETEMBRO DE 2001 navios ou a bordo destes, incluindo pequenas é solicitado «insistentemente a todos os Es-
embarcações, quer no mar, quer nos fundea- tados, unilateralmente e em colaboração uns
Apesar do “terrorismo” já existir há quase douros. No ano seguinte, e ainda neste âmbito, com os outros, como também com os órgãos
um século, ainda não existe uma competentes da Organização das
definição reconhecida interna- Nações Unidas, que (…) prestem
cionalmente para os termos “ter- uma atenção especial a todas as
rorista” e “terrorismo”. O “Terro- situações que revelem violações
rismo marítimo”, por outro lado, maciças e flagrantes dos direitos
não sendo um fenómeno tão an- do homem e das liberdades fun-
tigo, remonta pelo menos a 22 damentais, (…) as quais podem
de Janeiro de 1961, quando do originar actos de terrorismo in-
sequestro ao paquete português ternacional e comprometer a paz
“Santa Maria”. e a segurança internacionais» e
A maioria das nações conside- se «qualifica inequivocamente
ra que um acto “terrorista” con- como criminosos todos os actos,
siste, genericamente, em cometer métodos e práticas de terrorismo,
um acto ilícito, relacionado com seja qual for o lugar da sua prá-
aspectos políticos. Existem mui- tica e sejam quais forem os seus
tas definições para “terrorismo”, Paquete italiano “Achille Lauro”. agentes, incluindo aqueles que
como por exemplo a que se segue: “violência foi aprovado pelo Maritime Safety Committee comprometem as relações amistosas entre os
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motivada por questões políticas que incluem (MSC) , para os navios de passageiros envol- Estados e a sua segurança». Curiosamente, a
assassinato, rapto, existência de reféns, roubo, vidos em viagens internacionais de 24 horas única palavra que está ausente dos artigos da
sabotagem, extorsão e intimidação contra alvos ou mais e para as facilidades portuárias que os SUA é a palavra “terrorismo”, embora no seu
governamentais, civis ou privados, cometidos servem, a MSC/Circ.443 . Esta Circular, através preâmbulo esta conste por diversas vezes, mas
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por grupos sub-nacionais ou agentes do Estado das suas medidas, instigava os Governos, auto- nunca associada à noção de propósito políti-
que não obedecem às regras da lei”; sendo to- ridades portuárias, administrações, armadores, co. A razão é óbvia, pois sem uma definição
das elas muito semelhantes. A aplicação deste capitães e tripulações a adoptarem as medidas clara de “terrorismo”, os Estados partes pode-
tipo de definição fica comprometida pela difi- apropriadas para prevenirem actos ilícitos, que riam aceitar a Convenção sem terem que ser
6 NOVEMBRO 2008 U REVISTA DA ARMADA