Page 13 - Revista da Armada
P. 13

O REGRESSO AO MAR

De 1974 a2005 os nossos governan-                à necessidade primária de criar novas utili-    gloriosa fortalecendo o sentimento patrió-
          tes ignoraram completamente o          dades pela redução das distâncias.              tico, se têm mostrado bastantes.
          facto de Portugal poder assegurar      1.2 A Sociedade de Geografia de Lisboa,         3.2 A lição e os resultados da guerra que
no Mar o seu futuro e de possuir as águas        consciente dos seus deveres para com a          passou, o exemplo de pequenos países
jurisdicionais mais extensas da Europa e         Nação, apresenta-se neste Congresso reco-       que encontram no Mar o motivo principal
das mais extensas do Mundo. Negligente-          mendando o regresso de Portugal ao Mar.         da sua prosperidade e, sobretudo, uma
mente deixámos perder um valioso patri-          Nada a determina mais do que o estudo da        mais clara visão no que respeita ao fomen-
mónio humano e desprezámos as dádivas            evolução do Povo que a própria Geografia        to marítimo terão finalmente concorrido
da Natureza.                                     escolheu para Descobridor do Mundo e Ci-        para tornar realidade uma aspiração na-
                                                 vilizador de Gentes, não cuidando das ra-       cional de mais de um século de tentativas
   Graças à intervenção de algumas figu-         zões que deram a esse Povo as faculdades        sem fruto: o Regresso ao Mar.
ras públicas, dentro e fora da Marinha,          de grandes navegadores.                         3.3 Factores de ordem económica, de que
fortemente apoiadas pelo presidente da           1.3 De facto, folheando a História de Por-      se destaca a forte concorrência de nações
República desde que tomou posse, a eco-          tugal, onde o voltar das páginas tem o          altamente especializadas; uma situação
nomia do Mar voltou a estar presente como        som do marulhar das vagas, fácil se torna       geográfica actualmente (1958) desfavo-
forma de assegurarmos um futuro finan-           verificar a correlação existente entre a vita-  rável em relação aos estados marítimos
ceiramente independente. Para isso pode-         lidade da Nação e o desenvolvimento da          do Norte e do Mediterrâneo; a inércia
rá ter contribuído o expectável aumento da       nossa actividade marítima. Todas as vezes       proveniente de quase século e meio de
nossa plataforma continental, que reforça a      em que a hereditariedade, a vontade da          alheamento do comércio marítimo; uma
necessidade de uma nova política.                Nação ou outro dos factores que, por uma        larga incompreensão nacional que leva a
                                                 forma ou por outra, regulam os destinos         maioria dos carregadores a não utilizar os
   Vem isto a propósito de termos desco-         dos povos, colocaram o Poder em mãos de         nossos navios; deficiência das infra-estru-
berto que a Sociedade de Geografia de Lis-       Português de boa vontade se verificou um        turas, tanto no que respeita a equipamen-
boa se antecipou meio século na luta pelo        esforço nacional em direcção ao Mar. En-        to portuário como a estaleiros e escolas
Regresso de Portugal ao Mar, com uma             sina a História que prosperidade e navios       profissionais; dificuldades na obtenção
tese apresentada, em 1958, no II Congresso       no mar foram sempre sinónimos na língua         de capitais a investir; faltas de iniciativa
Nacional da Marinha Mercante proposta e          portuguesa; que época em que estamos            e exagerados receios de risco; insuficiente
redigida pelo nosso colaborador coman-           alheados do Mar é época de decadência;          preparação dos agentes; incompleta racio-
dante Serra Brandão. Pela sua permanente         que o nosso ressurgimento se conhece            nalização da exploração; um inadequado
oportunidade, seguem algumas passagens           logo pelo interesse dedicado às coisas da       sistema fiscal, dificultam o movimento
da referida tese, na sua redacção original.      navegação.”                                     ascensional do armamento português no
“1. Não estabelece a História uma perfeita       (…)                                             conjunto internacional.
delimitação entre povos marítimos e povos        “2.4 O passado e o futuro estão de acordo       3.4 A Sociedade de Geografia de Lisboa,
que o não são. No entanto, não há dúvida         quando nos mostram que se deve atentar          reconhecendo a obra extraordinária leva-
de que enquanto algumas nações viram o           no crescimento da capacidade e da efi-          da já a cabo para dotar o País com uma
âmbito da sua vida política e económica          ciência económica dos nossos transpor-          pequena marinha mercante modernizada
quase completamente circunscrito à explo-        tes por mar, nas suas infra-estruturas, na      e eficiente, encontra na possível remoção
ração das terras, outras, por circunstâncias     preparação do pessoal, na educação do           dos citados factores de retrocesso, em
diversas que a História aprecia, foram atra-     armador e do carregador, na formação de         grande parte já previstos, a viabilidade de
ídas mais especialmente para o Mar e nele        uma mentalidade marítima generalizada,          renovação e expansão da frota marítima
procuraram elementos para seu engrande-          na doutrinação dos próprios governantes,        nacional em ritmo proporcionado às nos-
cimento ou, até, a razão da sua existência       planeando com o pensamento não ape-             sas necessidades comerciais e demográfi-
como estados soberanos. Tal sucedeu com          nas nas necessidades presentes mas em           cas e conforme à nossa actual intrincada
os povos cujo território é em grande parte       todos os factores que contribuirão para o       geografia.
banhado pelo Mar e que, por dificuldades         alargamento das nossas necessidades no          “3.5 Perante uma situação ainda descon-
naturais ou antinomias políticas, não pu-        futuro.”                                        fortável para quem possui fronteiras marí-
deram encontrar no interior das terras o in-     (…)                                             timas em quatro continentes; incompreen-
dispensável à sua existência ou à expansão       3.1 Século e meio de História nacional mos-     sível para quem realiza por via marítima
da sua energia e do seu génio.                   tra como é difícil conseguir um conjunto        mais de 99% do seu comércio externo;
1.1 Também nem sempre é possível encon-          de circunstâncias favoráveis, de natureza       entristecedora para quem esteve presente
trar uma completa correspondência entre          financeira, económica, administrativa,          em Tordesilhas; inadequada para quem
povo marítimo e potência naval. Todavia          psicológica e, até, política, susceptíveis de   encontra no Mar a fonte principal do seu
ela tem surgido todas as vezes em que uma        permitir o Regresso de Portugal ao Mar.         prestígio e da sua sobrevivência, a So-
nação das que desenvolvem a sua activida-        Nem o pendor natural da nossa Gente,            ciedade de Geografia de Lisboa aconselha
de dedicando-se à vida do Mar vê os seus         onde quase todo o adolescente ou infante        o Regresso da Nação ao Mar”.
territórios ou os seus interesses vitais disse-  sonhou ser um dia marinheiro; nem a lógi-
minados pelo mundo. A defesa nacional, a         ca de uma directriz que a Geografia impõe                        Comandante Serra Brandão
unificação do território, o exercício efectivo   e a Economia recomenda; nem a tradição
da autoridade, a segurança económica e o                                                             13REVISTA DA ARMADA • JANEIRO 2011
prestígio nacional juntam-se, nestes casos,
   8   9   10   11   12   13   14   15   16   17   18