Page 11 - Revista da Armada
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da dispensa de ligações físicas nos campos dos Correios e Telégraphos, entre o cruza- em HF, permitindo ao comando no mar
de batalha, daí resultando que, no fim da dor “D. Carlos” e a Estação Semafórica de o acesso a multi-serviços e à informação
conflagração, todas as FA´s beligerantes já Cascais, embora este feito não tenha mere- disponibilizada pelo seu comando opera-
tinham ao seu dispor facilidades de Tele- cido, na imprensa da época, mais do que o cional, relevante para a respectiva missão
grafia Sem Fios e, nalguns casos, também singelo título de “Telegraphia sem fios”. e visão global da área de interesse.
de Telefonia Sem Fios, com a vulgariza-
ção das emissões em radiotelefonia. Ainda Só em 1926, a Companhia Portuguesa Tudo isto e muito mais, aconteceu, até
que, em geral, mal equipado, em virtude Rádio Marconi, S.A.R.L. (CPRM), criada chegarmos à actual fronteira do mundo
das restrições económicas que se faziam um ano antes, começou a instalar esta- mais plano de Thomas Friedman2, a par-
sentir em Portugal, também o nosso Cor- ções radiotelegráficas em Lisboa, Porto, tir, nomeadamente, dos PC´s, da queda
po Expedicionário se viu dotado de algu- S. Miguel, Funchal e S. Vicente de Cabo do Muro, das redes de informação ilimi-
mas, embora limitadas, capacidades tele- Verde, estendidas, nos anos seguintes, tada, da rede das redes que é a Internet,
gráficas, com cada uma das suas Divisões ao restante império colonial, ao mesmo do ciberespaço da World Wide Web e da
a dispor de uma secção de TSF, com dois tempo que alargava as telecomunicações conectividade global, responsáveis, en-
oficiais operadores. portuguesas ao resto do mundo, median- tre outros, pela colocação do mundo em
te contratos com diversas companhias de marcha frenética e mutação quase mági-
Relativamente à radiotelefonia, a pri- cabos submarinos e a introdução de no- ca, próprias de uma nova Sociedade da
meira emissão oficial, entre nós, ocorreu vas tecnologias e facilidades nas ligações Informação, afectando tanto os compor-
já no pós-guerra, mais precisamente em intercontinentais. tamentos sociais como a gestão dos pro-
1919, realizada pelo escritor Albino Forjaz blemas mundiais.
de Sampaio e o capitão-tenente Júdice de Esta, pois, num brevíssimo resquício, a
Vasconcelos, que viria a ser, curiosamente, evolução operada nas telecomunicações Entre o nascimento da TSF há 100 anos
o futuro primeiro director da Companhia civis, autonomizadas da tutela militar a e o contemporâneo óbito do MORSE, re-
Portuguesa Rádio Marconi, sendo recebi- partir da década de 30. sistem, contudo, um antigo serviço públi-
da em boas condições a bordo do destroyer co e um velho sistema comunicacional.
“Douro”, ancorado no Tejo, a partir de um Voltando às comunicações militares, Refiro-me à escuta permanente das fre-
posto de TSF instalado na Estação da Ma- vejamos como estas se desenvolveram na quências de socorro pela qual a Marinha,
rinha em Monsanto. Marinha, a partir da estreia tecnológica da em colaboração com a Força Aérea, cum-
Casa da Balança. pre um compromisso internacionalmente
Só mais tarde, como é sabido, apareceria assumido pelo país, no âmbito do Serviço
a difusão de televisão, viabilizada a partir Pode afirmar-se que, em relação aos es- de Busca e Salvamento, bem como ao ve-
das experiências de Marconi com trans- forços que as potências europeias, muito tusto e popular Código Internacional de
missões em VHF, comprimento de onda especialmente a Inglaterra, vinham desen- Sinais (CIS).
