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HIERARQUIA DA MARINHA                                                                      6

CAPITÃO-GENERAL DA ARMADA

No reinado de D. João IV (1640-                da primeira esquadra da Companhia Ge-       das suas prerrogativas, como se pode
           1656), o título de Capitão-General  ral de Comércio, tendo como almirante       verificar ao consultar os registos gerais
           da Armada Real e dos Galeões de     Pedro Jacques de Magalhães.                 da Marinha do seu tempo, existentes no
Alto Bordo do Mar Oceano, designava                                                        Arquivo Central de Marinha.
o primeiro lugar na hierarquia naval              No Alvará de 28 de Julho de 1736 foi
portuguesa. Sucedeu, a partir da Guer-         criada a Secretaria de Estado da Mari-         Por morte de D. João da Bemposta, o
ra da Restauração, ao título de Capi-          nha e Conquistas, com o objectivo de        Vedor da Fazenda quis retomar os anti-
tão-Mor do Mar, criado em 1373 pelo            centralizar a direcção dos negócios de      gos privilégios de comando e direcção-
rei D. Fernando I, indignado com a con-        Marinha e Ultramar. Na dependência do       -geral de toda a actividade da Marinha,
duta cobarde e incompetente de Lança-          titular deste órgão, na parte da Marinha,   tanto mais que, como nota Valdez dos
rote Peçanha, Almirante de Portugal, na        havia dois altos funcionários: o Capitão-   Santos, fora “Capitão-de-mar-e-guerra
guerra contra Castela.                         -General da Armada Real e dos Galeões       e Coronel do Mar, em cujos postos em-
                                               de Alto Bordo do Mar Oceano, que co-        barcou, satisfazendo com acerto as suas
    O Capitão-General da Armada Real e         mandava as forças navais; o Vedor da        obrigações”. Para resolver o problema de
dos Galeões de Alto Bordo do Mar Ocea-         Fazenda, que dirigia superiormente a        quem deveria substituir o Capitão-Ge-
no, tinha como seus subordinados outros        actividade logística da Marinha.            neral da Armada Real e dos Galeões de
Capitães-Generais, normalmente desig-                                                      Alto Bordo do Mar Oceano na sua ausên-
nados por “Generais do Mar”, que adop-            No que Valdez dos Santos (A Hierar-      cia, quer temporária quer definitiva, foi
tavam o título consoante pertencessem ao       quia Naval, Academia de Marinha 1984)       criado o posto de tenentegeneral. Depois
Almirantado do Oceano Atlântico (Mar           julga ser uma cópia manuscrita de um        de D. João da Bemposta, o cargo foi de-
Lusitano) ou ao Almirantado do Oceano          decreto de 23 de Julho de 1757, são espe-   sempenhado por D. Pedro José de Noro-
Pacífico (Mar das Índias). No comando          cificadas as duas jurisdições, e definidas  nha Camões de Albuquerque Moniz de
das esquadras também se encontram Ca-          claramente as atribuições do Capitão-       Sousa até 1788, a que se seguiu, até 1795,
pitães-Generais. Podem referir-se como         -General da Armada Real e dos Galeões       Martinho de Melo e Castro, que chamou
exemplos: António Teles de Meneses, que        de Alto Bordo do Mar Oceano, que fo-        a si as funções e extinguiu o cargo, fican-
em 1646 foi Capitão-General da esquadra        ram atribuidas a D. João da Bemposta.       do as suas responsabilidades atribuídas
de socorro à Baía e tinha como seu almi-       Como refere aquele autor, este ilustre      ao Secretário de Estado da Marinha.
rante o mestre-de-campo-general Luís da        Conselheiro de Estado e Mordomo-Mór
Silva Teles, ou ainda o Conde de Castelo       de D. Maria I, dedicou toda a sua inte-                        António Silva Ribeiro
Melhor, que em 1649 foi Capitão-General        ligência e zelo aos serviços da Marinha                                         CALM
                                               e à sua organização, sendo muito cioso

VIGIA DA HISTÓRIA                                                                          33

UM PORTUGUÊS NA MARINHA DE ESPANHA

Já depois de escrito o pequeno apon-           geiros se viu forçada a abandoná-la, em     navio ao Faial, porto de destino, onde
     tamento que hoje aqui trago, veri-        duas pequenas lanchas, no dia 11 de Se-     descarregou a carga findo o que resol-
     fiquei que o mesmo já havia sido          tembro na posição 26º de latitude Norte     veu o capitão transportar os náufragos à
relatado, de forma romanceada, por             e 347º do meridiano da Ilha Ferro. 1        Corunha só não o conseguindo porque,
Celestino Soares, na obra “Quadros Na-                                                     uma vez mais, o mau tempo o obrigou
vais”, com o título de “Os Sonhos”.               Segundo o relato dos náufragos tam-      a arribar a Ferrol onde desembarcaram.
                                               bém as pequenas lanchas se iriam per-
   Dado que são passados cerca de 50           der se, no dia seguinte, não tivessem          O Rei de Espanha, ao tomar conheci-
anos desde a última edição daquela             sido socorridos pelo bergantim por-         mento da acção humanitária e abnega-
obra julgo que, apesar disso, haverá           tuguês Sª Ana, de que era capitão José      da do capitão português resolveu atri-
interesse na divulgação deste episódio         Filipe Nunes, saído do Rio de Janeiro a     buir, a título de tença, ao capitão Filipe
que se me afigura pouco conhecido.             12 de Agosto, com destino aos Açores e      Nunes o soldo de Capitão de Fragata da
                                               que três dias de forte temporal haviam      Marinha de Espanha .2
   A Gazeta de Lisboa, de 13 de Maio           “atirado” o navio para aquela posição.
de 1803, trazia uma notícia, oriunda de                                                                               Com. E. Gomes
Madrid, que seguidamente se resume.               Não foram só as más condições de
                                               tempo que o capitão José Filipe Nunes       Notas:
   Relatava o correspondente que a fra-        teve de vencer para socorrer os 61 náu-
gata Cantábria, da Coroa de Espanha,           fragos já que parte da sua tripulação,          1 ) O meridiano da Ilha Ferro no arquipélago das Canárias
em serviço de correio marítimo havia           devido à escassez de víveres e de água,     foi, durante muitos anos, o meridiano de referência. A longitude
saído em 10 de Agosto, de Montevideu           temia que o acréscimo de pessoas fosse      apontada corresponde a cerca de 31º W de Greenwich.
com destino à Corunha, e devido ao             pôr em risco a sua sobrevivência.
mau tempo começou a fazer tanta água                                                           2 ) As várias diligências para saber mais pormenores sobre este
que a maior parte da tripulação e passa-          Recolhidos os náufragos, chegou o        caso, nomeadamente durante quantos anos houve pagamento da
                                                                                           tença, quantas pessoas terão perdido a vida no naufrágio e qual
                                                                                           o percurso de vida do capitão português, resultaram totalmente
                                                                                           infrutíferas.

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