Page 21 - Revista da Armada
P. 21

do marinho) e 100 milhões de espécies pe- consequência, as criaturas mais familiares 1978, a Nova Zelândia decidiu aceitar as

lágicas (na coluna de água), enquanto em do mar, albatrozes, morsas e focas, todas normas previstas na Lei do Mar das Na-

terra há 1,8 milhões de espécies descritas têm vindo a sofrer perdas enormes.                             ções Unidas aproveitando para reclamar a

no total dos ecossistemas. O mar contém Os peixes que conhecemos bem, os Zona Económica Exclusiva de 200 milhas

vários níveis de produtividade e biomas- atuns, arenques, bacalhaus pequenos, são náuticas. As várias ilhas em redor das duas

sa. Nas planícies abissais há, em regra, todos pescados até aos 800 metros de pro- ilhas principais permitiram, num ápice,

baixa biomassa mas elevada biodiversi- fundidade. O peixe mais pescado, a an- que a Nova Zelândia passasse a ter uma

dade, sobretudo de pequenos organismos choveta (Engraulis ringens ou anchova, da área marítima de cerca de dois milhões de

e bactérias que vivem enterradas nos fun- família do biqueirão) é capturado entre milhas quadradas, ou seja, 17 vezes a área

dos moles. Nas áreas onde há ecossistemas os 3 e os 80 m de profundidade. A pesca terrestre (quase dez vezes o tamanho da

hidrotermais há biomassas elevadíssimas de profundidade é geralmente considera- França). Transformava-se assim na quarta

mas baixa diversidade biológica.  da a partir dos 400 a 500 metros de pro- maior ZEE do mundo (ocupa actualmente

A pesca tradicional continua a ter um pa- fundidade.                                                      o sétimo lugar).

pel muito importante na vida das popula- Até à década de 80, a generalidade das A descoberta de grandes cardumes de

ções, mas com diferenças regionais. Cada espécies de profundidade tinha um inte- olho-de-vidro laranja na Zona Económica

português consome, em média, quase 60 kg resse comercial reduzido, quer pela dificul- Exclusiva da Nova Zelândia catapultou o

de peixe por ano, mas a média mundial dade de acesso dos aparelhos de pesca tra- país para um frenesim de desenvolvimen-

situa-se na casa dos 16,5 kg. A China tem dicionais a zonas de grande profundidade, to. Vários armadores construíram rapida-

registado um aumento no consumo muito quer pela dificuldade de introdução des- mente frotas para a captura deste peixe e

significativo, situando-se já na casa dos 26 tas espécies no mercado. No entanto, face toda a logística para a sua exportação e

kg por pessoa, por ano. Este aumento da à redução das capturas tradicionais, por comercialização. Só alguns anos depois a

procura tem sido compensado, parcialmen- falta de peixe, e às restrições impostas, a comunidade científica descobriu que estes

te, pela aquicultura.                                                                                                       peixes podiam viver

Em 1900, as cap-                                                                                                            mais de 150 anos e

turas de peixe eram                                                                                                         que só atingiam a

da ordem dos 5 mi-                                                                                                          maturidade com

lhões de toneladas                                                                                                          mais de 20 anos.

por ano. Em 1950 o                                                                                                          Situação idêntica

valor oficial da ONU                                                                                                         se registou no Atlân-

reportava 17 a 20 mi-                                                                                                       tico Norte onde os

lhões de toneladas.                                                                                                         russos começaram

Em 1975 chegou-se                                                                                                           a pescar peixe-rato

às 67 toneladas e,                                                                                                          por volta de 1967-68.

em 2006, segundo a                                                                                                          A captura depressa

FAO, às 92 milhões                                                                                                          atingiu, em 1971, o

de toneladas. Quem                                                                                                          extraordinário nú-

mais pescou foi a                                                                                                           mero de 82.000 to-