que ficaria experimental até 1936, ano da volvendo no domínio das ligações rádio,
primeira emissão. foi curto o atraso do começo da TSF em Termino como comecei. Mais do que
Portugal, iniciada em 1913, com a aber- uma data ou efeméride, foi intenção home-
Neste momento, é justo mencionar que tura do desse Posto do Arsenal ao servi- nagear a obra de todos aqueles que, com o
as primeiras emissões de radiodifusão não ço público marítimo e a ligação aos CTT, desejo de bem fazer, têm contribuído, em
oficiais, primeiro entre si e depois estendi- através da Central Telegráfica do Ministé- diferentes períodos históricos, para man-
das aos diversos públicos, em geral, fica- rio da Marinha. ter o país na crista da onda de moderniza-
ram a dever-se aos radioamadores, cabendo ção ininterrupta que surpreende o mundo
uma referência muito especial a dois desses Foi toda uma geração de empreendedo- há mais de 150 anos. Neles revemos, com
pioneiros, muito citados pela imprensa es- res que tornaram possível a modernização respeito e admiração, todos os nossos an-
pecializada da época: Abílio Santos Júnior da época e a ulterior evolução da Armada tigos camaradas que arrancaram, há longo
(com o indicativo P1AA) e Sousa Dias Melo no domínio das telecomunicações, desde tempo atrás, com o projecto das comunica-
(P1AB). A importância destes operadores a expansão das redes e coberturas radio- ções rádio na Marinha e ao serviço do país,
só se valoriza devidamente, se se recordar telegráficas a todo o território nacional; ambos dotados com as melhores capaci-
que, no primeiro quartel do século XX, os passando pela emblemática Estação Ra- dades, técnicas e práticas, à semelhança
postos de TSF civis portugueses eram todos dionaval “Comandante Nunes Ribeiro” e em tempo quase real, do que de melhor
preenchidos por amadores e os equipamen- e o nevrálgico Centro de Comunicações se concebia e realizava nos demais países
tos produzidos, quase integralmente, pelos da Armada (CCA); seguida da rede digi- desenvolvidos.
próprios operadores. tal integrada de serviços (RDIS), hoje a
infra-estrutura tecnológica fundamental Foi toda uma gesta de enorme valia téc-
O sucesso das emissões regulares da e base das comunicações e serviços dispo- nica e qualidade cívica, que orientou a
radiotelegrafia, a partir do posto TSF da níveis na componente fixa (voz e dados); persistente reacção da Marinha aos novos
Casa da Balança, e, posteriormente, da ra- prosseguida pelo subsequente sistema de desafios da Técnica e às alterações do am-
diotelefonia, veio beneficiar, em muito, as processamento de mensagens formais, o biente estratégico e operacional em que
comunicações terra/navio e navio/terra MMHS, desenvolvendo as bases da co- vem operando. Perante eles, que bem hon-
da nossa esquadra, consolidando a posição operação, bem sucedida e mutuamente raram a Pátria, sem cuidarem de recom-
cimeira da Armada no processo de moder- vantajosa, da Marinha com este sector da pensa, nos inclinamos, em sinal de reco-
nização tecnológica das FA´s e do próprio indústria nacional, como o comprovam nhecimento e, também, para lhes prestar
país. Isso só foi possível graças aos conhe- as centrais telefónicas de última geração merecida homenagem através desta tão
cimentos e perícias adquiridas por técni- e o sistema integrado de comunicações; singela, quanto sentida, evocação.
cos, civis e militares, verdadeiros entusias- continuada pelas redes locais, a Intranet
tas na divulgação e aplicação prática das da Marinha e a sua presença na Internet; Z
muitas descobertas da época de ouro, que pela modernização, automatização e re-
foi a segunda metade do século XIX. dução das Estações Radionavais; pelos António C. Rebelo Duarte
sistemas de informação de comando e
A prová-lo, logo em Maio de 1902, cin- controlo, como o MCCIS, incorporando VALM
co meses após aquela que é considerada a equipamentos de recepção e transmissão
primeira radiocomunicação transatlântica via satélite em SHF, integrados na capaci- Alocução proferida na Casa da Balança em 18FEV10.
feita por Marconi, registam-se as primeiras dade SATCOM que a Marinha teve neces-
experiências radionavais, com a participa- sidade de incrementar; e, ainda, pelas no- Notas:
ção de dois empregados da Direcção-Geral vas tecnologias das comunicações navais 1 “História da Marinha Portuguesa – Homens,
Doutrinas e Organização 1824-1874”, Lisboa, Aca-
demia de Marinha, 1999, pág. XV;
2 “O Mundo é Plano”, de Thomas Friedman, Actual
Editora, Lisboa, 7ª Edição, 2007;
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