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O papel dos submarinos em operações conjuntas
e combinadas
INTRODUÇÃO vive dentro de um raio de 320 km a partir do Foto Rui Saltaracterística que confere ao submarino a maior
mar e que aproximadamente 40% das cidades vantagem competitiva relativamente a outros
As recentes acções desenvolvidas por mundiais, com uma população igual ou supe- sistemas de armas. A discrição resulta não só da
piratas ao largo das águas da Somália, rior a 500.000 habitantes, se localizam no litoral. possibilidade do submarino se manter em imer-
numa importante área de confluência A isto acresce o facto de uma parte importante são, e por isso invisível, mas também do facto
de rotas marítimas, vieram relembrar duas dos recursos energéticos e minerais circularem de ser um meio que opera de forma silenciosa,
questões essenciais na área da segurança e por via marítima, através de estreitos e de pontos tornando-se virtualmente indetectável por meios
defesa internacionais. de confluência estratégicos cujo controlo cons- passivos. Neste contexto, os submarinos conven-
titui, inevitavelmente, uma vantagem competi- cionais (não nucleares), com ou sem AIP3, são a
A primeira questão diz respeito ao carácter tiva para aqueles que estiverem em melhores expressão máxima dessa discrição.
difuso e incerto das ameaças no século XXI e condições para o exercer.
ao seu impacte na ordem internacional. A se- Mobilidade. A manobra contribui para a ex-
gunda questão realça o papel secular e Deste modo, é incontornável que as marinhas ploração dos resultados, para a conserva-
primacial da segurança das linhas de co- de guerra assumam um papel significativo no ção da liberdade de acção e para a redu-
municação marítimas e a sua importân- impulso expedicionário, não apenas pelas ca- ção das vulnerabilidades. A mobilidade,
cia para o desenvolvimento e bem-estar racterísticas naturais dos litorais que exigem ca- sendo um elemento essencial do potencial
das sociedades. O corte mais ou menos pacidade de transporte pelo mar, mas também de combate, visa dispor uma força de for-
significativo das linhas de comunicação pela capacidade das forças navais proporciona- ma tal que o adversário fique colocado
marítimas pode constituir um sério pro- rem apoio às operações conduzidas em terra. O numa situação operacionalmente ou tac-
blema internacional caso os Estados não submarino, elemento fundamental da estratégia ticamente desvantajosa. No caso particu-
possuam alternativas credíveis para garan- e das operações navais, assume-se como uma lar do submarino, a mobilidade está di-
tir a segurança dos fluxos de mercadorias variável relevante na complexa equação das rectamente associada à sua velocidade,
essenciais ao funcionamento das econo- operações expedicionárias e, consequentemen- em particular à velocidade em imersão e
mias nacionais. No passado, dominá- te, nas operações conjuntas e combinadas. ao tempo durante o qual essa velocidade
-las era uma preocupação constante e pode ser sustentada.
primária de cada um dos adversários, o O PAPEL DOS SUBMARINOS Autonomia. Por autonomia entende-
que levou Napoleão a afirmar ser a guerra NAS OPERAÇÕES CONJUNTAS -se a capacidade para operar no mar sem
uma questão de comunicações. E COMBINADAS apoios externos, e estão enganados aque-
les que pensam que a autonomia é ape-
Um século após o Congresso de Vie- A. CARACTERÍSTICAS nas uma característica dos submarinos nu-
na1 colocar um ponto final nas ambições Sem se ter a pretensão de descrever de modo cleares. Na verdade, mesmo os modelos
napoleónicas, as grandes potências eu- diesel-eléctricos mais antigos detêm uma
ropeias envolvidas na I Guerra Mundial exaustivo o elevado potencial inerente à arma autonomia global (endurance) notável.
testemunharam mais uma vez a impor- submarina, em particular, o seu efeito dissuasor, Note-se o caso do submarino argentino
tância das linhas de comunicação ma- evidenciam-se apenas cinco atributos, cuja re- San Luis que, durante a Guerra das Mal-
rítimas, porém, com uma nova variável levância para efeitos das operações conjuntas e vinas, operando isoladamente a 800 mi-
na equação operacional do conflito – o combinadas, como de outras, é significativa. lhas do seu porto, se manteve no mar por
submarino. Com efeito, pela primeira vez mais de 30 dias nas vizinhanças da Task
na história militar, o submarino assumia Discrição. A discrição é, porventura, a ca- Force inglesa, condicionando claramente
um papel decisivo nas operações navais
desenvolvidas pela potência hegemónica conti- o desenvolvimento das operações4. Para além da
nental, aAlemanha, que se empenhava a fundo autonomia global, atrás referida, é conveniente
em cortar as comunicações marítimas do adver- também relevar a autonomia em imersão (sub-
sário. Desde então, como resultado óbvio das merged endurance), que confere ao submarino
suas características, capacidades fundamentais a capacidade de se manter em paradeiro incer-
e princípios de emprego, o submarino tem man- to por um período alargado de tempo, virtual-
tido a sua relevância operacional e estratégica mente indetectável. Os submarinos convencio-
nos mais diferenciados teatros de operações e nais diesel-eléctricos, dotados de AIP, como é o
cenários do xadrez internacional. caso da 5ª esquadrilha portuguesa de submari-
nos da classe “Tridente”, constituem, a par dos
O IMPULSO EXPEDICIONÁRIO submarinos nucleares, uma expressão incontor-
nável desta autonomia, podendo manter-se em
A percepção política e global de que “if we imersão profunda por períodos que vão para lá
do not go to the crises, the crises will come to das duas semanas, percorrendo, nesta condição,
us” (Till, 2004: 238) impôs a mobilização dos muitas centenas de milhas.
Estados e da comunidade internacional no de-
senvolvimento de uma segurança desterritoria- Flexibilidade de resposta. Os submarinos
lizada e projectável2 como o demonstrou a in- podem ter uma participação determinante nas
tervenção do ocidente noAfeganistão em 2001, operações conjuntas e combinadas ao longo
tendo em vista eliminar o apoio do regime Tali- das diferentes fases do espectro do conflito. Por
ban à Al Qaeda. exemplo, durante as fases iniciais de uma crise
(ou mesmo durante um conflito generalizado),
Para além da dimensão política, também a di- o submarino, dado o carácter furtivo que lhe é
mensão geográfica foi determinante no desen- conferido pela sua discrição e autonomia, pode
volvimento do impulso expedicionário. Bastará conduzir operações de recolha de informações
notar que cerca de 70% da população mundial ou lançar operações especiais em áreas muito
REVISTA DA ARMADA U MAIO 2010 13