Page 136 - Revista da Armada
P. 136
- 509.092 milhas (o equivalente a quase 24 vidas, as contrapartidas que concede aos que constituiu como a nossa moeda.
voltas ao mundo) desde que o navio é portu- dele dependem. Num certo sentido, e socorrendo-me de um
guês, percorridas em 144 viagens, em que es- Mas foi também a gesta de Marinheiros, conceito que é tão caro ao Senhor Dr. António
calou 29 portos e fundeadouros nacionais dife- cuja origem se perde no tempo, que no passa- Carrapatoso, creio que também o navio-esco-
rentes e 141 portos e fundeadouros estrangeiros do tornou possível a reconquista de uma parte la “Sagres” se tem constituído para a Marinha
também diferentes (muitos deles visitados mais do território que é hoje Portugal. No entanto, como uma forte componente do seu Compro-
do que uma vez), e incluindo ainda a sua parti- pouco mais de um século volvido sobre a de- misso Portugal.
cipação em 19 regatas internacionais. finição das respectivas fronteiras, a ambição Dito isto, e retomando o raciocínio, consi-
Voltas ao mundo r eais, o navio fez efectiva- colectiva extravasava já os limites do pequeno dero que só se tornou possível estarmos hoje
mente duas: a de 1978/79, sob o comando do reino. Cientes da sua responsabilidade perante aqui reunidos, o facto da Marinha Portuguesa,
Comandante Martins e Silva, e a de 1983/84, o devir de todo um Povo, os Marinheiros Portu- há mais de 80 anos, ter vindo a construir, em
sob o comando do Comandante Homem de gueses não hesitaram em arrostar os seus mais torno do mítico nome “Sagres”, aquele que é
Gouveia. íntimos receios, e, durante cerca de dois sécu- porventura um dos símbolos de maior prestígio
A terminar, resta-me felicitar o autor pelo ex- los, foram sucessivamente dando novos mun- do nosso país. Como por ocasião dos 70 anos
celente trabalho produzido, quer no que respei- dos ao Mundo, conferindo corpo a esse marco deste nosso navio escrevi, reflectida pelo Mar,
ta à alta qualidade da sua apresentação e da civilizacional em que se transformou a Era dos a silhueta da “Sagres” constitui a imagem em
organização e escolha do material e assuntos Descobrimentos. Deste assombroso esforço, que todo um País e um Povo se reconhecem,
incluídos, quer pelo riquíssimo conteúdo e tra- já por tantos considerado desmesurado face como se fora um espelho, nela identificando
tamento da informação recolhida, e desejar-lhe à escassez de recursos e dimensão do país, re- os ilustres momentos que ao longo de séculos
que a Marinha faça a justiça de lhe proporcio- sultou, nos primeiros alvores do século XVI, a marcaram a existência de Portugal.