China e o Perú. A                                                                                                           neladas. Em 1973 os

combinação com a                                                                                                            navios russos já var-

aquicultura permitiu                                                                                                        riam todas as áreas

somar 144 milhões                                                                                                           abertas do Atlântico

de toneladas. Des-     Evolução do número de embarcações de pesca em Portugal e na UE entre 2000 e 2008.                    Norte. Depois disso,
de os anos 90 que as                                                                                                        a captura anual co-

capturas no mar se mantêm relativamen- nível europeu, sobre os volumes de captu- meçou a diminuir de forma constante, até

te estáveis. A Europa representa aproxi- ra (TAC - Total Allowable Catch, captura má- umas magras 4000 toneladas em 1982. Não

madamente 6% das capturas mundiais. A xima permitida), a frota comercial come- se sabe se esta diminuição foi o resultado

sua aquicultura representa apenas 2% do çou a procurar, cada vez mais, pesqueiros de flutuações naturais ou de uma explo-

volume mundial e por isso, o seu aumen- mais fundos e em zonas pouco exploradas. ração desenfreada, embora esta última ex-

to, constitui um objectivo da UE e também A tecnologia ajudou bastante, permitiu um plicação seja a mais provável. A questão é

de Portugal.                      enorme avanço na pesca, quer na detecção, difícil de responder, pelo facto de os cien-

A pesca, que outrora foi considerada quer na captura e armazenamento. Assim, tistas saberem muito pouco sobre o cresci-

uma fonte interminável de alimentos, os pescadores começaram a procurar pei- mento, reprodução e hábitos do peixe-rato,

está actualmente em declínio em todas xe cada vez mais longe e mais fundo. Co- apesar do grande número de capturas para

as partes do mundo e há já muitas zonas meçaram também a estudar os mapas do fins comerciais, ao longo de vários anos.

sobre-exploradas. Segundo vários cientis- fundo do mar, baseados em informações Tal como muitas outras criaturas das pro-

tas, mais de 80% dos stocks comerciais de militares anteriormente secretas, que po- fundezas, presume-se que o peixe cresça

peixe dos EUA estão sobre-explorados e diam revelar habitats isolados.                                    lentamente, chegue tarde à maturidade e

90% dos grandes peixes predadores (tais Nos anos 80, os pescadores descobriram viva uma vida invulgarmente longa.

como o atum, o peixe espada e o tubarão) grandes quantidades de um tipo de peixe Segundo um estudo comparativo divul-

desapareceram do oceano. Perto de 70% das profundezas muito diferente, a viver gado pela Comissão Europeia, Portugal ti-

dos pesqueiros mundiais estão fortemente a profundidades entre 700 e 1200 m. Este nha 10.808 embarcações de pesca licencia-

explorados ou extintos comercialmente. A peixe tinha carne firme e saborosa, com um das em 1999. Esse número reduziu-se para

pesca comercial no Mar do Norte remove alto teor de proteínas e lípidos. Para além 8.585 em 2008. No conjunto dos países que

entre 30% a 40% da biomassa de peixe por disso, encontrava-se em grandes agrega- integram a União a 27, houve também um

ano. Também desapareceram dos estuários ções à volta de montanhas submarinas e recuo do número de embarcações de pes-

e das águas costeiras, 85% das grandes ba- planícies perto da Austrália e da Nova Ze- ca, mas a um ritmo muito inferior ao na-

leias e cerca de 60% das mais pequenas. A lândia. Trata-se do olho-de-vidro laranja. cional - a rondar os 10 por cento. Assim, a

maior parte dos exemplares de peixes pe- O sucesso alcançado pelo olho-de-vidro frota de pesca portuguesa passou a pesar

quenos também estão a desaparecer. Em laranja foi fruto da geopolítica do mar. Em praticamente 10 por cento da totalidade

                                                                                                          REVISTA DA ARMADA U MAIO 2010 21
   16   17   18   19   20   21   22   23   24   25   26