nar a mesma oportunidade, que todos os co- afirmação de Portugal como primeira potência No processo de pesquisa iniciado há mais de
mandantes desta bela barca já tiveram, de sen- marítima à escala global. uma década, cujo culminar é a apresentação
tir o prazer de dar, de ETO pública deste livro dedi-
na mão e depois de larga- cado à história do navio-
do o pano e braceadas as Foto Júlio Tito escola “Sagres”, mais não
vergas, as suas primeiras fiz do que identificar e
ordens de manobra para perseguir as múltiplas es-
início de qualquer normal teiras que a forte presença
navegação à vela: do navio, sob as bandeiras
Escotas das gáveas bai- alemã, brasileira e portu-
xas; amuras e escotas do guesa, foi indelevelmente
traquete; adriças e escotas deixando gravadas pelos
da vela de estai, dos entre- mares por onde navegou,
mastros baixos e da meze- muitas das quais ficaram
na baixa … Caça,amura e registadas em livros, jor-
caça, iça e caça. nais, revistas, filmes, do-
Perdoem-me o saudo- cumentários, fotografias,
sismo, mas a recordação medalhas e mesmo mú-
destas vozes, ao fim de sicas, um pouco por todo
tantos anos, ainda me soa o mundo. No entanto,
hoje no ouvido tão bem depois de percorrer esta
como a melhor música. longa singradura, estou
Faço votos para que O Comandante António Manuel Gonçalves entrega o primeiro exemplar do seu livro ao Almirante CEMA. hoje profundamente con-
estas e as demais vozes de comando para a Estou igualmente certo de que não passará vencido de que a parte mais relevante deste
manobra do aparelho e velame da “Sagres”, despercebido a nenhum dos presentes, o fac- imenso espólio foi confiada às pessoas que nele
dadas na nossa língua materna, possam conti- to do ex-libris da Marinha Portuguesa ser actu- navegaram. Trata-se de um repositório de valor
nuar a ressoar pelos mares e portos do mundo almente uma das mais fortes e bem cuidadas inestimável, do qual apenas uma ínfima parte
inteiro, ao longo dos tempos. Seria um modes- imagens associadas a Portugal. No entanto, este este livro ajudará a preservar. Tudo o mais são
to mas bem simbólico sinal de que Portugal se estatuto, bem como o reconhecimento de que memórias, escritas com o mais fino sal sobre
mantinha vivo! é alvo além fronteiras, não constituem obra do folhas de vento…
Bons ventos a acompanhem nas muitas sin- acaso, resultando tão-somente da dedicação de A terminar o Comandante Gonçalves agrade-
graduras que ainda terá pela proa! todos quantos ao longo do tempo têm tido o ceu a todos que tiveram especial intervenção na
O orador que se seguiu foi o autor do livro privilégio de servir a bordo do navio-escola “Sa- edição do livro designadamente ao Secretário
que começou por agradecer a presença do gres”. Pelo nome que ostenta – uma clara home- de Estado de Defesa Nacional e dos Assuntos
Secretário de Estado da Defesa Nacional e dos nagem à perseverança e ao ideal de além-mar do Mar, ao Almirante CEMA, ao Presidente da
Assuntos do Mar, do Almirante CEMA, do Dr. –, pela figura-de-proa – o infante D. Henrique, Vodafone Portugal que presidiu a esta sessão.
António Carrapatoso como também de todos mentor das extraordinárias viagens de desco- Tendo em conta que durante a sua última
os presentes. brimento – e ainda pelo símbolo que orgulho- viagem o navio-escola “Sagres” navegou por
Referiu algumas considerações de carácter samente exibe nas velas – a Cruz de Cristo que mares de África e visitou vários portos naquele
pessoal agradecendo o apoio dado pela sua identificava os navios portugueses de antanho continente, a Marinha e a Fundação Vodafo-
família para concretizar este projecto. Das suas –, é no navio-escola “Sagres” que se encontra ne Portugal decidiram entregar uma parte da
palavras destacamos: consubstanciada boa parte dos insignes valores receita da venda deste livro ao projecto Filhos
Num país muitas vezes considerado qua- que nos foram confiados, os quais, no essencial, do Coração, que tem como objectivo libertar
se litoral, os Portugueses que neste rectângulo nos identificam como Nação. crianças africanas da escravatura. Assim, no fi-
e ilhas habitam, vivem há séculos em estreita Talvez muitos não tenham ainda meditado nal da cerimónia, o Almirante Melo Gomes e o
e permanente comunhão com o mar, para o sobre o que vou referir, mas dentro em breve, o Dr. António Carrapatoso entregaram à Dra. Ale-
melhor e para o pior. Como se fora um pacto, nome “Sagres”, desde que associado aos navios- xandra Borges um donativo no valor de 3.000
o primeiro tem garantido o regular sustento, escolas da Marinha Portuguesa, ultrapassará em euros, associando o navio-escola “Sagres” a
enquanto que o segundo cobra, a termo e em tempo o período durante o qual o escudo se esta sua nobre causa. Z
26 ABRIL 2009 U REVISTA DA ARMADA